março 08, 2005

Países Soberanos com uma Moeda Única

e as contradições inerentes

É difícil o entendimento no Luxemburgo. Temos 12 Estados com situações diferenciadas quanto ao desenvolvimento económico, competitividade e qualificação do sector produtivo, peso relativo e eficiência do sector público, conjuntura económica específica, grau de consciência cívica e discernimento dos respectivos habitantes, etc., etc.. Cada um destes Estados soberanos, se não houvesse moeda única, estaria a realizar uma política financeira própria.

Por exemplo, Portugal ainda estaria a ser governado por António Guterres, o escudo estaria desvalorizado 50% ou mais, e caminharíamos, hipnotizados, para uma economia de troca natural, para uma situação similar à vivida pela Argentina há poucos anos.

Outros Estados teriam aplicado políticas diferentes. O difícil é uniformizá-las, dentro da diversidade de situações. Há Estados que consolidaram a sua economia e têm um modelo que funciona bem, nas presentes circunstâncias.

Outros não o fizeram e estão com sérios problemas orçamentais que tenderão a agravar-se, como os casos da Alemanha e da França, por exemplo. Estes últimos gostariam de aplicar as mezinhas keynesianas, tentando dinamizar a economia através da despesa, sem cortar na sua actual despesa pública, tornada rígida pelo modelo que adoptaram. São soluções de efeito transitório, porque o que é estruturante não é alterado. Mas como as legislaturas também são transitórias e o objectivo é ganhar as próximas eleições...

As razões apontadas para flexibilizar o pacto até são “aliciantes”. A Alemanha pede que o PEC não contemple: 1) custos com a reunificação do país (que já foi há 14 anos!); 2) contribuições nacionais para o orçamento comunitário; 3) despesas públicas com qualidade. Quanto à França quer excluir: 1) despesas de investimento; 2) despesas de investigação; 3) despesas de Defesa (!!); 4) ajudas ao desenvolvimento.

O problema é que um défice é um défice, quer seja por motivos nobres, quer seja por se ser perdulário. Eu posso endividar-me porque investi em casa própria mais do que conseguiria pagar; porque fui perdulária a despender nos centros comerciais e locais de diversão; ou apenas porque, em repetidos gestos piedosos e altruístas, dei esmolas em excesso. Ou ainda, como no caso da França, porque adquiri uma AK47 e vários pitbull e doberman, para defender a minha residência de intrusos.

A questão é que, quando se começa neste regateio, criam-se escapatórias por todo o lado, nomeadamente no caso dos países com contabilidades públicas criativas. Talvez por isso, o primeiro-ministro do Luxemburgo, que assume actualmente a presidência da União Europeia, considera que o PEC em vigor funciona mal mas prefere essa realidade a ter um novo Pacto que, daqui a uns anos, não funcione.

Provavelmente tem razão. Quem não tem dinheiro, não tem vícios. Portanto, uma forma de acabar com o vício da despesa excessiva, é cortar no dinheiro.

Publicado por Joana em 07:58 PM | Comentários (47) | TrackBack

março 07, 2005

A Seca do Ambiente

O caso da não-Barragen de Odelouca é típico da situação de desconchavo e de demissão em que o país vive. O abastecimento de água ao Algarve baseava-se em 2 sistemas principais: Odeleite-Beliche a Sotavento e Odelouca a Barlavento. O primeiro está funcionar há alguns anos. Odelouca está parada há meia dúzia de anos. De quem é a culpa? Dos ambientalistas? Mas estes comportam-se como o lacrau da parábola do lacrau e da r㠖 está na natureza deles. Dos promotores do empreendimento? Mas eles estão impedidos de avançarem pelas decisões de Bruxelas de não financiar a obra devido à queixa da LPN. A culpa é de todos nós e deste laxismo emoliente em que vivemos.

O desleixo governamental de décadas deixou em autogestão uma série de institutos criados por esses governos e pagos pelo dinheiro dos contribuintes. Assim, em Portugal, começaram a ser classificadas áreas sob os mais variados pretextos: REN, Rede Natura 2000, biótipo Corine, paisagem protegida, etc., etc. O país ficou todo classificado (por exemplo, 43% do território do Algarve foi classificado na Rede Natura 2000, sendo a média portuguesa de 24%, enquanto na União Europeia a média não ultrapassa os 12%).

Por exemplo, quando se tentaram construir centrais eólicas, como elas têm que se situar em locais altos e menos habitados, verificou-se que não havia locais disponíveis: estavam todos classificados. Não se podiam abrir valas para a passagem dos cabos eléctricos porque se iria destruir a biodiversidade, as pás dos aero-geradores ameaçavam matar umas aves que tinham o hábito inveterado de passar por ali (como se as aves não fossem mais inteligentes que os seus defensores e capazes, ao fim de 3 ou 4 experiências desastrosas, de escolher outro percurso) … etc., uma desgraça. Todavia, como a alternativa às centrais eólicas é o incremento da energia térmica e o não cumprimento dos protocolos de Quioto e das directivas da UE, lá teve que ser: começaram a “desclassificar” as áreas em causa, uma a uma. Mais uma burocracia para atrasar um investimento indispensável.

O lince ibérico foi o “valor natural” mais importante que levou à suspensão do financiamento comunitário da barragem de Odelouca. A Comissão Europeia sustenta que não ficou provado que a barragem era indispensável para o abastecimento de água à região, enquanto um estudo publicado em 1998 apontava as serras algarvias (Odemira, Monchique e Caldeirão) como tendo a principal concentração de linces em Portugal - com 19 a 23 animais. Todavia esta informação baseava-se apenas em entrevistas com pessoas que afirmaram ter avistado linces, ou seja ... em boatos (Não seriam antes gambozinos?). Um trabalho posterior realizado pelo próprio ICN pôs aquela informação em causa, afirmando que, salvo os testemunhos verbais, nenhuma evidência concreta de existência do lince havia sido encontrada na região nos últimos dez anos.

Quando se fala no abastecimento de água ao Algarve, aparecem os radicais miserabilistas a clamarem contra os campos de golfe. Acontece que dos 250 milhões de m³/ano de água consumida anualmente naquela região, apenas 6% se destina a campos de golfe. Acontece ainda que os campos de golfe são a actividade que permite a hotelaria algarvia manter uma taxa de ocupação razoável fora da estação alta. Acontece finalmente que o turista do golfe é, de muito longe, aquele que mais despende per capita. O turismo do golfe está no topo do turismo de qualidade e tratar com ligeireza e pretenso moralismo esta actividade é matar uma das poucas galinhas dos ovos de ouro que nos restam.

Quando o ministro Nobre Guedes anunciou, há meses, que se perspectivava um período de seca e que as obras de Odelouca teriam que arrancar, os autarcas da região, achando embora que as obras deveriam arrancar, consideraram irresponsáveis as declarações do ministro. Os irresponsáveis, como se observa actualmente, foram esses autarcas, pois que produziram aquelas afirmações na ingénua esperança de não assustar o turismo, quando o que era premente era “assustar” Bruxelas, para desbloquear os financiamentos, demonstrando a urgência da barragem.

O ministrou entretanto, ainda antes das eleições, assinou um despacho para avançar com a construção da barragem, quer haja ou não fundos comunitários, enquanto o presidente da LPN ameaçou que tal decisão pode trazer «graves penalizações para Portugal» e que «dificilmente a obra poderá avançar», mesmo depois da reformulação do projecto, dado que «contém graves distorções ambientais» ... devido aos boatos sobre existência de linces numa área geográfica onde a barragem irá ocupar menos de 1% da superfície. É um folhetim que continuará, seguramente.

Na televisão passam continuamente imagens dos efeitos da seca nas culturas algarvias. Fala-se vagamente na Barragem de Odelouca, mas como quem tem audiência na Comunicação Social são os fundamentalistas do ambiente, quem é diabolizado são os campos de golfe. Ninguém faz conta à água consumida e a quem a consome; ninguém viu os linces; ninguém contabiliza as divisas que os turistas do golfe cá deixam e o seu efeito positivo na economia e no emprego no Algarve (e no resto do país). Tudo é desvalorizado face à iconoclasia do pecado do lucro.

Continuamos a ser um país de pensamento medieval, moralista e escolástico, convencidos que isso é ser “progressista”. Parecemos as multidões enfurecidas do início da Revolução Industrial que escavacavam as máquinas convencidas que eram elas a causa dos males da sociedade.


Nota: Segundo aquele “estudo” baseado em entrevistas, haveria em Portugal 40-53 linces, distribuídos por 5 pequenas populações: Algarve/Odemira (19-23 indivíduos), Vale do Sado (6-8), Malcata (7-9), S. Mamede (4-6) e Guadiana (4-7), as últimas três em contacto com populações espanholas. Ocorreria também, embora as “entrevistas” não fossem conclusivas, no Gerês, Montesinho, pinhais de Mira e Serra de Ossa.

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março 06, 2005

A Questão do Desemprego

Portugal não tem um problema do desemprego. Portugal tem três problemas de desemprego:

1 – Tem mais de 400 mil desempregados. Como o pleno emprego admite taxas da ordem de 3% ou 4%, incluindo o desemprego friccional, teremos, estatisticamente, mais de 200 mil desempregados que a nossa economia não consegue actualmente absorver;

2 – Parte significativa da indústria têxtil não é competitiva no actual quadro da globalização e da emergência da China, Índia, etc.. Há, igualmente um excesso de população activa na construção civil e tal não será sustentável a médio prazo. No conjunto estamos a falar de 200 mil a 300 mil efectivos;

3 – Há um excesso de empregados no sector público na ordem dos 200 mil a 250 mil efectivos, quando comparado com a média europeia. Este excesso de emprego, sem qualquer contrapartida a nível de qualidade de prestação de serviço (antes pelo contrário), cria um ónus pesado sobre o sector privado, quer pela fiscalidade excessiva (Daniel Bessa citou, há meses, uma folha do World Economic Forum sobre a competitividade dos países onde se via que entre 59 países, éramos a 57ª carga fiscal mais elevada), quer pelo péssimo funcionamento da máquina do Estado, que, ambos, desincentivam o investimento.

No total, estamos a falar de passar de 7% para 17% de taxa de desemprego (sem falar no desemprego induzido nos serviços pela diminuição dos rendimentos das famílias). A agravar a questão, muito daquele desemprego apresenta um claro sintoma de histerese, isto é, não parece recuperável.

A eficiência do mercado de trabalho consegue-se com a sua liberalização. No caso português é necessário que, para além da liberalização, o sector público seja profundamente reformado, porque só assim será possível o seu downsizing. O papel do Estado, para além de promover o seu downsizing, deverá ser o de remover todos os entraves à mobilidade do factor trabalho, assegurar que não há violações estruturais da concorrência, assegurar os cumprimentos contratuais nas relações entre os agentes económicos e a agilização da recuperação dos débitos.

As derrogações à liberdade contratual e à mobilidade do mercado de trabalho criam situações de imperfeição no modelo concorrencial que afectam a eficiência económica da sociedade como um todo e atingem, perversamente, aqueles que julgavam que essas derrogações os punham a salvo das “injustiças” do modelo concorrencial.

Na sequência do 25 de Abril, com o nobre intuito de proteger os trabalhadores, legislou-se no sentido de impedir qualquer despedimento ou flexibilização da relação laboral. Pensava-se que, com esses institutos legais, os trabalhadores ficariam eternamente protegidos contra a exploração capitalista. Rapidamente o poder político se apercebeu que aquela legislação tinha um efeito perverso na evolução económica, desincentivando os empresários em aumentarem o emprego, mesmo em períodos de expansão económica, colocando o país em estagnação económica, levando empresas à falência ou à deslocalização e diminuindo daquilo que se queria conservar: os efectivos da população activa. E assim, para introduzirem alguma flexibilidade num mercado de trabalho rígido e à beira do estrangulamento, apareceram a lei dos contratos a prazo e a proliferação do sistema de prestação de serviços contra recibos verdes, em completo arrepio ao espírito daquele sistema, inventado para as profissões liberais.

Aliás, a rigidez laboral tem igualmente efeitos negativos no comportamento e produtividade dos trabalhadores, retirando-lhes o estímulo pela inovação e requalificação e estimulando, em contrapartida, a sua aversão ao risco e à mudança.

Aqueles dois novos tipos de relações de trabalho tiveram um notável efeito estimulante na nossa economia e no nível de emprego. Portugal passou a ser, na União Europeia, o país onde o índice de desemprego era menor. Mesmo em períodos de grande crise, como no início da década de 80 ou no início da década de 90, enquanto o desemprego na Europa assumia níveis assustadores, em Portugal mantinha-se quase o pleno emprego.

Os empresários, em face de expectativas, mesmo medianamente favoráveis, admitiam pessoal com bastante facilidade, pois sabiam que podiam demitir esse pessoal, total ou parcialmente, quer se gorassem as expectativas, quer se o pessoal não satisfizesse profissionalmente. Na maioria dos casos verificou-se que essas admissões se tornaram permanentes porque a economia estimulada pelas decisões desses empresários cresceu o suficiente para assegurar a manutenção desse nível de emprego.

Portanto, a questão da mobilidade do factor trabalho, como regra geral, tem que ser encarada de frente e resolvida. Com a actualidade rigidez laboral do mercado “normal”, o país não é atractivo para o investimento de alta tecnologia, mas apenas para investimento não qualificado, aproveitando os “expedientes legais”.

A avaliação do comportamento económico das sociedades tem mostrado que a política de redistribuição de rendimentos terá que ser concebida de forma a não menoscabar a eficiência do tecido produtivo pois se este perder a eficiência haverá cada vez menos rendimento para redistribuir. É essa a lei do mercado e sempre que se tentaram implementar soluções de índole estatizante fixando preços e quantidades administrativamente, ignorando os equilíbrios que se geram num mercado eficiente, o resultado foi péssimo. A curto prazo os resultados parecem bons, enquanto dura o efeito das medidas estatais e o mercado não desenvolveu as respostas adequadas; a longo prazo é a catástrofe. Desde que existem trocas, que é assim: se se fecha a porta ao mercado ... ele entra pela janela.

Se o governo tomar as medidas certas, o desemprego irá aumentar a curto prazo, mas a economia será saneada e será possível um desenvolvimento sustentado futuro. Foi assim que sucedeu, por exemplo, em Espanha. Se não as tomar, talvez que o desemprego não aumente tanto no curto prazo, mas permaneceremos nesta situação de derrapagem económica, com prognóstico muito reservado, e o desemprego continuará a aumentar, a aumentar sempre. E quanto mais tarde se tomarem aquelas medidas, maior será o seu custo social e económico.

Publicado por Joana em 11:20 PM | Comentários (46) | TrackBack

Reescrever a História

A História não se reescreve. Interpreta-se. Os dirigentes soviéticos ficaram célebres por retocarem fotografias e assinaturas em documentos, à medida que dirigentes políticos, cujas caras apareciam nas primeiras e cujas assinaturas estavam apostas nos segundos, caíam em desgraça. Já aqui exprimi a minha opinião sobre a estrutura óssea de Freitas do Amaral. Também por isso, sinto-me com autoridade para dizer que esta atitude “moscovita” da Direcção do CDS/PP é ridícula, insensata e inútil. A História não se reescreve. Interpreta-se.

Publicado por Joana em 10:23 PM | Comentários (10) | TrackBack

março 04, 2005

Temos que viver com o que Temos

O problema socialista é o de não ter pessoas que estejam por dentro do tecido produtivo português. Portanto acaba por virar-se para os meios universitários ou para gente do sector público em geral. Em qualquer dos casos, os nomes apontados para as Finanças, Campos e Cunha, e para a Saúde, Correia de Campos, são fortes. Já aqui escrevi, por diversas vezes, que a diferença entre Correia de Campos e o actual ministro, no que respeita à política de Saúde, é que ... têm boys diferentes. No resto têm a mesma visão sobre a reforma do SNS. Resta saber se Correia de Campos tem apoio político para continuar as reformas.

Campos e Cunha é um nome sólido no que respeita à política orçamental. Todavia há um desafio importante: a reforma da administração pública, que é vital, pelas razões que já aqui escrevi diversas vezes. Só se conseguem cortar despesas no sector público se ele for reorganizado e reestruturado. Ora do lado dos especialistas do despesismo temos Vieira da Silva, no Trabalho e Solidariedade Social, que pertence ao Parque Jurássico do Socialismo. É um nome que, só por ele, pode comprometer toda a política económica e financeira do governo, a menos que lhe metam uma grilheta no tornozelo.

Na Economia e Inovação temos Manuel Pinho, que tem sido um personagem politicamente errático e sobre o qual se têm colocado dúvidas sobre o currículo académico, não sei se justificadas ou não. Via-o mais na área financeira que na área económica. É um homem que não conhece o tecido produtivo, o que não é um bom currículo para esta pasta.

António Costa parece-me bem na Administração Interna e como nº 2 do Governo. Mário Lino, que conheço bem, foi um bom Administrador da CDL, não gostei dele à frente das AdP e acho que não tem qualquer currículo para a pasta que sobraçará (ou ... sossobrará?). Parece-me o percurso do Princípio de Peter.

Já dizem, por piada, que com Diogo Freitas do Amaral nos Estrangeiros, teremos que cortar relações com os EUA ... É blague. Freitas do Amaral é caracterizado pela ausência de coluna vertebral que, pensava-se, distinguiria os vertebrados dos outros animais. Logo, adaptar-se-á ao que tiver que ser. Desde que teve que pagar do bolso dele, e dos sogros, as despesas da candidatura perdida, Freitas do Amaral resolveu que princípios, ideologias, etc., eram luxos despiciendos.

O resto é a gente do sector público do costume. Mudam-se os nomes ... o resultado é o mesmo.

Quanto a Vitorino, é a incógnita. Será o nome a propor pelo PS para PR? Veremos.

Publicado por Joana em 09:37 PM | Comentários (90) | TrackBack

O Novo Elenco Governativo

Semíramis encontra-se em condições de divulgar a composição do XVIIº Governo Constitucional. Foi uma negociação difícil, devida à correlação de forças no interior do partido, às dificuldades de obtenção dos necessários consensos, à compreensível repugnância que qualquer cidadão qualificado e competente tem pelo exercício de servir a coisa pública e à óbvia e abnegada ambição que qualquer cidadão desqualificado e incompetente tem pela obtenção de um sinecura governativa. Devido ao aperto orçamental, terá apenas 11 ministérios A composição é a que se segue:

Presidência do Conselho de Ministros [PCM] – Engº José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa

Ministério da Administração Interna [MAI] – Dr. J. S. C. Pinto de Sousa

Ministério das Actividades Económicas, Agricultura, Pescas e Florestas [MAEAPF] - Engº J. S. Carvalho P. de Sousa

Ministério do Ambiente, das Cidades, Administração Local, Habitação, Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional [MACALHOTDR] – Prof. Dr. Engº José S. C. P. de Sousa

Ministério da Educação, Ciência, Inovação e Ensino Superior [MECIES] – Prof. Dr. J. Sócrates C. P. de Sousa

Ministério das Finanças e da Administração Pública [MFAP] – Prof. Dr. J. S. Carvalho Pinto de S.

Ministério da Cultura, do Trabalho e do Plano Tecnológico [MCTPT] - Arqº José Sócrates C. P. de S.

Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações [MOPTC] - Engº J. Sócrates Carvalho P. de S.

Ministério da Defesa Nacional [MDN] - Almirante José S. Carvalho Pinto de Sousa

Ministério da Justiça [MJ] – Juiz Conselheiro José S. C. P. de S.

Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Turismo e das Comunidades Portuguesas [MNETCP] – Embaixador José S. Carvalho P. de Sousa

Ministério da Saúde, da Segurança Social, da Família e da Criança [MSSSFC] – Drª J. S. C. P. de Sousa

Este elenco assegura uma elevada coesão, tem uma aparente homogeneidade e pretende, pese embora as dificuldades compreensíveis e eventuais acidentes de percurso, ter uma única voz, ao contrário do que acontecia com o anterior governo

Publicado por Joana em 05:55 PM | Comentários (20) | TrackBack

março 03, 2005

Orçamento de Estado para 14 AD

Apresento seguidamente um exercício, com os mesmos pressupostos do exercício do post anterior, relativamente ao Orçamento do Estado Romano, genérico, durante o primeiro quartel do século I. Faço depois um exercício arriscado, relativamente ao cálculo do PIB do Império Romano (no conceito p.p.p. – purchase power parity, obviamente), e algumas comparações interessantes com o Estado português.

Estas receitas e despesas não incluem os valores relativos aos diferentes municípios das províncias que tinham algumas despesas administrativas e recebiam taxas para as solver. Provavelmente esses valores em falta não excederiam 20% do OE Romano, visto que as despesas militares (a fatia maior) e a administração provincial faziam parte do OE.

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Estes valores são consistentes com o superavit financeiro encontrado no erário público à morte de Tibério (14-37AD), de 2.700 milhões de sestércios (13.500.000 mil €), que era 24 vezes superior àquele valor anual (Tibério havia reinado 23 anos). Portanto este OE Romano poderia considerar-se um orçamento anual típico daqueles anos.

O PIB que calculei a partir daqueles valores baseou-se nos pressupostos indicados no quadro. Considerei que as actividades não agrícolas correspondiam a 40% dos valores anteriores e adicionei mais 40% sobre o total obtido, para ter em conta as actividades que não eram taxadas (aliados, etc.) e a subestimação da produção agrícola e mineira. Mesmo assim o PIB deve estar algo subavaliado

PIB_Roma.jpg

Plínio, quase um século depois, no tempo de Trajano, queixava-se das importações sumptuárias do Oriente (Índia, Pérsia, etc), sem contrapartida de exportações, que, segundo ele, ascenderiam a 100.000.000 sestércios por ano (500.000 mil €) o que é de facto uma soma avultada (cerca de 5% da despesa pública ou 0,6% do PIB).

Para comparar a fiscalidade e a despesa pública com o PIB, multipliquei aquelas por 1,2 para ter em conta despesas e receitas da administração própria dos municípios da província.

Não vale a pena fazer grandes reflexões. Todos falam do peso do Estado Romano que asfixiava a sociedade. É certo que, durante Tibério, as coisas funcionavam razoavelmente bem do ponto de vista administrativo. Mas comparando com o Estado português verifica-se que, este sim, asfixia a sociedade. É certo que o Estado português tem despesas sociais (o Estado romano também tinha algumas, como se pode ver), mas as nossas despesas não sociais representam 23% do PIB. E isso é asfixiante.

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março 02, 2005

O Mercado de Trabalho

... Há 2 mil anos ... em Roma

Aproveitando o silêncio socrático, vou-me debruçar hoje sobre a formação de preços no mercado de trabalho, no início do Império Romano. Há algumas curiosidades deveras interessantes.

Em primeiro lugar, é um erro supor que a economia romana se baseava fundamentalmente no trabalho escravo. Erro aliás que foi alimentado por uma leitura muito superficial de Marx. Numa população estimada de 60 milhões de habitantes (durante a dinastia Júlia-Claudiana, até à morte de Nero), ou talvez um pouco mais, 70 ou 80 milhões de habitantes, durante os Flávios (o apogeu do Império), os escravos não representariam mais de um sexto da população, embora na Itália (que só incluía a península) e na cidade de Roma representassem cerca de 30%.

Ora os Estados do sul dos EUA tinham, anteriormente à guerra civil, percentagens de escravos, relativamente à população total, superiores a 40% (Alabama, Luisiana e Geórgia) e mesmo 50% (Mississipi e Carolina do Sul), ou cerca de 40%, como na Virgínia e Carolina do Norte. Florida e Texas também tinham valores semelhantes, mas eram então muito pouco povoados. Todavia ninguém afirma que nos estados confederados o “modo de produção” era esclavagista. A diferença, profunda aliás, está em que a sociedade sulista livre tinha, toda ela, direitos iguais, ou seja, vivia em democracia, enquanto a sociedade romana estava muito estratificada.

Os cidadãos, cujo 1º censo, no tempo de Augusto, deu cerca de 4,5 milhões (só incluía os cidadãos capazes de pegar em armas) o que significaria cerca de 18 milhões de pessoas, e o último, no tempo de Vespasiano, 70 anos depois, deu cerca de 7 milhões (provavelmente 28 a 30 milhões de pessoas), aumento parcialmente devido à extensão da cidadania a alguns aliados, dividiam-se em diversas classes. Essas classes não derivavam de castas, mas da riqueza imobiliária, embora essa fortuna estivesse em paralelo com a “nobreza” da linhagem. Sem entrar na complicada divisão pelas “centúrias”, pode dizer-se, grosso modo, que havia os patrícios, a ordem equestre e os plebeus. Cada classe só podia aspirar a exercer certos cargos. Os outros estavam vedados. Os casamentos inter-classistas eram vedados ou tinham severas restrições. Todavia, as famílias ilustres tendiam a fortalecer-se através do matrimónio, e esses casamentos de conveniência eram a origem de uma crescente libertinagem de costumes. «Esta cidade» dizia Catão, «não passa de uma agência de casamentos políticos corrigidos pelos cornos».

Estas classes tinham, como escrevi, clivagens de acordo com a fortuna. A ordem senatorial obrigava a ter uma fortuna superior a 1 milhão de sestércios (o que estimo em 5,7 milhões €), enquanto que a dos cavaleiros impunha um limiar de 400 mil sestércios (2,3 milhões €). A população restante compunha-se dos cidadãos plebeus, libertos, aliados (gente livre que habitava as províncias) e os escravos. Portanto no tempo de Vespasiano, em cerca de 70 milhões, haveria cerca de 30 milhões de cidadãos, 10 a 15 milhões de escravos e 25 a 30 milhões de livres, mas não cidadãos. O Édito de Caracala, já na decadência do Império, estendeu a cidadania a todos os habitantes livres do Império. Todavia essa medida tinha apenas o objectivo de aumentar a base de incidência fiscal, que atingia sobretudo os cidadãos. Outra medida, para evitar a diminuição drástica de escravos, era a limitação às disposições testamentárias, quer fixando a proporção máxima de escravos que poderiam ser libertos, quer estabelecendo o máximo de 100. Durante a dinastia Flávia apareceu, no mundo rural, uma nova forma contratual, o colonato, que evoluiu para o que se denominou mais tarde servo de gleba. Nos finais do império a escravatura já era insignificante, tirando nalgumas grandes cidades, como Roma (mas nada comparável com o que era séculos antes).

Passemos aos salários. Comecemos pelos de diversas profissões:
Em primeiro lugar os romanos não cometeram o erro de todos os professores ganharem o mesmo. O salário dependia do nível e grau de ensino. Um professor de Retórica ou de Literatura ganhava 5 e 4 vezes mais que um professor de primeiras letras.
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Comparando o ensino com o trabalho manual, o professor elementar deveria estar equiparado ao trabalhador manual. Como os romanos tinham muito mais feriados e dias “inúteis” que nós, um trabalhador manual não trabalharia mais de 15 dias por mês. Assim sendo, ganharia o mesmo que um professor elementar com 15 alunos. Mas os professores recebiam adicionalmente bens em espécie, donde a situação de professor seria melhor que a do trabalhador manual.

Os escribas eram bem pagos. Hei-de calcular qual seria o meu estipêndio pelo que tenho escrito neste blogue, mesmo como escriba de 2ª! Cerca de 15€ por A4, eu deveria receber 30€ a 50€ por dia. Tanto quanto uma mulher a dias! Considerando que é um trabalho extra ...

Aparentemente os militares ganhavam menos que os trabalhadores manuais. Todavia tinham alimentação e alojamento grátis e recebiam, quando passavam à reserva, uma gratificação e uma propriedade rural. De notar que os pretorianos, tropa de elite que protegia o imperador, recebiam o triplo. Os efectivos militares variaram entre 250 mil e 350 mil soldados. Os pretorianos nunca atingiram os 10 mil efectivos.

Um escravo era mais caro que um muar, o que é lisonjeiro para a nossa espécie, e, no caso de uma jovem bela, pelos padrões da época, poderia atingir valores razoáveis.

Mas quem ganhava bem, eram os altos funcionários imperiais, senatoriais e da administração provincial. Há cargos que não tinham vencimento. O Imperador (Princeps) tinha o erário público por conta ... Os cônsules estavam um ano no cargo e a seguir iam como procônsules para as províncias, onde além do estipêndio avultado, recebiam “extras”. Às vezes tão volumosos, que levavam à sublevação da província.
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É óbvio que os decuriões ganhavam ao nível da tropa mais bem paga, mas cargos como o Prefeito do Pretório, ou o Prefeito de Roma (cargo que o assassinado Pedanius Secundus exerceu – ver post abaixo), ganhavam mais de 1 milhão de euros por ano. O mesmo sucedia com o Prefeito da Annona. A Annona era uma espécie de Rendimento Mínimo Garantido... pois tratava-se da distribuição de víveres aos proletários romanos (da cidade de Roma), que viviam da assistência do Estado (número que variou ao longo dos tempos, ultrapassando frequentemente os 200 mil, apesar da distribuição de terras para os incentivar a ter meios de subsistência próprios).

Mas os mais bem remunerados eram os governadores das províncias (procônsules e propretores) que recebiam mais de 5 milhões de euros por ano, fora o que receberiam “por baixo da mesa”. Ganhavam várias centenas de vezes o salário de um trabalhador manual.


Nota: Os valores em euros foram estimados a partir do teor em ouro do Áureo, subentendendo uma relação entre o preço do Ouro e da Prata de 12 para 1, relação que se manteve praticamente idêntica até ao século XVIII. No século XIX era de 15 para 1. A partir do último quartel do século XIX, a prata desvalorizou-se muito perante o ouro. Por sua vez o ouro tem-se desvalorizado desde meados do século XX. Estimei essa desvalorização de 1 para 6. Igualmente é difícil comparar preços em sociedades com “cabazes de compras” muito diferentes. O preço da alimentação, na sociedade europeia, não representará mais de 15% a 20% do orçamento familiar, enquanto na sociedade romana representaria certamente bastante mais de 50%.
Isto foi apenas um exercício que fiz, com algum critério, mas sem aprofundar muito por escassez de tempo.
Roma_moeda.jpg

Publicado por Joana em 07:54 PM | Comentários (35) | TrackBack

março 01, 2005

Tempos Muito Difíceis

A única coisa que transpirou do que está a acontecer com a futura estratégia e o futuro governo de Sócrates é que «vêm aí tempos difíceis». O problema é que não vêm aí, estão aí. O desemprego continua a crescer, e de forma “sustentada”, pois os efectivos que caíram no desemprego têm uma qualificação (e idade) que dificilmente permite que encontrem nova colocação. E se o encontrarem será com um salário significativamente inferior. A economia está estagnada e o desequilíbrio das contas públicas continua insanável. A nossa sociedade e a nossa estrutura produtiva estão anquilosadas.

O governo tem duas alternativas (embora se admitam alguns “paliativos” intermédios que apenas adiam o desfecho inevitável):

1) Corta a despesa até ao limiar aceitável, e isso exigirá uma reforma profunda do sector público, pois não basta “por cada 2 que se reformam (ou saem), admite-se1”. Num serviço desorganizado “por cada 2 que se reformam (ou saem), entram 3”. É a lógica das burocracias desorganizadas e ineficientes. Foi essa lógica que impediu uma contenção da despesa pública apesar dos cortes de Manuela Ferreira Leite.

2) Aumenta as receitas. Todavia este aumento está limitado pela própria situação económica. As empresas públicas, exceptuando talvez a EDP, vão entregar muito menos dividendos ao Estado do que se previa. Obviamente que o IRC liquidado (pelas empresas públicas e restantes) será igualmente menor. A estagnação salarial e do volume estacionário de emprego não augura nada de bom para o IRS. O governo pode optar pelo fundamentalismo fiscal. Mas é uma opção que pode ter custos sociais graves. A punção fiscal já é muito elevada para quem não está na “economia paralela”. Os trabalhadores independentes (refiro-me àqueles que são obrigados a passarem recibos de tudo o que ganham) estão a ser duramente atingidos. O eventual (e magro) aumento de receitas no combate à evasão fiscal deve ser aplicado em diminuir o peso fiscal dos que são obrigados a cumprir. Se o governo pretender aumentar as receitas pelo lado fiscal é capaz de ter a surpresa desagradável de ver as receitas descerem com taxas maiores, quer pelo efeito J.-B. Say, quer pela perda de competitividade das empresas, quer pela diminuição da base de incidência fiscal.

O governo e o país estão igualmente confrontados com a globalização e a liberdade de escolhas e de movimentação. O estado da nossa economia e este projecto mesquinho de empobrecimento em segurança que é defendido nos nossos areópagos políticos e sociais afugentam aqueles que têm mais potencial, porquanto estes podem obter resultados muito superiores, e intelectualmente mais estimulantes, com o mesmo esforço, em espaços económicos no estrangeiro. Não me refiro apenas aos empresários, mas aos quadros técnicos qualificados, quer tenham ou não instrução superior.

E se restarem apenas aqueles que estão conformados com a mediocridade e estão empenhados no “projecto de empobrecimento em segurança”, não percebo como irá sobreviver o Estado. Os paladinos estatizantes diabolizam aqueles que pretendem ganhar dinheiro, ter lucro, ter êxito financeiro. São émulos dos escolásticos da Alta Idade Média no que respeita ao horror pelo pecado do lucro. Mas lançam-lhes olhares cobiçosos para lhes tentarem extrair os lucros para se subsidiarem a si próprios e às suas actividades ineficientes ou mesmo estéreis. Todavia apenas conseguem matar a galinha dos ovos de ouro. É isso que os distingue do pensamento liberal, que prefere tratar a galinha o melhor possível, alimentá-la e robustecê-la, para lhe melhorar a postura, e não matá-la por um misto de ódio pelo êxito da postura e para sacar de uma vez todos os ovos.

Não amam o dinheiro produtivo, cobiçam-no apenas para o tornar estéril.

Publicado por Joana em 09:58 PM | Comentários (55) | TrackBack