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setembro 30, 2004

Eficiência-X

A diferença abissal na actuação e no desempenho entre a Compta (com um volume de negócios anual médio de 28 milhões de euros) e a ATX Software, ilustre desconhecida até ontem (tem um volume de negócios anual médio de 4,2 milhões de euros), sugere-me duas reflexões: uma de índole teórica e outra resultante da prática.

Em Economia, no estudo das fontes das economias de escala, designa-se por Eficiência-X (X-efficiency) a existência de uma eficiência, a nível de qualidade técnica e de desempenho e resultados, não explicável em termos de dimensão. Como aquela eficiência não era explicável, do ponto de vista da fundamentação teórica das Economias de Escala, apôs-se-lhe X, a incógnita matemática por excelência. O oposto, isto é, a causa que leva a que empresas de maior dimensão tenham a qualidade técnica, o desempenho e os resultados muito inferiores aos expectáveis em termos da sua dimensão, designa-se por Ineficiência-X.

Obviamente que tudo é explicável. O problema é que há explicações que são quantificáveis e adequadas para serem introduzidas em modelos matemáticos, e outras de contornos mais difusos e não quantificáveis. Normalmente a Eficiência-X aparece em empresas pequenas ou médias, especializadas em produtos (bens ou serviços) cujo processo produtivo se baseia num know-how muito específico detido pelos indivíduos que constituíram aquelas empresas. Há outras causas que têm sido igualmente propostas, mas ficamos pela que enunciei, a mais evidente e que mais nos interessa no caso em apreço.

À medida que os anos passam sucede com frequência que os sócios fundadores vão perdendo motivação (e enriquecendo) e 2 ou 3 décadas depois, a empresa, com os mesmos sócios, ou com outros que terão entretanto comprado a empresa, já não tem qualquer Eficiência-X. A cadeia hierárquica alongou-se, as motivações individuais perderam-se e entra-se lentamente na fase da Ineficiência-X. A Compta é agora o que poderá vir muito bem a ser a ATX Software dentro de 2 ou 3 décadas.

Saiamos agora da teoria económica e passemos à prática dos negócios informáticos. Empresas como a Compta, e outras com nomes sonoros, vivem à custa do aparelho de Estado e das empresas privadas com alguma dimensão, ou mesmo grandes, mas onde os directores informáticos ou não existem, ou são gente que foi provida no cargo, mais por serem da confiança da administração, do que por competência informática. Quando não se percebe de uma matéria, ainda por cima misteriosa, como computadores, servidores, redes e programas, a tendência dos responsáveis pela informática nessas entidades é protegerem-se, limitando as suas escolhas às firmas com “nomes sonantes”. Se der para o torto estão abrigados atrás da frase:

- Pois quê? A WXYZ, SA é uma firma de grande projecção e é um nome consagrado no mercado! Tive imenso cuidado na consulta ao convidar apenas firmas de reputação segura.

As empresas mais qualificadas, com quadros mais habilitados e cujos directores ou chefes dos serviços informáticos dominam a matéria, não recorrem a empresas tipo “Compta”, mas sim a empresas mais pequenas, mais especializadas no tipo de problema que querem resolver, mais ágeis na compreensão e solução desse problema e com custos muito menores, incomparavelmente menores. Como conhecem o negócio, sabem minimizar não só os riscos, como, em muito maior grau, os custos.

Os custos informáticos (equipamentos e software) suportados por empresas bem geridas e conhecedoras da matéria são abissalmente menores que os suportados pela administração pública e empresas mal geridas (às vezes de um para dez) com a vantagem de se ficar, sempre, mais bem servido.

E o mais espantoso, ou talvez não, é que cobrando incomparavelmente menos dinheiro, essas pequenas empresas, altamente qualificadas e muito mais dinâmicas, chegam ao fim do exercício com lucros, enquanto as “Comptas” vão acumulando prejuízos, mesmo ordenhando as vacas “Estado” e “empresas obesas”.

O que aconteceu no Ministério da Educação acontece invariavelmente em toda a administração pública, mas não é apanágio desta – também acontece em empresas mal geridas ou que sofrem de gigantismo ou obesidade gestora.

Publicado por Joana às setembro 30, 2004 11:00 PM

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Comentários

O Estado é a ineficiência XYZ

Publicado por: Viegas às setembro 30, 2004 11:52 PM

Joana ,
porque é que não pode sempre assim , em vez de , na maioria das vezes, fazer de "condutora do taxi do largo do caldas" ?

Publicado por: zippiz às outubro 1, 2004 12:25 AM

Não quero ser picuinhas, mas x-efficiency não é referenciável, de forma particular, à dimensão da empresa. A existência, ou não, da x-efficiency não tem a haver, directamente, com a existência ou não de economias de escala. Leibenstein apenas quis chamar a atenção para o facto de que a máxima eficiência que se pode obter a partir de um dado conjunto de factores produtivos, depende de uma qualidade "x" que não é traduzivel em nenhum dos habituais factores de eficiência - inclusive, mas não limitada, às economias de escala. Isto pode não afectar o resto do seu argumento, mas não quis deixar de fazer este reparo. É o que se pode chamar deformação profissional... As minhas desculpas...

Publicado por: Albatroz às outubro 1, 2004 01:28 AM

Albatroz:
Em primeiro lugar está desculpado.
Em segundo lugar tem razão ao citar Leibenstein. Mas embora o termo X-inefficiency tenha sido inicialmente “cunhado” por Leibenstein no sentido que refere, ele foi posteriormente adoptado pelos teóricos da “Industrial Organization” num sentido mais abrangente. Cf, por exemplo, Douglas Needham- “The Economics of Industrial Structure Conduct and Performance, e Scherer- "Industrial Market Structure and Economic Performance", a “bíblia” desta área da economia.

E repare que se uma firma tem, pela (in)eficiência-X resultados inferiores (ou superiores) ao que seria de esperar pela sua dimensão, então a (in)eficiência-X é uma fonte de deseconomias de escala, apesar dos factores X não estarem relacionados com a escala e principalmente por causa disso.

Os autores americanos têm procurado preferencialmente as causas da Ineficiência-X discutindo as funções da utilidade dos gestores em face dos seus objectivos na gestão das firmas. Julgando embora que essas razões são importantes, penso que em economias como a portuguesa, onde a importância da gestão independente dos accionistas (proprietários) ainda é pequena, quantitativamente, há outros factores mais relevantes, entre eles aqueles que assinalei.

Publicado por: Joana às outubro 1, 2004 09:47 AM

Joana,

Acho que foi feliz a sua chamada de atenção para a eficiência x, até porque, ao contrário de muita gente, acho que o problema da falta de competitividade da economia portuguesa não é um problema essencialmente de falta de qualificação dos nossos trabalhadores, mas de falta da "qualidade x" dos nossos gestores e empresários. Se olharmos para o Luxemburgo, que tem a mais alta produtividade do factor trabalho em toda a Europa, e onde 25% da população activa é constituida por portugueses, temos de concluir que o problema em Portugal não pode ser a mão-de-obra, mas os gestores. A menos que só tenham emigrado para o Luxemburgo os nossos trabalhadores mais qualificados. E mesmo em Portugal, se olharmos para a Ato Europa, vemos que um gestor altamente competente transformou uma empresa problemática numa das jóias do grupo Volkswagen.

Publicado por: Albatroz às outubro 1, 2004 10:56 AM

Albatroz:
Note que o facto dos trabalhadores portugueses serem mais produtivos e diligentes no estrangeiro não é especificamente nacional. Acontece com a generalidade dos imigrantes.

A questão é que quem imigra está, normalmente, mais motivado para se sacrificar trabalhando tanto quanto pode, que os que ficam que, para o mesmo nível de qualificação, estão, em média, mais acomodados.

Por outro lado os imigrantes submetem-se às regras impostas nos países de acolhimento. Cá deixam-se envolver pela cultura dominante a nível dos comportamentos.

Mesmo em Portugal, a postura de um trabalhador da função pública é completamente diferente da de um trabalhador do sector privado. À partida não se diferenciariam, mas as aculturações diferentes dão-lhes mentalidades diferentes.

Mas é evidente que a qualidade da gestão tem também um papel muito importante. Eu apenas pretendi mostrar, nesta resposta, que existem muitos mais factores.

Publicado por: Joana às outubro 1, 2004 12:22 PM

Também não quero ser picuinhas mas quando diz "ordenar a vaca Estado" em vez de ordenhar, acertou pois aqui quem mais ordena é quem mais ordenha.

No resto brilhante como de costume.

Publicado por: Carlos Alberto às outubro 2, 2004 12:03 AM

Excelente.
Tamb+em concordo como Carlos Alberto

Publicado por: J Correia às outubro 2, 2004 12:28 AM

Queria escrever "também"

Publicado por: J Correia às outubro 2, 2004 12:30 AM

A Joana condutora do táxi do Largo do Caldas?
Até que enfim se sabe a profissão da Joana

Publicado por: Bsotto às outubro 3, 2004 01:10 AM

Excelente reflexão.

Um abraço,
Francisco Nunes

Publicado por: Planície Heróica às outubro 3, 2004 04:29 PM

Carlos Alberto em outubro 2, 2004 12:03 AM:
Obrigada pela observação. Vou já emendar

Publicado por: Joana às outubro 4, 2004 10:20 AM

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