« Défice democrático e a Esquerda | Entrada | Iraque Virtual »

janeiro 31, 2005

Metas Aspiracionais e Indicativas

Enquanto os líderes dos dois maiores partidos andam empolgados pelo país a prometer meter Portugal nos eixos – 150 mil novos empregos, crescimento de 3% ao ano, emagrecimento da FP em 75 mil efectivos (PS); ou peso do Estado no PIB de 48% para 40%, diferencial de produtividade face à média da UE de 64% para 75%, peso da economia paralela no PIB de 23% para 10% (PSD) – os seus assessores são mais comedidos: Mexia referiu, na 5ª feira, que estes números eram “Metas Aspiracionais” e Vitorino asseverou, na entrevista ao programa "Diga Lá Excelência", que veio a lume hoje no Público, que aqueles números eram “Metas Indicativas".

Quer um quer outro são indivíduos competentes e sensatos, com experiência, um com experiência mais empresarial (Mexia), outro mais administrativa (Vitorino), mas ambos com práticas vividas que lhes sugerem que, embora aqueles números correspondam a vontade de mudança das estruturas do país por parte das lideranças de ambos os partidos, a dura realidade dos hábitos instalados no sector público, os lobbies sindicais e os interesses corporativos, que também se insinuam internamente quer no PS, em maior grau, quer no PSD, irão dificultar as acções correctivas e que aqueles números quase de certeza não serão atingidos.

Uma plumitiva do Público, Eunice Lourenço, com a objectividade e o espírito de isenção que a caracteriza, desancou no Sábado passado, no Público, o PSD pelas declarações de Mexia, dizendo que foi “o sinal mais evidente do desnorte e desgoverno em que vai o PSD e o reconhecimento mais descarado do verdadeiro programa eleitoral do PSD”. E a partir daí seguiu furibunda, glosando em diversos tons agrestes o conceito de “Metas Aspiracionais”.

Eunice Lourenço cometeu dois erros. O primeiro foi a forma acintosa e desabrida como caracterizou a conferência de imprensa de António Mexia. São palavras espectáveis de responsáveis pela campanha do partido opositor, ou de quem não aprecie o actual PSD ou apenas António Mexia. Todavia, são palavras que deveriam ser evitadas por uma jornalista, de um jornal de referência, quando noticia um evento.

O segundo erro de Eunice Lourenço foi a sua precipitação. Quando escreveu aquela diatribe, ou pelo menos quando ela veio a lume, já Vitorino havia dado a entrevista onde falava das “Metas Indicativas”. Teria sido preferível ter ficado calada, pois agora Eunice Lourenço tem a obrigação ética de produzir uma igualmente furiosa catilinária contra o “desnorte e o desgoverno” de Vitorino. Isto admitindo que Eunice Lourenço tem qualquer ética profissional.

Da entrevista de Vitorino respigo o seguinte parágrafo, pelo que ele tem de lucidez, vindo, como veio, de um destacado militante do PS e membro do governo de Guterres. Sobre as expectativas falaciosas de progresso criadas no país durante o consulado de Guterres, Vitorino reconhece a responsabilidade do PS, “pela perspectiva de adesão ao euro e a baixa das taxas de juro, o que provocou um desafogo extraordinário nas famílias e, portanto, uma espiral de sobreendividamento. A verdade é que nos devíamos ter concentrado mais nos "basicks", como dizem os ingleses. E isso o que é? Neste período de integração europeia fomo-nos aproximando do rendimento médio per capita a nível europeu e tivemos um progresso assinalável com cerca de 20 pontos acima em matéria de rendimento per capita mas a nossa produtividade como país não acompanhou essa subida de rendimento.”.

Ora isto corresponde a afirmações que eu tenho produzido aqui e contrariam a generalidade das declarações de dirigentes do PS, como Cravinho e Santos Silva, entre muitos outros. Vitorino reconhece que o nosso crescimento de então era falacioso. Era o crescimento do rendimento das famílias decorrente da política de despesa pública de Guterres, mas esse crescimento do rendimento não tinha contrapartida no crescimento da produtividade. Era artificial e teria impacte negativo no défice orçamental e no aumento do saldo negativo das nossas contas com o exterior.

Não é possível sustentar o crescimento do país baseado no aumento da procura interna (consumo), sem correspondente aumento da oferta interna. E como parte do aumento do consumo se dirige a bens importados, parte do aumento dessa oferta interna deve dirigir-se à procura externa, de forma a assegurar o equilíbrio da balança de transacções com o exterior.

Vitorino compreendeu isso perfeitamente. As declarações dos restantes líderes do PS não evidenciam, de forma alguma, essa compreensão.

Publicado por Joana às janeiro 31, 2005 08:52 PM

Trackback pings

TrackBack URL para esta entrada:
http://semiramis.weblog.com.pt/privado/trac.cgi/71636

Comentários

Mexia aspira a que as coisas aconteçam; Vitorino indica o gostaria que a malta fizesse.
E nós temos que escolher um deles

Publicado por: c seixas às janeiro 31, 2005 08:49 PM

ou não escolher nenhum..

Publicado por: the little big man às janeiro 31, 2005 10:13 PM

Pelo que foi dito por Joana, nem sequer vale a pena discutir as propostas de Mexia tão desparatadas elas são!
Pelo contrário as de Vitorino merecem-lhe algum crédito.
Ainda bem!

Publicado por: E.Oliveira às janeiro 31, 2005 10:26 PM

Conclusão : Mexia versus Vitorino , estão bem um para o outro e a Joana gosta ; o que ela não suporta são jornalistas, pior se forem do sexo feminino e, ainda pior, se forem ...do Público !!!

Publicado por: zippiz às janeiro 31, 2005 11:41 PM

As mulheres são umas invejosas

Publicado por: nuncio às fevereiro 1, 2005 12:09 AM

Ainda as havemos de ver a arrancarem os cabelos umas às outras, aos gritos.

Publicado por: nuncio às fevereiro 1, 2005 12:10 AM

Metas Aspiracionais e Indicativas

Acabadinha de chegar esta notícia:

Em 2002, havia 26 000 famílias ricas que entregaram IRS acima de 250 000 euros de rendimento, ora em 2004 só 2000 dessas famílias apresentaram rendimentos superiores a 250 000 euros.

Pergunta:

de 2002 a 2004 - Empobreceram 24 000 famílias ?

Há 24 000 famílias ricas que fugiram aos impostos?

Publicado por: Templário às fevereiro 1, 2005 12:36 AM

E, se bem se recordam, esta fuga generalizada ao fisco das famílias mais ricas, acontece com um director-geral de impostos que ganha mais do dobro do PR e veio da banca privada, justificando-se a sua contratação com o presumível aumento de eficácia da máquina fiscal. Mais uma vez está à vista a hipocrisia da direita.

Publicado por: pyrenaica às fevereiro 1, 2005 09:49 AM

Eu, por exemplo, aspirava ter um governo em condições

Publicado por: Susana às fevereiro 1, 2005 10:01 AM

Quanto a isso nem como indicativo vais ter, Susaninha

Publicado por: David às fevereiro 1, 2005 10:33 AM

Sempre são boas notícias saber que os verdadeiros cérebros dos dois maiores partidos sao mais conscientes que os pivots que fzem de líderes.

Especialmente no caso de Vitorino (porque a esta altura só um milagre impediria o PS de ganhar as eleições).

Publicado por: Mário às fevereiro 1, 2005 11:26 AM

basics (6º parágrafo) não leva "k" - que erro de palmtória, joaninha ;-)

Publicado por: miguel às fevereiro 1, 2005 06:09 PM

basics (6º parágrafo) não leva "k" - que erro de palmatória, joaninha ;-)

Publicado por: miguel às fevereiro 1, 2005 06:09 PM

Vitorino não manda nada dentro do PS. Porque é que ele não quis candidatar-se? Porque sabia que seria trucidado pelo aparelho

Publicado por: David às fevereiro 1, 2005 06:47 PM

miguel em fevereiro 1, 2005 06:09 PM:
Fiz c&p do Público. Reparei nessa palavra, mas achei que não devia emendar uma transcrição de um jornal de referência.

Publicado por: Joana às fevereiro 1, 2005 07:41 PM

Eu também li isso no Público. Será erro, ou alguma nova palavra do choque tecnológico?

Publicado por: Domino às fevereiro 1, 2005 07:57 PM

Comente




Recordar-me?

(pode usar HTML tags)