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dezembro 01, 2003

1640

Hoje é o dia 1 de Dezembro de 2003. Comemora-se a restauração da independência do país. Foi uma data extremamente importante para nós e da qual todos andamos esquecidos. Por isso venho aqui lembrá-la. E não apenas pela efeméride em si, mas para provar que os portugueses quando têm um objectivo e conseguem mobilizar, para a sua execução, as suas capacidades num clima de unidade e de consenso nacionais, conseguem-no atingir.

Como citar autores portugueses para comemorar glórias lusas poderia levar a pensar a inexistência de independência de julgamento sobre este evento, vou citar o Abade Vertot (“Histoire des revolutions de Portugal”), autor francês que nasceu ainda decorria a guerra da restauração, portanto praticamente contemporâneo dos acontecimentos.

Escreve Vertot na introdução: “Provavelmente nunca se viu na história outra conjura que, como esta, se possa denominar justa, quer no que respeita aos direitos do príncipe, o interesse do estado, a inclinação do povo, ou mesmo os motivos da maioria dos conjurados; outra conjura que tenha sido confiada a um tão grande número de pessoas de todas as idades, de ambos os sexos, de todas as condições e de um temperamento tão fogoso, e por consequência tão pouco apropriadas ao segredo; outra conjura que, enfim, tenha tido um sucesso tão completo e que tenha custado tão pouco sangue”.

Vertot mostra-se profundamente impressionado por um reino, sujeito 60 anos antes pelo mais poderoso monarca da Europa de então, aparentando ser a província mais dócil dos seus estados, num dia, apenas num dia, mudar radicalmente o seu destino. Esse empreendimento foi, por assim dizer, um segredo confiado a toda uma nação, que não transpirou em nenhum círculo, e a sua execução, que inúmeros acidentes poderiam ter feito parar, foi um êxito completo e imediato. E o êxito do golpe em Lisboa alastrou em menos de uma semana a todo o território e, com a rapidez com que as notícias chegavam, a todas as colónias da coroa portuguesa.

Margarida de Saboia, Duquesa de Mântua, governava então Portugal com o título de vice-rainha. Mas na prática tinha um poder limitado. Quem governava era o secretário de estado Miguel de Vasconcelos que recebia ordens directamente do conde-duque Olivares. Este estimava Miguel de Vasconcelos pela habilidade como conseguia extorquir somas consideráveis de Portugal para financiar as guerras europeias do rei de Espanha.

O Duque de Bragança, cuja casa se havia considerado como a candidata à coroa com mais direitos após a morte de D. Sebastião, seria a personalidade natural para chefiar uma conjura. Olivares trazia-o sobre permanente vigilância, mas o duque, ainda por cima casado com uma espanhola(*), irmã do Duque de Medina Sidónia, passava a vida em festas, caçadas, ócios, etc., no seu palácio de Vila Viçosa, longe de Lisboa, provável epicentro de qualquer conjura.

Após as Alterações de Évora, o governo de Madrid tentou afastar D. João de Portugal oferecendo-lhe a governação do Ducado de Milão e, após a recusa a pretexto de questões de saúde e de ignorância da política italiana, o rei de Espanha convidou-o a encabeçar a nobreza portuguesa e tropas levantadas em Portugal para combater a insurreição da Catalunha. Seria uma proposta irrecusável. Mas o Duque de Bragança recusou-a alegando dificuldades financeiras para custear tal empreendimento.

A diligência seguinte foi tentar raptá-lo. Depois de uma primeira tentativa falhada, o governo espanhol encarregou o Duque de Bragança de vistoriar as praças fortes portuguesas. Como estas praças estavam todas com guarnições castelhanas, a ideia era obrigá-lo a uma reclusão forçada. Todavia o Duque de Bragança fez funcionar esse cargo em seu benefício. Utilizou aquelas funções, e o dinheiro que lhe puseram à disposição para as exercer, para colocar gente fiel em lugares importantes. E fazia-se acompanhar nas vistorias de uma comitiva tão numerosa que nunca foi viável levar à prática as pretensões de Olivares de o aprisionar numa das praças. E assim, D. João percorreu livremente o país de lés-a-lés, contactando a nobreza e militares, com o aval das funções que exercia.

Pinto Ribeiro, intendente da Casa de Bragança, conspirava em Lisboa, junto da nobreza e da burguesia. O comércio com o ultramar desviado de Lisboa para Cádiz, os fundos que deveriam ser empregues na defesa do Brasil (parcialmente ocupado pelos holandeses), de África e do Oriente desviados para as intermináveis guerras europeias dos Filipes, os cargos públicos principais e melhor remunerados entregues a espanhóis, a soldadesca espanhola aquartelada nas principais praças fortes portuguesas enquanto se levantavam forças militares em Portugal para servirem na Catalunha e noutros pontos de conflito.

Finalmente veio a notícia para o Duque de Bragança se apresentar na corte de Madrid para fazer o relato das acções de vistoria que tinha realizado. O Duque de Bragança conseguiu, com algumas manobras dilatórias, protelar a viagem, mas foi o sinal para os conjurados se apressarem.

Sábado, 1 de Dezembro de 1640, os conjurados fizeram-se transportar em liteiras e seges, para mais facilmente dissimularem as armas, por diferentes caminhos, para estarem às 8:30 junto ao Paço da Ribeira. Às 9 horas apearam-se e passaram à acção.

Um grupo dominou a guarda alemã, que apanhada desprevenida, não ofereceu resistência. Um segundo grupo encarregou-se de uma companhia espanhola que fazia guarda ao Forte do paço. Atacada de surpresa, os espanhóis renderam-se em poucos minutos. Um terceiro grupo penetrou no palácio em busca de Miguel de Vasconcelos, dominando todos os que se tentaram interpor até encontrar, liquidar e defenestrar o secretário de estado. Quando o grupo de conjurados que tinha por missão capturar a Vice-Rainha chegou aos seus aposentos, esta pensou que a revolta era contra Miguel de Vasconcelos, que ela também detestava e tentou apaziguar os conjurados. Estes explicaram o que estava em marcha e prenderam-na nos seus aposentos.

A quase totalidade da nobreza e alta oficialidade espanhola com funções de chefia nas diferentes guarnições de Lisboa e dos arredores estava no Paço, o que permitiu a sua captura imediata e decapitar as chefias militares espanholas. Das janelas do Paço surgiam proclamações aclamando D. João IV e a destituição do monarca espanhol.

Era certo que o castelo de S. Jorge e os fortes e torres da barra ainda estavam em poder dos espanhóis. No Tejo estava ancorada uma frota de três poderosos galeões espanhóis bem armados. Mas o movimento popular de apoio à conjura era demasiado impetuoso para ser detido. O Senado de Lisboa foi invadido pela chusma e o seu presidente entregou a bandeira da cidade afim de se proceder à aclamação do novo rei.

Antão Vaz de Almada ordenara entretanto à ex-vice-rainha para intimar a guarnição do castelo de S. Jorge a render-se, com a ameaça de fuzilar toda a nobreza espanhola capturada e mantida como refém. A duquesa aterrorizada assinou a ordem, convencida que o comandante do castelo não a cumpriria, por ter sido extorquida à força. Com essa ordem Antão Vaz de Almada, à frente de um pequeno grupo de conjurados e de uma multidão enorme mas desarmada, entrou no castelo e tomou posse do mesmo. O estupor e a surpresa dos espanhóis era tal que apesar da numerosa guarnição estar bem municiada e artilhada, capitularam sem resistir (**).

Os conjurados efectuavam os seus golpes com uma precisão milimétrica, com ardor e fogosidade, mas com espantosa frieza e objectividade, absolutamente seguros do que pretendiam, com completa confiança nos efeitos que iriam produzir e nos resultados que iriam obter, e perfeitamente certos da adesão popular que congregariam.

Os galeões espanhóis surtos defronte da Boa Vista (onde é hoje a Av. 24 de Julho) foram capturados por abordagem de pequenos barcos portugueses, ao estilo rocambolesco dos filmes de piratas de Hollywood (parte da oficialidade e marinhagem dos galeões havia entretanto sido capturada em terra). A última fortaleza da vizinhança de Lisboa a render-se foi a de S. Julião da Barra, sem combate e apesar de dispor de muita artilharia grossa, pólvora e mais de seis mil mosquetes. Antes tinham caído, sem combate, o Castelo de Almada, as torres da barra (Belém, Torre Velha, S. António e Bugio) e o forte de Cascais.

A rapidez dos conjurados, a precisão com que as diferentes acções foram delineadas e executadas, o efeito surpresa e a determinação de conjurados e de toda a população tiraram qualquer veleidade de resistência às estupefactas guarnições espanholas (cerca de 6.000 militares espanhóis, alemães e italianos só na zona de Lisboa). Os portugueses favoráveis a Filipe IV, que os havia na nobreza e no clero, também não reagiram. Muitos mudaram de campo e alguns envolveram-se meses depois numa conjura facilmente descoberta.

As repartições públicas continuaram a funcionar como de costume, mas os despachos das repartições e as sentenças dos tribunais, começados às 9 horas da manhã daquele espantoso sábado, em nome do rei espanhol ou da vice-rainha italiana, prosseguiam depois do meio-dia em nome do rei português. O mundo nunca tinha assistido a uma revolução assim: em duas horas um povo tomava nas suas mãos o seu destino e liquidava o domínio estrangeiro de uma grande potência de forma quase incruenta (morreram 3 homens, incluindo Miguel de Vasconcelos). E tudo continuava a funcionar, apenas acontecera o país mudar de donos. Bastou uma primeira arrancada de quarenta e tantos fidalgos e algumas centenas de homens do povo e a adesão imediata e unânime da população da capital.

D. João IV entrou em Lisboa a 6 de Dezembro, vindo de Vila Viçosa, entre ruidosas aclamações. Nessa altura já se tinham realizado autos de aclamação do novo rei em todas as cidades e vilas do reino. Os resultados da acção do 1 de Dezembro superaram de tal forma quaisquer expectativas que houvesse, que criaram um clima de exaltação patriótica tão poderoso, de tamanha confiança nas capacidades de Portugal e da protecção divina que este teria (***), que levou de roldão quem se lhe quisesse opor. O “milagre de Lisboa” foi um tónico estimulante para a nação portuguesa e teve um efeito completamente desmoralizador nas forças espanholas que, nos primeiros anos que se seguiram àquele dia, não tentaram qualquer acção militar digna de relevo para reaver o seu antigo domínio.

A maioria dos fidalgos portugueses que servia em Espanha largava os seus empregos e posições e atravessava a fronteira a oferecer os seus préstimos ao novo rei. Oficiais e soldados portugueses a servirem na guerra da Catalunha desvaneciam-se no ar e só voltavam a materializarem-se em Portugal. Uma companhia portuguesa atravessou a Catalunha em rigorosa formação militar e com tal à vontade que os espanhóis julgaram que ia numa missão, entrou em França, obteve 5 navios em La Rochele que dias depois fundeavam no Tejo. Francisco Manuel de Melo, que governava Ostende, na Flandres, em nome de Filipe IV, abandonou o posto e dirigiu-se para Londres ao encontro do embaixador português que não tardaria.

Os 500 estudantes portugueses que estudavam em Salamanca, ao saberem a 9 de Dezembro do “milagre de Lisboa”, desistiram de continuarem os estudos naquela universidade, organizaram-se em coluna e partiram imediatamente para Portugal. Ninguém teve coragem de os impedir.

Olivares que inicialmente pensava tratar-se de uma pequena conjura, rapidamente se apercebeu que era todo um povo que teria pela frente.

Todos os dias chegavam dezenas de correios à capital noticiando que esta e aquela cidade ou vila tinha proclamado o novo rei e que as guarnições espanholas tinham capitulado, quase sempre sem combate. Vertot escreve que era como se houvesse em todas as cidades e vilas do país conspirações semelhantes à de Lisboa que se desencadeavam logo que havia notícia do ocorrido na capital e com os mesmos resultados. Vertot refere que os oficiais e soldados espanhóis “fugiram do país com a mesma precipitação com que criminosos fogem da prisão” e que “em menos de 15 dias não havia um único espanhol em Portugal que não estivesse preso”.

O ministro inglês em Lisboa durante a época das lutas entre D. Afonso VI e o infante D. Pedro, ainda durante a guerra da restauração, Sir Robert Sthouwell, escrevia que: “se quereis ver os portugueses vencidos, deixai-os uns com os outros”. Menos de 2 décadas depois da conjura do 1º de Dezembro os portugueses já tinham perdido a capacidade de unidade e de consenso nacionais que tinham mostrado naquela primeira quinzena de Dezembro em que liquidaram o domínio de uma das principais potências da Europa, da potência que então disputava a primazia com a França.

(*) Mulher que, embora espanhola, teve um papel determinante em incentivar o marido para aderir à conspiração (“antes morrer reinando, do que viver servindo”) e cuja regência foi de uma energia notável e de uma clarividência inestimável. Foi a ela que se deveu a contratação de Schomberg para reorganizar o exército português.

(**) O que é notável é que o único que esboçou resistência foi Matias e Albuquerque o futuro herói da guerra da restauração, que estava detido no castelo havia 5 anos. Em face do tumulto, que julgava tratar-se de um motim da populaça, e perante a passividade da oficialidade espanhola, mandou formar os artilheiros e dispor as peças e dirigiu-se às ameias para comandar a acção. Todavia, ao ouvir tocar os sinos da Sé e de outras igrejas, teve um pressentimento do que se estaria a passar. Mandou retirar os artilheiros, regressou ao cárcere e esperou.

(***) O baixo clero participou activamente na revolução, mesmo nas acções armadas. Nas igrejas os sermões referiam dezenas de milagres que atestavam a protecção divina que o país teria. Aliás a espantosa facilidade com que desabou em poucos dias o poderoso dispositivo militar espanhol facilitava a interpretação da intervenção divina num evento que não parecia explicável por causas naturais.

Publicado por Joana às dezembro 1, 2003 09:56 PM

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» 1º de Dezembro from Viagens em terra alheia
O dia de hoje tem decorrido lento, como se fora domingo, o oposto do que em Lisboa, suponho, se terá passado em 1640. Para além do notável serviço que prestaram à portugalidade, ainda que na altura não pudessem alcançar a... [Ler...]

Recebido em dezembro 1, 2005 07:15 PM

» 1º de Dezembro from Viagens em terra alheia
O dia de hoje tem decorrido lento, como se fosse domingo, o oposto do que em Lisboa, suponho, se terá passado em 1640. Para além do notável serviço que prestaram à portugalidade, ainda que na altura não pudessem alcançar a... [Ler...]

Recebido em dezembro 1, 2005 07:21 PM

Comentários

Aqui encontra-se material para todos os gostos

Publicado por: Gros às dezembro 2, 2003 12:17 AM

1640 Segundo A Planície:

''A CONJURA
-Oh D. Miguel de Almeida, por quem sois? Não me maceis... Aqui, onde me vedes, farto-me de curtir... Caça, mesa, caça, mesa, cama... Que melhor vida posso eu querer? Dizei-me.
-Oh D. João, meu dono e senhor, meu principe... Essa vida de nababo não vos pode levar a outro lado que não à perdição!
-Não me maceis D.Miguel... está quase na hora do jantar e tenho mais que fazer...
D. Miguel de Almeida, D. Antão de Almada, João Pinto Ribeiro, Pedro de Mendonça Furtado e Jorge de Melo ajoelharam-se com os lábios trémulos e os olhos lacrimejantes. Em coro:
-D. João porra!...
-O QUÊ???!!!!
De novo em coro:
-Desculpai-nos...
D. Miguel de Almeida, o mais velho, tomando a palavra :
- Sua Magestade, perdoai-nos, estamos desesperados. Queremos ser importantes, ter terras, ir ao programa do Herman, aparecer na televisão...
Somos fidalgos. Bons fidalgos e já estamos fartos de falar com labregos... é só futebol e bigbrothers...
Precisamos dos grandes espaços públicos, dos grandes fora...
-Mas porque é que não saiem mais?
-Temos vergonha.
-De quê?
-Qualquer senhorito tem mais criadagem que o mais rico de nós... é humilhante...
- Ora... a fidalguia vê-se pelos actos! Tomai vergonha, tomai valores!
-É isso que queremos fazer! Retomar os valores da nossa portugalidade.
-Da vossa quê?
-Portugalidade.
-Que raio de termo... isso vai ser 'chique' daqui por uns anos?!
-Claro. Um 'must'!- apressou-se a esclarecer D.Pedro.
-Atentai. Eu confesso que já estou farto de andar atrás das perdizes e das lebres... Os ursos estão de resto e tenho medo dos javardos... As fêmeas são perigosas... Quantos sois?
-Por alto, Vª Senhoria, contamo-nos quarenta. Pouco mais, pouco menos...
-E isso tem pernas?...
-Sua Magestade... Évora, em 1637, foi um sucesso.
-Bahhh... um sucesso. Foi como a das maçarocas... e como a dos coronéis... Atoardas... Coisa de doidos... Humpf, o Manuelinho!... Se houver um bom plano... pode ser... Não me apetece ser desterrado ou preso numa torre qualquer...
Pedro de Mendonça Furtado e Jorge de Melo entreolharam-se. Já lhe doíam os joelhos. Um dos cães de D. João de Bragança preparava-se para assinalar as costas de Jorge de Melo como seu território. Agora precisavam de um bom pretexto para se levantarem. Urgia fazer algo... Foi Pedro Mendonça Furtado quem falou:
-Sua Magestade, temos um bom plano... Se nos quiser ouvir teremos muito gosto. Trago com a minha pessoa um plano que, numa mesa grande, poderíamos avaliar.
-Seja. Levantai-vos e segui-me.
-Obrigado Vossa Graça... Com licença.
Resultara. Podiam finalmente esfregar, aliviados, os joelhos. O chão estava gelado... Raio de ideia aquela de se atirarem ao chão. Que melodrama... Irra!
Seguiram, finalmente o balofo duque até uma mesa grande na sala de caça.
D. João mandou que a criadagem presente afastasse dali as perdizes que depenavam.
Assim se fez.
A lareira crepitante convidava à conspiração...
Foi outra vez D. Miguel quem tomou a palavra:
-Sua Magestade a situação está madura. O Usurpador tem que se haver com os Catalães, com os Holandeses e com os Franceses que nos apoiam.
-Com os Franciús. Esses filhos de uma cadela serão de confiança?
-Nunca foram. Mas Magestade... é o que temos.
-Adiante, adiante... -Ordenou o anafado Duque algo desalentado.
-Bom é simples:
No próximo sábado, Primeiro de Dezembro , um grupo de quarenta pessoas dirigir-se-á, pelas nove horas da manhã, ao Paço da Ribeira, onde se procurará vencer a resistência da Guarda Real e reduzir ao silêncio a duquesa de Mântua, essa tinhosa governadora do Reino e o torpe Miguel de Vasconcelos. Caber-me-á a mim,D. Miguel de Almeida, ancião de todo o grupo, proclamar a realeza do Duque de Bragança; Vossa Mercê.
-Isso é um plano? Que raio de plano é esse?!
-Tenho fé que vai resultar...
-Bof! A vossa sorte é que a minha mulher quer ser rainha...
-Abençoada Senhora!
-E o que pensam fazer à duquesa e ao Miguel?
-Logo se verá... atiramo-los fora... se calhar...
A ironia nos olhos do futuro monarca assomou por entre as pregas de gordura faciais.
-Grande plano... Já ganhámos... Olhai senhores o que vou fazer: vou ficar aqui em Vila Viçosa. Com um plano desses nem saio de casa. Irra! Não podiam passar o tempo a ler César, por exemplo, ou outro estratego qualquer... Isso não é um plano. Isso é uma declaração de intenções. Que país será o nosso se tiver a sua independencia restituida com um plano desses? Nem quero imaginar!...
-Sua Magestade, perdoai-me a insistencia... Nós levaremos esta ideia por diante. Só precisamos que assuma o trono após a revolta.
-Eu depois levo-vos uns cigarros e umas revistas à prisão...
-Obrigado Alteza.-Agradeceram os conjurados ignorando a ironia.

Só, junto à lareira, D.João de Bragança sorria-se da imbecilidade dos conjurados. Repetia insistentemente 'querem ser independentes... para quê?'
Abanando a cabeça com um sorriso bonacheirão deitou-se. No fundo aqueles fidalgotes até eram castiços...''

Um abraço,
Francisco Nunes

Publicado por: Planície Heróica às dezembro 2, 2003 01:33 AM

Caro Francisco Nunes
‘Tá giro, mas como obra de ficção, pois não me parece que corresponda muito à verdade histórica. D.João IV esteve hesitante, mas mais por feitio pessoal que por outra causa. O principal organizador da conjura foi o seu intendente Pinto Ribeiro.

Não é possível agora, nem naquela época, saber o que se passava na cabeça dos conjurados. Mesmo que fossem uns “castiços” o certo é que, objectivamente, correu tudo “sobre rodas”. Não é apenas a minha opinião, é a opinião da Europa de então que transparece claramente na obra do Abade Vertot.

Pode ser que eles tenham planeado as acções apenas sobre os acontecimentos, “à portuguesa”. Agora que era impossível terem tido uma execução mais perfeita, é um facto.

E obrigada por me dar a conhecer o seu texto. E felicidades para a Planície Heróica!

Publicado por: Joana às dezembro 2, 2003 01:56 PM

Obrigado pelas palavras.
É claro que esse texto pretende ser uma paródia.
Um pouco mais a sério: o Abade Vertot não era propriamente um elemento neutro...
Um abraço,
Francisco Nunes

P.S. Estimo verificar que, à parte a minha humilde pessoa, ninguém a tem tratado mal ultimamente. Força.

Publicado por: Planície Heróica às dezembro 2, 2003 03:28 PM

Embora às vezes seja partidário do slogan "de Espanha nem bom vento, nem bom casamento", vou dizer algo de contraditório e bastante políticamente incorrecto.

O que seriamos hoje, como POVO, se não tivesse acontecido o 1º de Dezembro de 1640?

-Teriamos a mesma identidade cultural?

-Estariamos a lutar pela nossa autonomia, ou pela nossa independência?

-Estariamos já todos assimilados pela lingua de Cervantes?

O rol de questões podia
prolongar-se interminavelmente.

No entanto, e raciocinando bem, prefiro ser português, porque, como bem disse o Marquês de Pombal a um emissário de Castela (?) "Pode tanto cada um em sua casa, que mesmo depois de morto são precisos 4 para o levar delá para fora".

Publicado por: Luis Filipe às dezembro 2, 2003 07:26 PM

Francisco Nunes:
Onde é que você me tratou mal?
Quanto a Vertot ele afirma no seu livro que procurou informar-se junto de autores portugueses e espanhóis.
Nota-se uma grande simpatia pela forma como decorreu a conjura, mas julgo que ele se "apaixonou" pela história em si, e não por ter um parti pris.
Ele era francês, mas se a França enquanto esteve em guerra com a Espanha nos foi favorável a seguir à Paz dos Pirinéus abandonou-nos completamente e Mazarino deu a entender que dava as mãos livres aos espanhóis na questão portuguesa.
Foi a partir daí que a Espanha concentrou as forças na guerra com Portugal e se deram as batalhas mais decisivas.

Publicado por: Joana às dezembro 2, 2003 11:52 PM

Interessante tema. Também penso, como Francisco Nunes, que o Abbé de Vertot não era imparcial. Embora isso não retire um átomo de qualidade à sua história da conjura de 1640.
Não é irrelevante saber-se que foram Fontenelle e o Abbé de Saint-Pierre que sugeriram ao senhor de Vertot que escrevesse uma história da revolução portuguesa. Mas também não são meras coincidências as ligações de Vertot aos Jesuítas e à Ordem de Malta.
Louve-se a lembrança de Joana de citar a obra de René Aubert, praticamente desconhecida em Portugal.

Publicado por: (M)arca Amarela às dezembro 3, 2003 05:17 PM

É bom que de facto alguém se lembre destas coisas, numa altura em que andamos todos irritados e de auto-estima em baixo

Publicado por: A Valente às dezembro 3, 2003 10:19 PM

Nota:
Consultei o livro do Abade de Vertot, mas também Damião de Peres, Rocha Martins e, como seria incontornável, o Conde da Ericeira, D. Luiz de Meneses - "Historia de Portugal Restaurado".

Achei graça ao interesse manifestado por Vertot, ainda por cima estrangeiro, por isso centrei a minha atenção no seu livrinho.

Publicado por: Joana às dezembro 3, 2003 10:59 PM

Na situação de depressão que o país atravessa sabe bem ler este texto.

Publicado por: Rita às maio 15, 2004 06:16 PM

Cara Joana,
ao fazer uma busca sobre a Restauração de 1640, venho a encontrar o seu artigo. Gostei. Veio confirmar um outro que havia encontrado no mesmo dia em http://www.reallisboa.pt/boletim/37/restauracao.html
Ambos contêm a precisão que procurava. Fico-lhe grato. Jorge Angelino

Publicado por: Jorge Angelino às maio 26, 2004 08:36 AM

Deveriam explicar melhor o 1 de Dezembro de1640

Publicado por: Eliana Machado às novembro 18, 2004 09:15 PM

Eu queria saber o que aconteceu no 1 de Dezembro e porque é que aconteceu e o que aconteceu depois mas nada disso está aqui escrito

Débora

Publicado por: Débora Rodrigues às novembro 20, 2004 04:53 PM

eu queria saber os acontecimentos do dia 1 de Dezembro de 1640, por ordem cronológica, max aqui não estão, esta e outros aspectos como erros ortográficos, acho que deveriam melhorar, mas de resto está até bem organizado...

Publicado por: anónimo às janeiro 31, 2005 08:29 PM

Pra ser sincera o teu documento sobre o dia 1 e dezemnro esta bom. Tens uma boa história e para mais tens um vocabulário excelente, soubes te usar o portugues que é a coisa mais linda que existe no mundo, O NOSSO PORTUGAL. Parabéns pelo trabalho.

Publicado por: Daniela Faria às novembro 11, 2005 12:49 PM

Pra ser sincera o teu documento sobre o dia 1 e dezemnro esta bom. Tens uma boa história e para mais tens um vocabulário excelente, soubes te usar o portugues que é a coisa mais linda que existe no mundo, O NOSSO PORTUGAL. Parabéns pelo trabalho.

Publicado por: Daniela Faria às novembro 11, 2005 12:49 PM

Pra ser sincera o teu documento sobre o dia 1 e dezemnro esta bom. Tens uma boa história e para mais tens um vocabulário excelente, soubes te usar o portugues que é a coisa mais linda que existe no mundo, O NOSSO PORTUGAL. Parabéns pelo trabalho.

Publicado por: Daniela Faria às novembro 11, 2005 12:49 PM

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