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julho 23, 2004

A Síndrome do Bey de Tunis 2

Como continuo atacada por aquela síndrome terrível e queirosiana, vou descarregar esta minha frustração em Eduardo Dâmaso, que hoje no Público tomou sobre si a tarefa de aconselhamento político do PS.

Eduardo Dâmaso desejaria, segundo escreve, voltar a situar o PS no espaço e nos valores da esquerda identificada com o que ele designa por socialismo democrático e social democracia.

Há um equívoco lamentável na maioria dos discursos dos próceres socialistas e dos seus conselheiros jornalistas. A Terceira Via foi, na prática, uma ilusão com péssimos resultados, mas a Terceira Via não era essa ilusão. Não o foi, por exemplo, no Reino Unido. A questão é que a Terceira Via, em Portugal, não passou dos discursos e arengas do Guterres. Assim que Guterres ganhou as eleições foi submerso pela caterva mais incompetente e estéril de caciques locais e do aparelho partidário. E a partir daí, Guterres fazia arengas maravilhosas e anestesiantes, que assombravam o país, e o resto do governo e instituições governativas, com muito poucas excepções, funcionavam mal, terrivelmente mal, situação de que o país só tarde demais se começou a dar conta.

Não vou repetir aqui o que já escrevi diversas vezes, e com algum pormenor, neste blog, mas pôr a economia a funcionar não é «combater a "deriva direitista" e a "mão invisível" que por aí anda a manipular a vida política em nome de interesses inconfessáveis». Ignorar as exigências do mercado e distribuir o que não há, não é lutar contra a manipulação da "mão invísivel": é levar o país ao suicídio económico e social.

O desemprego, de forma sustentável, não se combate com gastos públicos. Combate-se diminuindo a despesa pública e, portanto, o ónus sobre os agentes económicos, o que aumenta a competitividade das empresas e a sua capacidade de gerar emprego.

Criar emprego com obras públicas é pôr num lado e tirar do outro. Com a desvantagem que quando acabam essas obras o emprego criado desaparece e o outro, o que havia desaparecido, não regressa. Com a agravante de que o despesismo, na UE, já não se pode curar com a desvalorização. Provoca, a médio prazo, a recessão e o desemprego e essa situação só se cura com pesados sacrifícios e muito lentamente.

A profunda crise de identidade que atravessa o PS desde os tempos de Guterres decorre da esquerda não ter percebido que a economia portuguesa (como a europeia) chegou a uma situação que precisa de uma reforma profunda, certamente traumática, mas necessária. E Eduardo Dâmaso sabe disso, porquanto há cerca de 2 semanas entrevistou Medina Carreira, ouviu isso mesmo, e não pôs em dúvida nada que o ex-ministro socialista então afirmou. Quem cala, consente

Eduardo Dâmaso afirma no fim que o que está em causa não é só encontrar um líder mas devolver o PS a um padrão ético e político que o transformou numa referência essencial da democracia portuguesa.

Ó Dâmaso ... isso não é uma lamechice? Eu olho para o panorama político português dos últimos 20 anos, que vivi, e dos últimos três séculos, sobre os quais li, e não encontro nada que se assemelhe a «uma referência essencial da democracia portuguesa».

Fico-me por aqui ... na coligação já arreei ontem ...

Publicado por Joana às julho 23, 2004 11:27 PM

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Comentários

Vou-me ausentar por uma semana por motivos profissionais.
Deixo pois este blog entregue à «vigilância popular».
Não totalmente, pois levo o meu portátil com GPRS e estarei atenta ao que aqui se passar, na medida em que os meus afazeres profissionais o permitirem.
Não é pois de excluir que coloque algum post entretanto.
Até para a outra semana.

Publicado por: Joana às julho 24, 2004 12:34 AM

O BdE está ao ataque?

Publicado por: David às julho 24, 2004 10:57 PM

"Não se pode distribuir o que não há" é o eterno slogan de quem não quer realmente fazer nada para resolver o dramático problema da exclusão social. Aquilo que se pretende é, obviamente, distribuir o que há. Porque a noção - e a realidade - de uma comunidade não é compativel, nem ética nem politicamente, com a exclusão social. Não se pode reconhecer às pessoas o direito de votar mas lhes não reconhecer o direito a comer todos os dias. Não se pode pactuar com a realidade que são as crianças de rua, os sem abrigo, os idosos abandonados, a fome. Ignorar esta realidade até haver o suficiente para poder ser distribuido, é uma enorme hipocrisia. Porque nunca há esse "suficiente". Os que têm nunca acham que têm o suficiente, querem sempre ter mais. Mesmo à custa dos que têm pouco. O sindicalismo na segunda metade do século XIX e na primeira metade do século XX provou que era possível distribuir aquilo que os patrões diziam que não existia. E as empresas não só sobreviveram como até prosperaram com essa impossível distribuição. Acabar com a exclusão social não é um problema económico, é um problema político que só exige vontade.

Publicado por: Albatroz às julho 25, 2004 12:07 PM

foi óptimo descobrir este blog , você têm um extraordinário poder de observação e sabe realmente fazer uma crónica ou uma critica ao que se passa á nossa volta, espero poder continuar a ler os seus posts

Publicado por: Artur Lopes às julho 25, 2004 04:29 PM

Cá para mim, esta Joana é um pseudónimo do AJJ, que também dizem que pega de empurrão...
Lembram-se da Albertina?
Pois...

Publicado por: Curioso às julho 25, 2004 06:05 PM

De empurrão talvez, mas de marcha atrás.

Publicado por: z às julho 28, 2004 08:55 AM

De marcha atrás?

Publicado por: curioso às agosto 2, 2004 12:37 PM

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