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dezembro 09, 2003
John Milton
Milton nasceu a 9 de Dezembro de 1608. Faz hoje quase 4 séculos. John Milton e o seu Paraíso Perdido, são talvez dos mais lídimos representantes da Inglaterra do século XVII, em que a herança elizabethiana foi postergada pela tentativa de estabelecer o poder absoluto pelos Stuarts, tentativa gorada que levou à execução de Carlos I e ao estabelecimento da república e da ditadura puritana de Cromwell. A morte de Cromwell e os excessos dos puritanos permitiram a restauração dos Stuarts, de Carlos II, que foi uma época de fausto e luxúria na corte e de ressentimento e angústia no povo e na burguesia.
A sociedade inglesa do século XVII está unida na sua vontade de mudança política, mas profundamente fragmentada em relação ao que deveria ser mudado. As implicações radicais do protestantismo inglês, a tensão entre a supremacia da consciência individual e o autoritarismo político e religioso, a secularização da autoridade religiosa, tudo levou a uma destabilização da sociedade inglesa. Foi um século em que a sociedade inglesa viveu em permanente crise, até à revolução de 1688 (Glorious Revolution), que destituiu o último dos Stuarts.
John Milton foi contemporâneo de Thomas Hobbes (1588-1679), mas teve um percurso muito diferente. Participou activamente no derrube dos primeiros Stuarts e participou igualmente no governo de Cromwell. Mas cedo se decepcionou da política e o Paraíso Perdido é um reflexo de todo esse percurso. Aqueles que não exerceram a sua fé e a sua razão, respeitando a sua liberdade e uma possibilidade de escolha, independente dos seus méritos individuais, passariam a eternidade imersos no “darkest and deepest gulf of hell" – “He who reigns within himself and rules his passions, desires and fears is more than a King”. Milton não viu a fim do período Jacobita, pois morreu em 1674.
Há algumas sentenças de Milton que permanecem surpreendentemente actuais. Ao ler “Who overcomes by force hath overcome but half his foe”, pensa-se imediatamente na política de Bush face ao Iraque e na ausência de uma componente política coerente conjugada com a intervenção militar.
Que estou eu a dizer ? ... a cultura é sempre actual.
De Milton, do Paraíso Perdido
Mundo Infernal! E tu, profundíssimo Inferno,
Recebe teu novo dono - o que traz uma
Mente que não mudará com espaço ou tempo.
A mente é seu próprio lugar e em si mesma
Pode fazer um Céu do Inferno, um Inferno do Céu.
Que importa onde, se serei sempre o mesmo
Aqui ao menos seremos livres...
podemos reinar com segurança; e, a meu ver,
Reinar é uma boa ambição, embora no Inferno:
Melhor reinar no Inferno que servir no Céu
Publicado por Joana às dezembro 9, 2003 09:28 PM
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Comentários
Joana: você não pára de me surpreender. Agora até poesia!
Publicado por: Hector às dezembro 9, 2003 10:03 PM
Oi Heitor, cê é mesmo um puxa saco, né?
Publicado por: Je às dezembro 9, 2003 11:49 PM
Oi Je, sem querer parecer o Carlos Cruz, você podia trocar isso por miúdos?
Publicado por: Hector às dezembro 10, 2003 12:30 AM
Joana:
Tenho seguido, na medida das minhas disponibilidades, este blog. Aproveito este post, diferente do que lhe é habitual, para lhe dizer que acho a sua prestação fora de série. Pelo rigor com que escreve, pela sua versatilidade, pelo seu estilo, etc.
E tudo isto fruto, aparentemente, de uma pessoa apenas.
Digo-lhe que o seu blog é um elemento de referência, independentemente de ser muito ou pouco consultado.
Tornou-se importante lê-lo. E isso é o melhor elogio que se lhe pode fazer.
Publicado por: Rui Pereira às dezembro 11, 2003 01:36 AM
Vamos lá ver se a "profecia" de Milton, com a captura do Saddam, muda de sentido!
Publicado por: Gpinto às dezembro 14, 2003 03:03 PM