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abril 08, 2005

A Mão Invisível estrangula o PSD

O PSD está a agir como o empresário estilizado da Teoria Neoclássica. O seu objectivo é único – maximizar a percentagem eleitoral. As suas regras de cálculo são lineares – presumindo ter uma informação perfeita sobre a sua clientela política e interpretando liminarmente os sinais do mercado (as intenções de voto) julga ser conduzido a uma solução eleitoral óptima conseguindo um score eleitoral tal que o ganho político com o último voto seja igual ao custo político da transigência ideológica.

Este PSD (tal como o empresário da teoria neoclássica) reage de forma automática aos estimulantes. É um comportamento apriorístico, pois pode ser mecanicamente deduzido das características do enquadramento em que se move. Esta teoria política (ou microeconómica) reduz um partido (uma empresa) a um ponto sem espessura nem dimensão temporal, realizando continuamente ajustamentos imediatos e reagindo de forma automática a estímulos. Não é uma estrutura provida de ideologia, é uma bola de bilhar.

A Teoria Neoclássica é um instrumento de uma lógica maravilhosa, simples, maleável e de uma elegância matemática notável. Todavia só serve para explicar tendências gerais de comportamentos. Não serve para gerir empresas. A forma como se geram equilíbrios levou a que, antes das equações matemáticas os deduzirem, se criasse a metáfora da Mão Invisível para idealizar aquele processo. Mas metáforas, por muito sugestivas que sejam, não chegam para construir um projecto economicamente viável, ideologicamente sólido, socialmente coerente e politicamente corajoso. É preciso uma sólida base ideológica por detrás.

O empresário atomizado reagindo automaticamente a estímulos é uma abstracção para criar as equações de partida do sistema. Os modelos explicativos vão-se refinando à medida que são introduzidas variáveis, parâmetros, restrições, etc., adicionais e deverão ser interpretados tendo em conta as limitações dos mesmos. Por exemplo, uma empresa real tem que planear a sua actividade a longo prazo. Uma nova unidade industrial pode demorar 3 a 5 anos a ser construída e ter uma vida útil de 15 a 20 anos, portanto o decisor terá que interpretar o mercado de forma estratégica e a longo prazo, visto uma decisão que ele tomar agora só será validada pelo mercado ao longo da próxima década.

Do mesmo modo um dirigente político tem que analisar a sociedade, diagnosticar as suas necessidades e conceber e equacionar as soluções e tudo isto inserido num sistema coerente de ideias e valores adequado. E este “mercado” tem que ser avaliado a longo prazo e a estratégia estruturada e planeada a longo prazo. O político não pode reagir automaticamente a estímulos. Não pode planear as suas decisões como um empresário planeia uma nova linha de lingerie.

Ora o próximo congresso do PSD mostra que não existe no espectro político ali presente qualquer base ideológica relativa à liberdade do funcionamento da economia, à assumpção do risco, da inovação e da mobilidade, que é indispensável à tarefa de reformar o Estado e a sociedade portuguesa para os preparar para os desafios com que estão confrontados. Pelo contrário, sugestionados por uma análise superficial do “mercado”, recolhida na noite eleitoral, preparam-se para pescar nas mesmas águas turvas da política da ilusão consumista, no projecto da segurança medíocre e sem futuro do Estado asilo, que tem caracterizado a nossa vida económica e social na última década.

O posicionamento ideológico dos principais protagonistas deste congresso, de acordo com o Público (posicionamento cujas bases de cálculo ignoro o fundamento), está muito próximo dos actuais dirigentes do PS – estão no mesmo quadrante estatizante-libertário, na zona social-democrata. Nada os distingue. Marques Mendes não é alternativa a Sócrates, pois estão ideologicamente colados.

Ao iludir-se com os sinais do mercado, o PSD está a estrangular-se com a Mão Invisível que criou, ao não conseguir interpretar o “mercado político” para além dos sinais superficiais que detectou na noite eleitoral.

A situação é catastrófica, mas ... não inquietante ... A experiência tem mostrado que todas as medidas de liberalização do tecido económico, e que têm permitido diversos países ultrapassarem situações de estagnação, foram tomadas sob a premência inadiável dessas situações e contrariavam as promessas eleitorais feitas pelos respectivos governos, socialistas, sociais-democratas, centristas, democratas-cristãos, etc., quando em campanha. Os programas vendidos em campanha estão normalmente viciados pela ideologia pretensamente social que está nos genes do pensamento estatizante. E pretensamente social, porque sob o álibi do igualitarismo e justiça social, esconde-se o caminho que conduz à estagnação económica e ao nivelamento pela mediocridade.

A solução não é boa. É como passarmos da carroça para o automóvel, substituindo algumas peças de cada vez – rodas, motor, partes da carroçaria, caixa de velocidades, etc. Quando chegarmos a ter um automóvel completo, será uma figura compósita com peças de séries diferentes, que se encaixam mal umas nas outras e com uma performance inferior à desejada.

É a consequência, como escrevi acima, de não haver um projecto coerente.

Publicado por Joana às abril 8, 2005 11:41 PM

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Comentários

Ou seja, vamos a ver para que lado a populaça se inclina mais e vamos bandear para esse lado. É o absoluto pragmatismo tornado ideologia... Se o tuga médio virasse peixe, os líderes putativos do PSD afogavam-se todos.

O pior é que receio que o PS seja igual...

Publicado por: Rui Martins às abril 9, 2005 12:40 AM

O PSD está atornar-se um partido sem rei nem roque.
O António Borges parece um tipo sério. Mas o resto ...

Publicado por: David às abril 9, 2005 01:55 AM

E há mais, o Aguiar Branco e outros. O Rui Rio parece um tipo corajoso, para fazer frente ao P da Costa.
Mas os que concorrem às chefias não são do meu agrado

Publicado por: David às abril 9, 2005 01:58 AM

Uns dizem que o Santana se vitimiza, outros que ele é mesmo vítima da perseguição. Eu acho que ambos têm razão

Publicado por: Coruja às abril 9, 2005 11:34 AM

O Santana fala demais. E o facto de ter sucesso com as mulheres deu cabo dele: os homens invejam-na e as mulheres insípidas têm ciúmes.

Publicado por: Silva às abril 9, 2005 12:30 PM

O António Borges vai fazer o papel de inocente útil. Não tem qualquer foça dentro do PSD

Publicado por: Diana às abril 9, 2005 12:57 PM

De facto, se o aparelho e os cavaquistas alinham com Marques Mendes, se os Santanistas e Barrosistas com Menezes, quem alinha com Borges? Aliás, o homem aproxima-se mais de que ala do PSD? Pelo seu perfil de gestor não anda pelo tal centro-direita de que agora toda a gente quer fugir?

Publicado por: Rui Martins às abril 9, 2005 01:00 PM

É. O António Borges está em contradição com a actual política de marketing do PSD de que fala a Joana.

Publicado por: Hector às abril 9, 2005 01:11 PM

Enganou-se no Congresso. Talvez no próximo?

Publicado por: Hector às abril 9, 2005 01:12 PM

Hector: perfeitamente de acordo consigo.

Publicado por: fbmatos às abril 9, 2005 01:55 PM

Não há muito tempo, a Joana queixava-se de os media estarem dominados por esquerdistas, enfim, por pessoal genericamente distante dela em termos ideológicos. Agora eu observo que, de entre 35 moções de estratégia ao congresso do PSD, os media dão uma atenção absolutamente desproporcionada a uma só, a de António Borges. Ou seja, a moção que se posiciona como próxima da ideologia da Joana recebe amplos favores em matéria de tempo de antena nos media. Ainda hoje, na Antena 1, transmitiram em direto a alocução do Borges e não pararam de falar dele e da importância e da possível influência da sua moção de estratégia. Uma moção entre 35, note-se bem.

Não tem sentido nenhum, de facto, a Joana queixar-se de falta de apoio mediático à sua ideologia. Eu diria o contrário: o liberalismo de direita está hoje a ser levado ao colo pelos media, tal como o Bloco de Esquerda o foi no passado.

Publicado por: Luís Lavoura às abril 9, 2005 04:12 PM

Lavoura, ganda estudioso! Então você leu as 35 moções e conseguiu posicioná-las? É o único gajo que o fez.
Nem os jornalistas!

Publicado por: David às abril 9, 2005 04:20 PM

Neste país continua a haver muito paleio e pouca acção.

Publicado por: Helena às abril 9, 2005 04:23 PM

Os jornalistas deram mais atenção ao Borges porque era o mais desalinhado. Eles querem é zaragata.
Se aparecesse um com uma moção a defender os casamentos gay por registo civil teria direitos à 1ª página de todos os jornais.

Publicado por: David às abril 9, 2005 04:24 PM

O Marques Mendes é o «mesmismo naftalínico». Já não se pode com o bafio.

Publicado por: asdrubal às abril 9, 2005 05:33 PM

Pois é, não percebo como o PSD julga que vai a algum lado com ele a chefiar o partido

Publicado por: Susana às abril 9, 2005 05:54 PM

A questão está em que eles não querem ir a lado nenhum com MM, querem mesmo é andar à deriva até à chegada do Messias Borges. MM vai casar com uma mulher que estará sempre a namoriscar o vizinho do 4º direito, de nome António Borges...

Publicado por: Rui Martins às abril 9, 2005 08:29 PM

O António Borges não tem carisma político. É um sujeito frio. Não arrasta multidões.

Publicado por: AJ Nunes às abril 9, 2005 09:05 PM

Claro que quando o país estiver mesmo de rastos, a malta vai atrás de qualquer um que julgue capaz de o tirar do buraco.

Publicado por: AJ Nunes às abril 9, 2005 09:07 PM

O facto dos media darem mais atenção à moção de A. Borges não está em contradição com os media serem de esquerda (não são dominados, são a própria esquerda).

o interesse jornalístico não é se a moção é mais liberal que as outras mas apenas a esperança de ver sangue, ou seja, de ver luta pela liderança do partido.

a provar isso estão as perguntas que fazem a António Borges, que insistme em saber se é canditato, e se não é agora quando é que vai ser...

Publicado por: Mario às abril 9, 2005 09:12 PM

O pais está no buraco porque todos gostam da protecção dada pelo buraco.

Publicado por: Mario às abril 9, 2005 09:16 PM

E espero que a afirmação não pareça muito ordinária....

Publicado por: Mario às abril 9, 2005 09:21 PM

Quando o país estiver mesmo no buraco, não haverá protecção que valha.

Publicado por: Coruja às abril 9, 2005 09:36 PM

Hoje fiquei a saber que os jornalistas deviam passar pelo divã dos psicanalistas antes de obterem a carteira profissional. Fazia-lhes bem um longo e árduo purgante antes de poderem reportar o que quer que seja. E começaria, desde logo, pelo Monhé do expresso da meia-noite. Uma «avis rara».

Publicado por: asdrubal às abril 10, 2005 02:45 AM

Post original com um excelente início, logo depois comprometido com a afirmação de que a teoria "não serve para gerir empresas", finalmente anulado com a tese da "premência inadiável das situações" [afinal, sempre é necessário recorrer a variáveis exteriores ao modelo para se explicar a coisa...].

E os comentadores, pelo que se lê, não perceberam patavina de nada. Ou não lhes interessou.

Publicado por: Joao Aldeia às abril 10, 2005 12:05 PM

«O primeiro-ministro português, José Sócrates, pede a abertura do mercado espanhol às empresas portuguesas, numa entrevista publicada hoje no jornal espanhol El Pais, onde sublinha que as suas três prioridades em política externa são Espanha, Espanha e Espanha».
.
Ao que chegamos, meu Deus.

Publicado por: asdrubal às abril 10, 2005 01:27 PM

Eu acho o Sócrates muito medíocre e por isso é que ele anda calado. Para ver se não se espalha.

Publicado por: Diana às abril 10, 2005 01:40 PM

Publicado por: Joao Aldeia às abril 10, 2005 12:05 PM

Não vejo problema nos comentadores não perceberem patavina, desde que não façam de conta que perceberam.

Publicado por: Mario às abril 10, 2005 02:52 PM

O P.S.D. está há muito transformado ( assim como o P.S.) num saco de gatos onde todos se arranham à procura de um lugar ao sol na vida.


Zecatelhado

Publicado por: zecatelhado às abril 10, 2005 03:16 PM

Publicado por: Mario às abril 10, 2005 02:52 PM

Eu também não.

Publicado por: Joao Aldeia às abril 10, 2005 04:09 PM

Zecatelhado:

Eles procuram um lugar ao sol e lá vão conseguindo, essa é que é essa!
Quem está metido num buraco é o Zé Povinho. E o pior é que se trata de um buraco negro, onde o futuro acabou e de onde não se pode saír.


Publicado por: Senaqueribe às abril 10, 2005 05:37 PM

Senaqueribe: Não seja pessimista. Já temos saído de enrascadas mais graves.

Publicado por: David às abril 10, 2005 05:46 PM

Joao Aldeia às abril 10, 2005 12:05 PM:
Há-de me desculpar, mas julgo que não compreendeu o que escrevi sobre “a teoria que não serve para gerir empresas". A teoria neoclássica, no âmbito da microeconomia (teoria do consumidor, da firma e dos preços), é uma teoria sobre o comportamento dos agentes económicos e não uma teoria destinada à gestão de uma empresa. Por exemplo, a função de produção destina-se a ser um modelo explicativo do comportamento da firma em termos da utilização alternativa de factores e da evolução das suas funções de custo e não uma ferramenta de gestão de uma empresa.
Sintetizando, o que eu pretendi dizer foi que os líderes do PSD se estavam a comportar como o empresário estilizado da microeconomia, reagindo automática e imediatamente a estímulos, e não como o empresário real, que planeia a sua actividade.
Isto não significa que a microeconomia não explique o comportamento do empresário real. Explica-o, não apenas pelo refinamento dos modelos, como pela leitura inteligente que se deve fazer deles.

Publicado por: Joana às abril 10, 2005 08:42 PM

Joana às abril 10, 2005 08:42 PM

A sua afirmação é surpreendente, precisamente porque a gestão das empresas apoia-se muito nessas teorias (embora também noutras, não do domínio puramente económico, quando se trata, por exemplo, de gerir os recursos humanos). De resto, o que serve para explicar tem de servir também para gerir (prever e prospectivar) ou então não explica nada, é apenas "storytelling".

Se quer dizer que os modelos matemáticos usados na academia para explicitar as teorias que referiu não são utilizados pelos empresários (maximização do lucro e da utilidade, por exemplo, ou determinação de preços de equilíbrio) estaria de acordo.

No entanto, a fundamentação teórica do agente maximizador de utilidade é certamente usada pelos gestores. Quando se remuneram os quadros com participações na empresa, stock options, etc, não se está a fazer outra coisa, e a fazê-lo conscientemente.

A análise "a la Becker" com que iniciou o post está inteligentemente formulada e creio que poderia ter sido levado até ao fim; a teoria microeconómica não é nenhuma religião, não serve para "reorganizar" a sociedade (dada a complexidade em causa) mas é um instrumento útil para compreender o comportamento, não só dos agentes económicos como de outras organizações, tal como os partidos.

Emoção e razão: uma excelente dicotomia para integrar essa análise, mas aqui ter-se-ia, talvez, que recorrer a António Damásio e à racionalidade limitada.

Publicado por: Joao Aldeia às abril 11, 2005 09:27 AM

"Explica-o, não apenas pelo refinamento dos modelos, como pela leitura inteligente que se deve fazer deles."

Joana, esta forma elegante como você sai da contradição que você própria acabou de expôr, faz lembrar os teólogos que disputam entre si a "leitura (mais) inteligente" dos livros sagrados.

Não há leituras inteligentes. O que está escrito, está escrito.

Publicado por: Luís Lavoura às abril 11, 2005 09:33 AM

Os modelos microeconómicos são, pela natureza das coisas (há dezenas de milhões de agentes económicos e haverá milhares de possibilidades de decisões diferentes) aproximados à realidade. Portanto, quando se analisa um modelo deve ter o necessário cuidado de o compaginar com uma realidade frequentemente complexa e mutável.
É isso que se deve fazer ... e muitas vezes não se acerta.
É mais difícil acertar na Economia que na Meteorologia, dado que indiv´duos e observações a analisar teriam que ser milhares de vezes superiores no 1º caso.

Publicado por: Joana às abril 12, 2005 02:19 PM

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