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outubro 04, 2003
Portas e a imigração
Pelo que me apercebi do discurso de P Portas, a intervenção dele foi muito exagerada pelo Pacheco Pereira e também por outros comentadores.
Embora na altura não tivesse concordado com algumas afirmações produzidas por P Portas sobre esta matéria, fiquei depois muito surpreendida pelo clamor do Pacheco Pereira e de outros sobre a xenofobia do discurso etc..
Discordei, mas de forma algum me pareceu xenófobo. Continuo todavia a pensar que essa parte do discurso foi uma contemporização com algumas posições tomadas antes das eleições. Uma forma de mostrar a alguma direita que há coisas que não estão esquecidas.
Mas não há dúvida que Portas ligou o fluxo migratório ao desemprego ao declarar (e peço desculpa se não for rigorosa, pois não me lembro exactamente dos termos dele) que não se devia permitir a imigração enquanto existisse a actual situação de aumento do desemprego.
Ora o desemprego em Portugal é um fenómeno estrutural fruto da baixa qualificação ou da qualificação inadequada para os trabalhos que há.
E o grave é que o desemprego coexiste com falta de mão de obra em muitas actividades e com a desertificação rural. Na agricultura, nos períodos de ponta não existe mão de obra. Quando se pede autorização para a contratar, se se esperasse por essa autorização, quando ela viesse, se viesse, as colheitas ter-se-iam perdido entretanto. Aliás, mesmo fora desses períodos de ponta, muita dessa mão de obra seria benvinda.
Grande parte das necessidades de mão de obra sentem-se em pequenas empresas ou unidades de exploração, agricultura, restauração, etc., que não conseguem fazer ouvir a sua voz.
Falar em contingentação por exigência do mercado de trabalho é incorrecto. Um mercado para funcionar, ou mesmo para existir, tem que ser livre, ou pelo menos livre dentro de certos limites. Para isso tem que haver alguma liberdade de imigração. Terá que ser uma liberdade “vigiada” no que respeita à proveniência e qualificação dos imigrantes, mas será dessa liberdade em conjugação com o funcionamento do mercado que se chegará a um equilíbrio. Isso é fundamental para a nossa economia. Não se consegue convencer quem foi despedido de uma têxtil a mudar de ramo, excepto, talvez, se for para uma actividade similar. Prefere sempre o subsídio de desemprego.
O desemprego não aumenta pela imigração. Pelo contrário, a imigração permite a ocupação de certos postos de trabalho que, sem ela, ficariam vagos. E a possibilidade de muitas actividades económica aumentarem a sua laboração terá um efeito positivo e dinamizador na economia e indutor de emprego.
Terá que ser o mercado, funcionando com a máxima transparência possível, a definir os quantitativos discriminados pelas actividades e geograficamente. As centenas de milhares de imigrantes de leste que estão espalhados pelos lugares mais recônditos do país não vieram após cálculos sobre a capacidade do mercado. Vieram, espalharam-se pelo país, e encontraram trabalho porque havia (e continua a haver) falta de mão de obra. Hoje têm, na sua quase totalidade, empregos dignos, produzem, descontam para o Estado e Segurança Social, e têm um efeito altamente positivo na nossa economia.
Tem todavia que haver uma política de imigração que privilegie a qualificação, o reagrupamento familiar e a integração social dos imigrantes, facilitando a sua legalização e mesmo a sua nacionalização, nomeadamente dos que estão integrados e com família constituída.. Uma política fortemente selectiva no que respeita ao tipo de qualificação, mas aberta, pois Portugal precisa, mesmo na situação actual, de muita mão de obra. Pergunto: está-se a fazer alguma coisa nesse sentido?
Os problemas de exclusão, o tráfico de pessoas, as máfias, a criminalidade organizada, os pedintes nas esquinas, os "limpa pára-brisas" compulsivos nos cruzamentos e os pedinchões nos semáforos resultam exactamente dessa ausência de política de imigração, do mau funcionamento dos serviços de fronteiras e das forças policiais.
Fechar não é solução: prejudica a economia portuguesa e não fecha totalmente, porque os palops conseguem entrar de uma forma não detectável, nem que seja para levar os familiares às consultas do Amadora-Sintra; os palops e os ciganos romenos... Este “fechar” permite apenas a entrada do refugo.
A questão é que se está confundir uma política de imigração aberta com o laxismo em que temos vivido. Eu sou absolutamente contra esse laxismo e a ausência de selectividade na imigração. Todavia, desde que haja selectividade, sou favorável a uma política de imigração agressiva que permita colmatar as carências actualmente existentes e que tenha efeito dinamizador na nossa economia.
Portanto o que se tem que fazer é ter os serviços respectivos a funcionar e bem, ter uma política muito selectiva sobre a imigração, mas bastante aberta (e não laxista).
Nós não precisamos de mais gente não qualificada, amontoada em guetos nos subúrbios de Lisboa. Precisamos de gente qualificada e gente, muita gente, no interior do país para relançar muitas actividades que estão em declínio.
17 de Setembro de 2003
Publicado por Joana às outubro 4, 2003 12:41 AM
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