A Maldição dos Templários Les Rois Maudits
A Ordem, pela sua cupidez e riqueza, era temida e odiada pelas populações. No início do processo os povos estariam inclinados a aceitarem as acusações contra a Ordem. Todavia a iniquidade do julgamento e as execuções bárbaras de muitos cavaleiros e do mestre da Ordem fizeram com que as simpatias da posteridade, a cujos olhos a desapiedada violência do monarca foi o traço mais vivo deste drama, se inclinaram tanto mais decididamente a favor da Ordem quanto mais ambíguo era o papel nele desempenhado pela Igreja e quanto mais esta deu a entender, em interesse próprio, que a Ordem sucumbira inocente. Mas o que excitou mais a imaginação dos contemporâneos e da história foi a alegada maldição de Jacques de Molay e o destino subsequente do papa, do rei, dos seus filhos e noras, e da sua dinastia.
Há quem pretenda que Jacques de Molay, ao ver-se na fogueira, emprazou o rei e o seu cúmplice Clemente V a comparecerem dentro de um ano no tribunal de Deus e, devido a esta maldição, relaciona o vulgo as mortes de um e outro, ocorridas, a do papa, em 20 de Abril de 1314, menos de um mês depois da execução, e a de Filipe em 29 de Novembro do mesmo ano (faz hoje 690 anos). Na doença de que o rei foi acometido e nos reveses que caíram sobre a sua família, viram outros o castigo do céu pelo crime cometido contra a Ordem dos Templários.
Por sua vez, algumas semanas após o suplício, soube-se que as noras do rei, Marguerite da Bourgonha e Blanche de Artois, cometiam adultério com dois cavaleiros da corte e que Jeanne, a irmã de Blanche, e também nora do rei, estava ao corrente e dava cobertura. Foi a filha de Filipe IV, Isabel (*), casada com o rei de Inglaterra, Eduardo II, que denunciou as cunhadas ao pai, em Abril de 1314. Foi o chamado escândalo da Torre de Nesle, do local, onde segundo a lenda, se davam os encontros.
As duas adúlteras foram obrigadas a irem para o convento, em situação penosa (Marguerite sobreviveu poucos meses à clausura numa torre com todas as janelas abertas ao vento) e os amantes sofreram um suplício terrível: cortados aos pedaços ainda em vida, o sexo deitado aos cães, decapitados no fim. O castigo de Jeanne foi menos gravoso.
Para além da afronta à família real, do ónus da imoralidade que atingia, publicamente, pessoas da nobreza mais elevada, eram as próprias instituições e o futuro da dinastia que estava em risco. Quem certificaria que as noras de Filipe IV teriam filhos legítimos? O que se sabia do seu comportamento poderia ser utilizado para pôr em dúvida a legitimidade dos descendentes.
A Filipe IV sucedeu Luís X le Hutin (o Desordeiro) que apenas sobreviveu dois anos ao pai. Como a mulher (Marguerite) morrera em cativeiro, casou-se novamente, mas apenas teve um filho póstumo, João I, que só viveu 5 dias.
No curto reinado de Luís X, este ordenou, em 1315, a execução de Enguerrand de Marigny, o principal conselheiro financeiro de Filipe IV e um dos grandes responsáveis pela extinção da Ordem do Templo. A permanente crise das finanças tinha que ser resolvida, e que melhor solução se poderia encontrar senão mandar executar o encarregado das finanças? Enguerrand de Marigny foi executado e os seus despojos ficaram pendurados no cadafalso durante dois anos!
Após Luís X e o seu filho póstumo, cingiu a coroa Filipe V em 1316. Justificou o afastamento da sua sobrinha, filha de Luís X, do trono, por uma interpretação errónea da lei sálica. Todavia, a sua esposa reabilitada, Jeanne d'Artois, apenas teve 3 filhas e nenhum filho varão. Quando morreu, em 1322, a sua própria interpretação das regras da sucessão afastou as suas filhas do trono, e fez que fosse o seu irmão Carlos IV a suceder-lhe
Carlos IV divorciara-se de Blanche, casara novamente, mas morreu em 1328, sem herdeiro masculino.
Em face da extinção desta linha da dinastia dos Capetos, e perante os pretendentes, a nobreza escolheu Filipe de Valois, sobrinho de Filipe IV. Todavia Eduardo III da Inglaterra, neto de Filipe IV (era filho de Isabelle, a Loba de França) reivindicou o trono. Ia começar a guerra dos 100 anos.
Todos estes acontecimentos causaram profunda perturbação na época e a lenda da maldição dos Templários ganhou foros de verdadeira. O Papa e o Rei directamente responsáveis pelo suplício do Mestre do Templo morreram menos de um ano depois; todos os filhos do Rei reinaram sucessivamente, mas nenhum deixou descendência que pudesse cingir a coroa; o escândalo da Torre de Nesle, que veio a público menos de um mês após aquele suplício, deu uma machadada fatal à legitimidade da descendência de Filipe IV e causou a extinção da dinastia. O Conselheiro financeiro de Filipe IV, e o mais exaltado detractor dos Templários, foi executado um ano depois do suplício de Jacques de Molay.
E todos estes acontecimentos iriam fazer mergulhar a França e a Inglaterra na Guerra dos 100 anos.
Todas estas coincidências, espantosas e fatais, constituiriam fundamentos mais que suficientes para que surgissem as mais variadas lendas sobre os Templários. Algumas asseguram que a Ordem manteve-se viva, embora clandestina e que a maçonaria tem as suas raízes nela. Mas tudo isto não passa de lendas sem consistência histórica.
Nota (*): Muitos devem ter visto Sophie Marceau no papel de Isabel no excelente filme "Braveheart" de Mel Gibson. Neste filme Isabelle está pintada com cores muito benévolas. Os ingleses conheciam-na pela Loba de França, por causa do seu temperamento violento. Como o marido, com quem casara em 1308, se interessava mais por pajens, ela tomou por amante, de forma quase pública, Roger Mortimer. Segundo parece apressou a morte do marido, em 1327. Três anos depois, o seu filho, Eduardo III, atingiu a maioridade, mandou executar o amante da mãe e enviou esta para o convento.
Publicado por Joana em novembro 29, 2004 12:38 AM | TrackBackTiro-lhe o chapéu, Joana. Estes posts estão muito bons, muito desenvolvidos e muito elucidativos. Parabéns
Afixado por: vde em novembro 29, 2004 01:23 AMTambém gostei muito do conjunto de posts. O assunto é fascinante.
Não li, nem provavelmente vou ler, o "Código". Mas aproveito para "fazer publicidade" a uma novela muito bem urdida tendo como pano de fundo a tragédia dos templários. É o MONSIEUR, de Lawrence Durrell, o primeiro de cinco volumes do "quinteto de Avignon" (os seguintes não são tão bons). É, para mim, do melhor que o autor escreveu.
E, já agora, um apelo a eventuais conhecedores da obra de Durrell que visitem o site. Há uns 15 anos vi numa pequena livraria póxima do instituto francês um ensaio do Durrell sobre a Provença e os Templários. Quis comprá-lo, mas como não tinha o preço marcado não puderam vender-mo. Quando lá voltei o livro tinha sido já vendido. E não consigo localizá-lo na lista de obras do autor, nem em diversas livrarias, em Portugal ou fora, onde o tenho procurado. Terei imaginado um livro que não existe?
Caro Lino Reis:
O seu livro talvez possa ser encontrado neste "sítio":
http://www.lawrencedurrell.org/
Possui TODOS os livros e artigos escritos por esse autor.
Jose Paulo Andrade
Afixado por: Jose Paulo Andrade em novembro 29, 2004 10:02 AMJosé Paulo Andrade: Obrigado pela sugestão.
Afixado por: lino reis em novembro 29, 2004 10:45 AMDepois deste fim de semana é que o seu marido vai estrangulá-la, com a conivência dos juízes do SJT. Nem pena suspensa vai ter!
Afixado por: R de Carvalho em novembro 29, 2004 10:47 AMViva!
uma visitinha a esta casa para agradecer apoio(s) recebido(s).
Um abração do
Zecatelhado
Esta série de post está excelente. Bem melhor que o livro do Código da Vinci descodificado
Afixado por: Ricardo em novembro 29, 2004 02:45 PMParabéns Joana por esta descodificação. Apreciei bastante.
Afixado por: bsotto em novembro 29, 2004 03:00 PMMais vale esta reaças dedicar-se ao templarios que à actualidade.
Continua.
Olhó Cisco. Há tanto tempo! E sempre igual!
Afixado por: Coruja em novembro 29, 2004 04:24 PMEstão óptimos estes posts. Têm informação muito valiosa e interessante
Afixado por: Cerejo em novembro 29, 2004 05:42 PMJanica,
Estavam ali a desafiar-me para vir cá ver isto. Quanto a mim está bastante melhor, já escreves dois por dia e nem disfarças.Claro que escreves sempre à noite e a coisa flui como água.E há palermas que acreditam.O problema é que votam. Mas continua, diverte-te, embora ache que podias fazer outras coisas mais divertidas. Portanto ou és feiosa e não tens onde caír morta ou o partido paga-te muito bem. Ou ambos (é o mais certo).
Agora deve vir aí a tua resposta mordaz ou algo a dizer que nem mereço resposta (mais fácil, claro).
Bjs e continua que ainda chegas a director (a) da Central de Informação.
Esta série de posts está excelente pelo conjunto de informação.
Que tal o fds? Pergunta cínica!
Passar por aqui é como ir à biblioteca: entro para ver um livro ou dois, ficar só meia hora e acabo perdendo a noção do tempo... Está cada vez melhor! Também resisti antes de ler o livro do Mr. Brown e também acabei de lê-lo nesse fds. Gostei muito a despeito da imprecisão histórica que pelo menos para mim nada mais é que o uso do marketing para vender mais, afirmar que alguns fatos ou mesmo descrições arquiterônicas são reais tendem a tornar mais tênue a linha que separa a ficção da realidade. Alguma dúvida de que a receita usada funciona? Enquanto discutimos se Jesus deixou descendentes, se Leonardo da Vinci tinha preferência por homens, se o Priorado de Sião é uma ordem secreta ou um embuste, se existe alguma relação entre o Paternon, as Pirâmides do Egito e as obras de Da Vinci as vendas do Código só fazem aumentar e outra aventura de Robert Langdon já está a venda e tem de tudo para ser outro best seller.
Afixado por: Fernando em novembro 30, 2004 03:47 PMFernando:completamente de acordo
Afixado por: Viegas em novembro 30, 2004 05:00 PMParabéns, Joana pelo blog. Textos excelentes