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abril 12, 2004

O Gestor, o Político e o Tonto

Ou o Western spaghetti em versão TAP

Fernando Pinto conseguiu, apesar de uma conjuntura muito negativa (o 11 de Setembro, e o medo que esse atentado gerou nas viagens aéreas, as guerras no Afeganistão e no Iraque, o aumento da ameaça terrorista e a recessão económica, portuguesa e mundial), que a TAP fechasse o exercício de 2003 com resultados operacionais positivos.

E os resultados foram positivos quer se entre ou não com os resultados extraordinários, fruto da anulação de provisões. A TAP passou de 100 ou 120 milhões de euros de prejuízo para resultados positivos em 3 anos. Enquanto a TAP, anteriormente condenada à falência ou à venda ao desbarato, se tornava lucrativa, a maioria das companhias aéreas enfrentava situações difíceis. Ironicamente foi a Swissair, cuja parceria estratégica com a TAP iria permitir a salvação desta, que faliu entretanto.

Fernando Pinto deu, há semanas, uma entrevista à RR, conduzida por JM Fernandes e Graça Franco, onde se revelou um gestor de corpo inteiro: disse o que tinha relevo para a função que exerce, iludiu o que era matéria política, que não foi para isso que o contrataram, e mostrou ao longo de toda a entrevista um completo conhecimento do negócio, uma visão organizativa e estratégica exemplar.

Fernando Pinto, a avaliar pela entrevista, conseguiu os resultados na TAP apostando na participação dos trabalhadores e, acima de tudo, na sua capacidade de transmitir uma mensagem clara, com conteúdo estratégico e que foi compreendida. Não o fez com falsas demagogias: negociou saídas e reduziu em 700 os efectivos da empresa. Simultaneamente aumentou o número de voos por avião, ao criar a placa giratória em Lisboa e ao mudar o perfil das vendas. Com estas medidas, e apesar da redução do pessoal, fez crescer as operações da TAP em cerca de 35%.

Com a sua gestão, a TAP reduziu, nos últimos dois anos, o endividamento em 220 milhões. Entretanto, a TAP já entregou ao Estado, em impostos, mais do que havia recebido deste, como ajuda, em 1997 (928 milhões contra 900 milhões de euros).

Cardoso e Cunha, depois das tiradas pessimistas durante a fase do encerramento do exercício e apuramento de resultados, entrou num período claramente optimista. Em entrevista ao «Diário Económico», Cardoso e Cunha considerou que a TAP vai entrar numa «fase de afirmação, após ter fechado o ciclo de recuperação», e estimou que todas as unidades de negócios da TAP deverão apresentar, em 2004, resultados operativos fortemente positivos, avaliando-os em 46,3 milhões de euros, o dobro do registado em 2003.

Cardoso e Cunha esquece todavia algumas coisas: em primeiro lugar que os resultados de 2003 estavam muito inflacionados por um resultado extraordinário, obviamente de carácter pontual. E esquece ainda, ironicamente, que foi ele próprio que andou a lembrar isso semanas atrás, para moderar o entusiasmo dos que falavam em mais de 20 milhões de euros de resultados positivos. Se a estimativa dos 46,3 milhões de euros fosse correcta, então não seria do dobro, mas de uma a duas dezenas de vezes que os resultados da TAP aumentariam em 2004.

Mas como eu não me esqueci, proponho que aquela previsão só possa ser tomada em consideração se for reiterada depois de 31 de Março de 2005. É que fiquei muito pouco crédula relativamente às previsões de Cardos e Cunha sobre a TAP.

Enquanto isso, um dirigente do Sindicato de Trabalhadores de Aviação e Aeroportos (SITAVA) acusava Cardoso e Cunha de fazer declarações que em nada contribuem para a recuperação da empresa, por este ter revelado que, nos próximos três anos, a empresa pretende reduzir cerca de mil postos de trabalho e sustentando que quem chega à presidência da TAP tem como principal preocupação o despedimento de trabalhadores, «avançando com números que quase parece um totoloto».

Ora existe um plano, que tem sido consensual na TAP, em que esta vai reduzir os seus efectivos a uma média de 350 por ano. Foi isso que a TAP fez nos dois anos anteriores e, provavelmente, será isso que continuará a fazer. Aquela redução anual representa cerca de mil efectivos em 3 anos, o número avançado por Cardoso e Cunha e o totoloto do dirigente sindical.

O SITAVA defende que a recuperação da TAP não deve ser feita através da redução, mas antes com o aumento dos postos de trabalho. Deste modo o SITAVA está em completa dessintonia com a gestão e com o pessoal da TAP, que tem apoiado os planos de reestruturação de Fernando Pinto. Deste modo os trabalhadores das empresas em dificuldades (TAP, Auto-Europa, etc.) continuam a aceitar planos de recuperação à revelia dos sindicatos, enquanto estes pregam no deserto da comunicação social.

Publicado por Joana às abril 12, 2004 07:40 PM

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Comentários

Esta charge sobre a TAP e os seus “protagonistas” está muito bem observada. Parabéns.

Publicado por: Ricardo às abril 13, 2004 01:11 AM

O Cardoso e Cunha não passa de um boy e o sindicato é do período jurássico.
Políticos e sindicalistas hão de levar o país à ruina

Publicado por: riuse às abril 13, 2004 01:13 AM

Acho o Cardoso e Cunha um homem competente. Tem um defeito - é muito vaidoso e auto-convencido.
Tenho impressão que é por isso que tem tido estas pegas com o tipo da TAP.
O Cardoso e Cunha não é um boy.

Publicado por: Gros às abril 13, 2004 01:35 AM

O Gros tem razão, Joana. O Cardoso e Cunha é um homem competente e um excelente organizador. Uma parte importante do sucesso da Expo98 deve-se a ele.
É todavia um auto-convencido. E não me refiro apenas à polémica descabida que sustentou contra o Fernando Pinto. Na Expo, após a queda do Cavaco, Cardoso e Cunha andou a jogar o papel de imprescindível, com uma enorme arrogância. Foi demitido e viu-se que afinal não era imprescindível.
Cumprimentos

Publicado por: L M às abril 13, 2004 09:11 AM

Esta análise está interessante e mordaz.
Falta é uma referência ao Iraque.
Não faz falta ao conteúdo, mas chama a atenção!

Publicado por: Hector às abril 13, 2004 04:25 PM

Embora concordando em alguns aspectos com o que foi escrito parece-me que as reformas devem ser feitas respeitando as estruturas dos trabalhadores

Publicado por: aj ribeiro às abril 13, 2004 07:07 PM

Cardoso e Cunha um homem competente?????

Parte importante do sucesso da Expo98 deve-se a ele????

Ok. Desisto.

Publicado por: Carvalho Negro às abril 14, 2004 10:44 AM

Cardoso e Cunha é um nome polémico. Tenho lido as mais desencontradas opinões sobre ele.
Por exemplo, aqui.

Publicado por: David às abril 14, 2004 11:01 AM

Alguém sabe o número exacto de empresas que o Cardoso e Cunha levou à falência?
# : - ))

Publicado por: (M)arca Amarela às abril 14, 2004 09:09 PM

O comissário politico, do PSD, na TAP, está lá apenas, para não permitir, que esta companhia, tenha algum sucesso ainda que minimo. E claro para levar os Euros para casa.

Publicado por: jgonçalves às abril 14, 2004 11:16 PM

Vejam lá se se põem de acordo sobre o Cardoso e Cunha!

Publicado por: Blanco às abril 15, 2004 03:01 PM

Afinal o Cardoso e Cunha levanta quase tanta celeumacomo o Iraque!

Publicado por: Hector às abril 16, 2004 12:51 AM

O Fernado Pinto demitiu-se ou não? Alguém sabe?

Publicado por: David às abril 16, 2004 02:32 PM

A TAP Air Portugal negou hoje que o administrador-delegado da empresa, o brasileiro Fernando Pinto, tenha entregue um pedido de demissão no final de Março.
Mas não diz que não entregou no princípio de Abril!

Publicado por: David às abril 16, 2004 02:33 PM

Parece que essa notícia não se confirma

Publicado por: JCorreia às abril 16, 2004 09:16 PM

Acho contudo estranho as notícias à volta da TAP. Notícias que dizem uma coisa, depois outras que dizem o contrário, depois desmentidos.
Será por acaso?
Não acredito.

Publicado por: JCorreia às abril 16, 2004 09:17 PM

Sempre embirrei com a arrogância e o super-ego do Cardoso e Cunha.
Quanto à questão do JCorreia, acho que deveria ser meditada. Acho que há demasiado barulho à volta disto. Alguma razão haverá.

Publicado por: Vitapis às abril 16, 2004 10:55 PM

Também a mim me intriga esta controvérsia permanente sobre a TAP. Será apenas protagonismo dos administradores ou haverá razões ocultas?

Publicado por: VSousa às abril 16, 2004 11:57 PM


Conheci Cardoso e Cunha que considero um homem de valor. Não sei como é que a liberdade serve para podermos ofender quem nos apetecer só porque discordamos da sua política de gestão (caso da TAP).Cardoso e Cunha não deixa de ser quem é por isso mas ... não deixa de ser triste-

Modesto Martins

Publicado por: Modesto Melo Martins às fevereiro 2, 2006 12:24 PM

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