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agosto 16, 2004
Alegadas Cassetes
Reina grande agitação na Comunicação Social e nos meios judiciais acerca das alegadas gravações ilícitas entre um jornalista do Correio da Manhã, Octávio Lopes, e diversos interlocutores ligados aos meios judiciais que, alegadamente, teriam violado o segredo de justiça. Alegadamente as cassetes foram roubadas ao jornalista que as tinha em seu poder por razões alegadamente desconhecidas.
O Independente publicou alegados excertos das alegadas cassetes, violando, alegadamente, o sigilo do jornalista e o direito à protecção das alegadas fontes. Alegações diversas sugerem uma alegada conivência com um alegado crime de informação de um alegado segredo de justiça e de um alegado roubo de informação.
A Directora do Independente justificou a publicação, alegando o interesse público, uma opção do Estatuto do Jornalista de salvaguarda a tudo o que um jornal pretender publicar para dinamizar a procura e aumentar as tiragens.
Estas alegadas ocorrências levaram à demissão de Adelino Salvado, Director da PJ. Adelino Salvado alegou que apenas estava a travar uma conversa informal com um jornalista sobre uma matéria (o processo Casa Pia) que nem conhecia, visto não ter tido, segundo alegou, acesso ao processo. Segundo ele, está apenas a ser vítima de uma cabala que lhe causou a mais insensata incontinência verbal. Todavia, é deveras preocupante saber-se que, em Portugal, os Directores da PJ falam «informalmente» ao telefone com jornalistas sobre processos a cujo conhecimento têm possibilidade de acesso, mesmo que depois assegurem que o não tiveram. Provavelmente Adelino Salvado, pela sua incontinência verbal, estará actualmente mais vocacionado para ser um fazedor de blogue do que para continuar à frente da PJ. Por sua vez, Sara Pina, a assessora de imprensa da Procuradoria Geral da República que alegadamente teria falado com Octávio Lopes sobre o processo, e cujas conversas este havia gravado, está à espera de Souto Moura para apresentar a sua demissão. Provavelmente também irá dedicar-se futuramente à blogosfera.
Quanto a Octávio Lopes é, na interpretação mais lisonjeira, um alegado jornalista. Um jornalista a sério nunca poderia gravar conversas sem o conhecimento dos seus interlocutores; nunca perderia tempo a travar conversas ociosas com pessoas, como Adelino Salvado, que asseguravam não ter nada a ver com o processo; destruiria o material áudio logo que o tivesse transcrito ou deixasse de o utilizar; nunca o abandonaria à mão de semear no seu local de trabalho. Segundo fontes próximas, Octávio Lopes estaria a ser vítima de uma cabala que o levaria a cometer todos estes disparates e ilícitos.
A emoção foi tal que extravazou da Comunicação Social e dos meios judiciais para algumas cúpulas partidárias. O próprio PR, que participava, em Atenas, na Maratona dos 300 metros sob escolta desportiva, foi chamado à colação e vai começar a semana de férias a reunir-se com os alegados protagonistas destas alegadas ocorrências, para escutar as suas alegações.
Os dirigentes do PS estão excitados pelas mais variadas razões. Ferro Rodrigues, o inspirador da magnífica e inovadora tese da vitimização pela cabala, assegura que para ele não é importante a «perspectiva jurídica» mas sim a ocorrência de uma «abjecta violação do segredo de justiça». Sobre esta qualificação, Ferro Rodrigues é a pessoa mais habilitada a opinar, pois sabe que desde que ele se começou a ca*ar no segredo de justiça, tudo aquilo se terá tornado numa matéria obviamente abjecta. Por sua vez, João Soares pede a divulgação das cassetes roubadas e que se dê conhecimento do seu teor à opinião pública, porque é preciso apurar até às últimas consequências o que se passou. Como é de norma no funcionamento de um Estado de Direito, não é preciso dar conhecimento dos pormenores de um crime à opinião pública, para se apurar o que se passou até às últimas consequências. São as instâncias judiciais que se ocupam disso e não a justiça popular. João Soares pretende apenas queimar definitivamente Ferro Rodrigues.
Como nós só vemos o mundo através do reflexo cavernoso que a comunicação social nos transmite, é normal que permaneça no olvido o alegado jornalista Octávio Lopes. Nunca mais ninguém ouviu falar nele. A comunicação social mantém-no escondido da curiosidade malsã da opinião pública. Afinal ele apenas fez gravações ilícitas, usou-as ilicitamente, guardou-as ilicitamente e deixou-as negligentemente acessíveis, para serem ilicitamente publicadas por outro jornal. Mas os ilícitos jornalísticos estão protegidos pelo seu Código Deontológico: desde que haja interesse público nunca há ilícito. O interesse público prevalece sobre tudo. E quem define o interesse público? os jornalistas e os seus critérios jornalísticos. Os jornalistas são uma classe que se julga e se absolve em causa própria. Aliás o Director do Correio da Manhã assegura que Octávio Lopes e todo o jornal estão a ser objecto de uma cabala que os teria levado a cometer todos aqueles ilícitos e negligências eventualmente dolosas.
A própria assessora de imprensa permanece numa meia obscuridade. Afinal, uma assessora de imprensa é uma jornalista «indirecta». Escreve nos jornais por interpostas pessoas. Só se fala dela quando se exige a cabeça de Souto Moura. Segundo alguns políticos, a assessora de imprensa é inimputável: não passa de um objecto que só se mexe animado pela tensão muscular ou cerebral de Souto Moura. Provavelmente foi vítima de uma cabala urdida por Souto Moura para a fazer discorrer junto de jornalistas sobre assuntos confidenciais de forma incontinente.
Louçã, por exemplo, sempre o primeiro a adiantar-se a pedir a cabeça dos outros políticos, neste caso optou por exigir a cabeça de Souto Moura. A razão é óbvia: este drama da Casa Pia foi um dos principais factores que levaram à queda de Ferro Rodrigues e ao desvanecimento da possibilidade de Louça integrar um próximo elenco governativo e sabe-se como os «princípios» resistem mal ao charme discreto do poder. Aliás, normalmente são aqueles que mostram mais «firmeza» e «arrogância» na defesa de «princípios» que depois os ignoram discretamente.
Quanto ao país ... está em férias. As teorias das cabalas foram banalizadas pelas truculências verbais do Ferro Rodrigues: ninguém lhes liga nenhuma. Quando alguém diz: deixem a justiça funcionar, o país ri-se baixinho. Só quem nunca teve necessidade de recorrer à justiça ignora que esta ou não funciona em tempo útil, ou não funciona de jeito nenhum. Só quem, por motivos profissionais, tem conhecimento das sentenças dos tribunais sobre uma dada matéria, sabe que, para a mesma tipologia de incidente, os juízes emitem as sentenças mais díspares e hílares. E frequentemente recheadas com alegações de âmbito científico que devem resultar de algum copy&paste, feita ao acaso do Google, sem base consistente, pois estão em absoluto fora das suas habilitações e dos seus conhecimentos.
Publicado por Joana às agosto 16, 2004 01:21 PM
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Comentários
espremido , espremido , este texto passa bem por ser do gabinete de imprensa do PP profundo ou , com alguma boa vontade , do gabinete de imprensa do alegado governo...
Publicado por: zippiz às agosto 16, 2004 10:35 PM
Sara Pina tem, segundo os jornais, uma pós-graduação em Direito de Comunicação, onde defendeu uma tese sobre «A Deontologia dos Jornalistas Portuguesas»
Depois de uma aprendizagem teórica, Sara Pina deve ter aprendido agora a prática da «Deontologia dos Jornalistas Portuguesas».
... Em casa de ferreiro o espeto é de pau ...
Publicado por: Joana às agosto 17, 2004 04:55 PM
zippiz em agosto 16, 2004 10:35 PM:
Enquanto a comunicação e ... mantiverem Octávio Lopes na clandestinidade, considero hipócritas e falhos de ética todos os que pedem a «cabeça» do procurador, ignorando e ocultando tudo o resto.
Nem sequer merecem resposta.
Publicado por: Joana às agosto 17, 2004 05:00 PM
De facto é estranho a imprensa não dizer népia do colega jornalista. Ou não é estranho e é grave.
A Sara Pina está agora a estudar o que é a «Deontologia dos Jornalistas Portuguesas» na prática.
Publicado por: Coruja às agosto 17, 2004 09:09 PM
Coruja:
Tem toda a razão. Fala-se do Procurador Geral, o Director da PJ e a assessora da PGR demitem-se e o Octaviozinho, que só praticou actos ilícitos, continua na clandestinidade, como escreve a Joana.
Isto só mostra o estado da nossa comunicação social.
Publicado por: David às agosto 18, 2004 02:54 PM
O Soares pai também quer a cabeça do Moura. Isto é apenas política e não tem nada a ver com a justiça.
Publicado por: fbmatos às agosto 20, 2004 12:26 AM
Na verdade o silêncio da imprensa sobre o jornalista do CM é esclarecedor do corporativismo da classe
Publicado por: c seixas às agosto 28, 2004 09:05 PM