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janeiro 29, 2004
O Cabralismo
Em 27 de Janeiro de 1842 deu-se o pronunciamento militar no Porto que restaurou a Carta Constitucional de 1826 e levou ao poder Costa Cabral. O regime dos Cabrais (dois irmãos de António Bernardo da Costa Cabral, mais tarde Conde e Marquês de Tomar, eram igualmente importantes figuras políticas da época) durou até à Regeneração (1851), embora após a eclosão da revolta da Maria da Fonte (1846) e durante 3 anos, Costa Cabral tenha estado num semi-exílio, regressando posteriormente ao poder, com o apoio da rainha, sendo derrubado pelo movimento da regeneração chefiado por Saldanha.
O Cabralismo é normalmente associado à ala direita do liberalismo, enquanto o regime derrubado pelo pronunciamento militar do Porto, o Setembrismo, herdeiro do vintismo e que chegou ao poder em 1836, é normalmente associado à esquerda.
Aquela comparação só parcialmente é verdadeira. Portugal viveu, na sequência da instauração do liberalismo, uma vida política que estava longe de se considerar democrática. Não havia condições para isso. As eleições eram manipuladas quer pelos Administradores dos Concelhos, nomeados pelos sucessivos governos, quer por caciques locais. Frequentemente, eram eles que indicavam onde se devia votar.
Por isso, até à Regeneração, as alternancias governativas ocorreram sempre por via insurreicional, directa ou indirectamente, e nunca por via eleitoral
Além do que extensas regiões do país estavam infestadas de bandoleiros ou grupos armados agindo fora da legalidade, o que tornava ainda mais complicado o exercício da democracia. Aliás, muitos deles agiam consideravam-se a si próprios elementos armados apoiantes de determinadas facções políticas (Remexido – Miguelistas, Zé do Telhado – Setembristas, João Brandão – Cabralistas, etc.) quando eram, apenas e tão só, bandoleiros.
A noção de partido político com um programa ideológico e uma estrutura própria só aparece em Portugal nos fins do século XIX, embora com a Regeneração, a partir de 1851, comece a aparecer um embrião de partido.
Naquela época o que havia eram correntes de opinião que se digladiavam com ferocidade em alguns centros urbanos de maior expressão, mas perante as quais o país permanecia impassível, por incapacidade de compreensão dos programas políticos.
Sismondi escrevia, poucos meses antes da capitulação do absolutismo, que se houvesse eleições livres em Portugal, D. Miguel ganharia(*). Apenas uma pequena franja urbana apoiava as reformas sociais. Sismondi não pode, de forma alguma ser suspeito de simpatias pelo absolutismo. Logo, aquela sua afirmação corrobora o que escrevi acima sobre a capacidade da população portuguesa da época, maioritariamente analfabeta, isolada em aldeias de comunicações difíceis, em partilhar as disputas ideológicas furiosas que ocorriam entre as classes ilustradas de Lisboa, Porto e mais algumas, poucas, cidades de relativa importância.
Os liberais estavam divididos entre Cartistas, apoiantes de Carta Constitucional de 1826, Setembristas, herdeiros do vintismo e empenhados na defesa de garantias constitucionais mais latas que as reconhecidas na Carta de 1826 e na diminuição dos poderes ao trono (veto, dissoluçao das câmaras, etc.) e os Ordeiros, uma corrente de opinião intermédia, que oscilava entre as duas anteriores. Para além dos liberais, havia os absolutistas, mas que também não constituíam um conjunto homogéneo.
As eleições de 15 de Agosto de 1836 deram, como era costume, a vitória a quem estava no poder, isto é, aos moderados. Todavia no Porto havia ganho a facção chefiada por Passos Manuel, mais radical e anti-cartista. Com a chegada dos radicais eleitos pelo Porto, desencadeou-se em Lisboa uma revolta que forçou ao estabelecimento de um novo governo. Foi a Revolução de Setembro.
O Setembrismo tinha uma visão mais progressista da sociedade. Perguntar-se-ia todavia se, nas condições sociais existentes na época, o esvaziamento do poder do trono que propunha seria melhor garante da estabilidade social e do desenvolvimento do que o inverso. O que se passou a seguir mostra que provavelmente o Setembrismo, resultante de «em 1836 se estar em pleno domínio as ideias políticas filhas da metafísica e do romantismo que a França levara a todos os povos latinos», como escreveu José d’Arriaga, estava completamente fora da sintonia com o país real.
O primeiro ano do governo setembrista, cujo motor foi Passos Manuel , que nem um ano chegou a estar no governo, foi o período de ouro do Setembrismo. Passos Manuel teve uma extraordinária actividade legislativa no domínio da cultura e da instrução pública. Foi a grande herança setembrista.
Em Março de 1838 foi a morte da Revolução de Setembro, a partir daí esteve moribunda até 1842. Durante esses anos andou como navio sem governo, nem piloto pelo meio das tempestades. Sá da Bandeira não era visceralmente um democrata; serviu a Revolução de Setembro contra as suas convicções políticas, visto que era favorável a um maior poder do trono. Em Março houve a revolta do Arsenal, dos setembristas radicais, entre os quais estava Costa Cabral (e José Estevão). Sá da Bandeira, então chefe do Governo, pactuou com a revolta e mudou o governo num sentido mais radical que caiu em Abril de 1839. O novo governo saído dessa remodelação já era cartista, embora ainda estivesse em vigor a constituição setembrista. Era presidido pelo Conde do Bonfim, próximo dos cartistas e tinha como Ministro do Reino, Rodrigo da Fonseca, notório apoiante da Carta.
Aliás, as discussões políticas decorriam mais de quezílias pessoais e rivalidades políticas que de confrontos ideologicamente consistentes. Eram polémicas estéreis e incompreensíveis para a quase totalidade da população. Por exemplo, Costa Cabral era inicialmente um Setembrista radical, ligado aos clubes maçónicos e então próximo de José Estevão. Posteriormente foi evoluindo no sentido de apoio à Carta de 1826.
No meio de todo este mar encapelado, uma profunda crise social: carestia de vida, atraso ou falta de pagamento dos vencimentos aos funcionários públicos, das pensões etc., em contraste com os elevados rendimentos dos titulares de altos cargos da administração.
Neste entendimento, o pronunciamento militar no Porto que restaurou a Carta Constitucional de 1826 e levou ao poder Costa Cabral foi o corolário lógico. O governo então existente, e em funções há cerca de um ano, era presidido por Joaquim António de Aguiar, destacado político cartista, e tinha Costa Cabral como Ministro da Justiça.
Muito se tem dito sobre o Cabralismo. Não queria entrar agora em pormenores sobre esta matéria, guardando para uma oportunidade futura, se ocorrer, quando falar da Regeneração.
O Cabralismo constituiu uma etapa necessária no liberalismo português. Costa Cabral consolidou o Estado liberal, assente numa forte centralização e complexa burocracia. Escudado no exército, na maçonaria (Costa Cabral foi Grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, de 1841 a 1846 e de 1847 a 1849) e em clientelas que beneficiavam da política económica e financeira, baseada nas obras públicas e fomento.
Todavia, o avanço das relações capitalistas nos campos, a supressão dos direitos comunitários, a pesada carga tributária, mal distribuída, os custos dos enterros e a proibição de serem feitos nas Igrejas, o descontentamento do clero pela supressão dos dízimos levou à revolta da Maria da Fonte, a Patuleia, aglutinação heteróclita de setembristas, miguelistas (General Póvoas e outros) e cartistas anti-Costa Cabral.
Esta revolta acabou com a intervenção estrangeira, pois a Europa era contrária a um regime de instabilidade e estava receosa do que porventura sairia de uma coligação absolutamente contra-natura. A Convenção de Gramido acabou com a guerra civil e houve uma amnistia geral.
Aqui, D. Maria II cometeu mais um dos muitos erros estratégicos do seu reinado. D. Maria II havia confiado a Saldanha a organização do gabinete ministerial, formado a 18 de Dezembro de 1848. Esse governo duraria apenas alguns meses, até Cabral, já investido Conde de Tomar, assumir a função, por decreto régio, em registo claramente ditatorial (29 de Junho de 1849). Saldanha foi demitido e sucessivamente humilhado.
Saldanha era o político e militar português mais carismático. Imediatamente se soube rodear da fina flor da inteligência portuguesa: Herculano, Rebelo da Silva, José Estevão, etc., conspirando contra o Cabralismo. Acima de tudo gente que tinha aprendido com os erros cometidos com o vintismo e com o setembrismo e que se tinha congregado para dar ao país uma solução mais coerente, moderna e sustentável, política e financeiramente, do que as questíunculas em que até então o país se tinha digladiado.
Foi com a Regeneração que o país entrou na modernidade. Mas o Cabralismo foi uma boa escola: no que teve de bom, mas também, e muito, no que teve de mau. Os erros são uma boa escola para quem sabe aprender com as experiências.
(*)Simonde de Sismondi – Étude sur les Constitutions des Peuples Libres Bruxelas 1836
Publicado por Joana às janeiro 29, 2004 07:55 PM
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Comentários
Nota: eu estava a escrever este texto, quando a Cardona malvada se meteu de premeio. Só esta noite tive tempo de o concluir. Por isso saiu com 2 dias de atraso.
Publicado por: Joana às janeiro 29, 2004 08:52 PM
A dedicar-se outra ah historia, Joana?
Coisas ja com mais de 150 anos despertam menos polemicas
Publicado por: Filipa Zeitzler às janeiro 29, 2004 11:30 PM
De facto os acontecimentos vistos a esta distância são menos emocionantes.~
Naquela época discutiam cheios de raiva, faziam duelos, etc.
Hoje a Joana diz que eles até não andavam muito longe uns dos outros.
E é capaz de ter razão
Publicado por: Hector às janeiro 31, 2004 12:12 AM
Afinal, eu não era assim tão mau como me pintaram!
Publicado por: Cabral às janeiro 31, 2004 04:45 PM
Essa opinião do Sismondi tem muito interesse. Principalmente por estar a emiti-la sobre os acontecimentos.
Percebe-se assim as dificuldades, guerras, revoltas, etc, porque passou Portugal até estabilizar a situação
Publicado por: Novais de Paula às fevereiro 1, 2004 02:31 PM
Costa Cabral foi mais um ditador como tantos outros que passaram pela nossa história.
Publicado por: daniel tecelão às fevereiro 4, 2004 11:30 PM
Esta gaja só elogia ditadores
Publicado por: Cisco Kid às fevereiro 5, 2004 12:05 AM
filhos da ...
Publicado por: nicodemos às março 8, 2004 09:44 AM
estudemos bem o sec. xix,e vejamos que as tentativas de sairmos de colónia inglesa teem muito a ver com a actualidade de querermos ser agora colónia de Bruxelas
Publicado por: joao às janeiro 9, 2005 10:09 AM
este site esta mt bem organisado parabems
Publicado por: xico às janeiro 14, 2005 01:03 PM
pá desculpem so tnh 1 coisa a dizer faltam imagems.........
Publicado por: xico às janeiro 14, 2005 01:06 PM
á assim eu gosyei do site mas....
faltam imagens como disse o xico e este site é uma merda cagada por dom afonso henriques
Publicado por: rita às maio 24, 2005 09:20 PM
É assim eu gostei do site, mas faltam imagem como disse o xico e a/o nina/o que comentaram anteriormente...
Kiss, fiquem bem!! :)
Publicado por: Nicole às fevereiro 8, 2006 03:06 PM