Vivaldi é um veneziano nascido em 4 de Março de 1678. Filho de um violinista de nomeada, cedo se produziu em concertos. Em 1703 foi ordenado padre, mas nunca exerceu a sua função seriamente e mantendo uma vida amorosa às claras, o que lhe valeu as alcunhas de "padre mentiroso" e "il prete rosso" (Vivaldi era ruivo). As suas surpreendentes qualidades de professor e intérprete cedo lhe granjearam admiração em toda a Europa. Um dos seus mais entusiastas admiradores foi mesmo J Sebastian Bach.
A partir de 1718 inicia uma carreira cosmopolita, percorrendo toda a Itália e o resto da Europa. Foi aclamado e agraciado por muitos dos governantes e soberanos europeus.
A sua popularidade começou a declinar, não lhe perdoavam o ser padre e pouco casto e morreu em Viena em 1741, com 63 anos, na miséria. Curiosamente, a data da sua morte, 28 de julho, foi a mesma de Bach, nove anos depois, e de Mozart, 50 anos depois e na mesma cidade de Viena.
Antonio Vivaldi compôs mais de 500 concertos, destinados a todos os instrumentos: viola, violino, violoncelo, flauta transversa, oboé, fagote, cravo, clarinete, alaúde, órgão, etc., etc., empregues individualmente ou agrupados em concerti grossi ou em sinfonias (25).
Mas Vivaldi para além de um criador incansável de inesquecíveis melodias (Não podemos esquecer seu lado "impressionista", representado em obras como L'estro armonico, La stravaganza, La Cetra e Il cimento dell'armonia e dell'inventione (1720) que contém as Quatro Estações), deixou sua marca em toda a música instrumental que o sucedeu. É, com efeito, o primeiro compositor sinfónico. Com Vivaldi, os violinos adquirem grande força e densidade orquestral; é fixado o esquema tradicional de movimentos (rápido-lento-rápido); surge o concerto para solista; a instrumentação e a orquestração ganham importância nunca alcançada.
Compôs numerosos concertos, música vocal, meia centena de obras religiosas (missas, salmos, motetes, cantatas). A mais conhecida peça sacra de Vivaldi é o Gloria, uma obra de majestosidade e beleza impressionantes. Outras obras-primas: o Stabat Mater, intensamente dramático, o Magnificat e o Dixit Dominus.
Na oratória, a maior obra de Vivaldi é a Juditha Triumphans, de orquestração deslumbrante e de virtuosismo vocal quase operático. É, inclusive, muito mais convincente em termos dramáticos que suas próprias óperas.
Compôs 95 óperas, mas que só chegaram até nós, completas, 19. A produção operática de Vivaldi não está entre a melhor música que compôs. O pior defeito das óperas de Vivaldi está nos libretos, muito fracos e desinteressantes. E Vivaldi parece não se importar muito com isso, não resolvendo suas óperas no sentido dramático: as árias não se relacionam umas com as outras. Todavia, os seus recitativos são riquíssimos e expressivos, com grande modelação cénica. O compositor adapta seu estilo vibrante e sua instrumentação colorida ao que o público veneziano queria e estava acostumado a ver em cena: muito bel canto e virtuosismo vocal para a glória dos cantores.
A melhor incursão de Vivaldi no género é sem dúvida Orlando Furioso, ópera que foi reescrita três vezes - atitude invulgar que talvez explique a qualidade da obra. Outras óperas com interessse: Catone in Utica, Montezuma, Tito Manlio, etc.
A grande maioria das obras orquestrais ficaram em manuscritos, que depois foram vendidos ao desbarato alguns meses antes de sua morte.
A música de Vivaldi é extremamente eficaz e inventiva e teve uma importante influência nos seus contemporâneos e nos compositores posteriores.
É um dos expoentes máximos da maravilhosa música europeia, um dos mais preciosos legados que os nossos antepassados nos deixaram
Não me leves a mal... estou a ouvir o Bolero... Ravel...
CC
ahhhhh.. o Bolero do Ravel...
Faz-me sempre lembrar do Humpty Dumpty do Lewis Carrol:
(...)
- Não sei o que queres dizer com [essa palavra] - disse Alice.
Humpty Dumpty sorriu com ar de desprezo.
- Claro que não sabes, até eu te explicar...Quando uso uma palavra - disse Humpty Dumpty, num tom desdenhoso -, ela significa exactamente o que eu quero que ela signifique, nem mais, nem menos.
-A questão está em saber - disse Alice - se tu podes fazer que as palavras tenham significados diferentes.
- A questão está em saber - disse Humpty Dumpty - quem é que manda.
(Lewis Carrol, Through the Looking Glass)
(...)
A questão de ouvir o Bolero é exactamente a de saber quem manda: manda Ravel, já que não nos deixa conseguir sair das amarras que criou e que nos impedem de não seguir a repitição de naipe em naipe até que a sua obre implode sem nos dar uma solução para o que nos habituámos a julgar saber o que é "uma solução musical"...
Mas, Joana...
Vivaldi... 95 óperas???? os meus "arquivos" registam 46 (mas estão sempre abertos a revisão)
Vivaldi, tanto quanto aprendi quando ainda estudei História da Música, pertence ao Barroco, pelo que afirmar (ou "desconfiar") que Vivaldi terá sido o primeiro " o primeiro compositor sinfónico" é dourar a pílula.
Talvez (pela nossa mania de "ressiclar") não se note hoje nas execuções de Vivaldi a tónica de que a presença do cravo (ou orgão)como contínuo fazia o baixo e preenchia a harmonia.
O Barroco, ao qual Vivaldi pertencia, tem a particularidade de igualar a música instrumental à importância que, até então, tinha tido a música vocal. Mas, acima de tudo, tem a importância de passar a utilizar os instrumentos de cordas (violinos principalmente) como o coração da orquestra (que era, até então, um desorganizado e aleatório conjunto de instrumentos) ao qual os compositores juntavam outros instrumentos a seu bel-prazer.
São criações do Barroco a fuga, a sonata, a suíte e o concerto (este último ainda rudimentar).
O Vivaldi sinfónico da Joana não pode existir... pelo menos com o altar que a Joana o premeia...
E porquê?
Simplesmente porque a Sinfonia ( a que chamamos Sinfonia, hoje) nasce a partir da Sonata criada no período Clássico (no fim de contas, a Sinfonia é uma Sonata para orquestra e tem quatro movimentos: rápido - lento - minueto - muito rápido).
A música de Vivaldi é, o mais das vezes (exceptuando, talvez, os seis concertos para flauta Op. 10 ou , muito pela popularidade, a parte das Quatro Estações de Il cimento dell'armonia e dell'inventione ) repetitiva e cansativa (quem estudou contraponto, então, saberá e sentirá perfeitamente a que me refiro).
As verdadeiras pérolas de Vivaldi são algumas óperas. E digo algumas, porque Vivaldi entreteve-se a fazer colagens de obras suas e de obras de outros compositores. Naquilo em que não fez colagens, pode sentir-se o que seria o seu génio se não se "distraísse": Orlando Furioso ou, mesmo, a incompleta Catone in Utica (só compôs dois actos).
Em todo o caso, Joana, obrigado pela lembrança da efeméride.
Já agora, e como estas "coisas da música" me transportam sempre para mim mesmo, deixo aqui, com as devidas desculpas, algo que escrevi há três anos atrás ao ouvir o meu compositor de eleição.
Colocamos outro CD?
O omnipresente latejar da pressão nas têmporas torna-me consciente do inconsciente e inconstante pulsar do coração.
À minha volta, as cores convergem vertiginosamente sintetizando-se no branco e o fio da vida reduz-se até ampliar desmesuradamente o eu em que se debate o frenesim da busca de um entendimento.
Quando assim acontece, invariavelmente coloco no leitor o CD e deixo-me sugar para o interior das Sinfonias de Mahler, o meu compositor de eleição e ao qual deixo ler na perfeição os desesperos e as aspirações.
Dentro delas, e no desenrolar das esotéricas evoluções dos seus temas, sinto-me como um Átomo, constantemente arremessado, invariavelmente ricocheteando, incessantemente reacendido até ao infinito pelos vários naipes da orquestra, e resolvo-me diluir os sentimentos ficando hesitantemente a pairar por entre o absoluto do silêncio e a mágica violência intrigante de uma nota aparentemente dissonante.
É aí, nessa magia feita de isolamento, que faço a leitura do que o Universo tende a esconder à urgência do viver. É aí que sorrio pelo re-encontrar da perdida e esquecida fórmula simples que me resolve e nos devolve o mistério do sentido da vida. É aí que num êxtase de Apocalipes me sinto solidário com o devir ao ser humano e com a sua teimosa constância na transição eternamente mitigada do corpóreo ao espiritual. É aí, enfim, que me dispo da multiplicidade da consciência intrínseca aos seres vivos e aposto as nossas vidas na cumplicidade unilateral e universal entre os seres humanos.
O que de mim retorna a mim é um eu momentaneamente expurgado da contradição e tão abrangente que se assusta com o desapego à vida sentido pelo que de tão pequenino em si mesmo re-encontra nesse processo de retorno.
De repente... A enormidade da vida! Uma mão meiga que me afaga...Uns olhos penetrantes que me interrogam...Um sorriso tímido que em mim procura aprovação...Um abraço quente e terno que me devolve o sentido terreno...Um outro eu que se me oferece puro sem condições e com e com as suas contradições...Um mútuo "obrigado!" que nos confessa a ambos o desejo de eternidade...
Não, meu amor...Não era sonho nem desespero. Era só!, a minha maneira de te dizer que sou humano e que estas "viagens" retemperam em mim o gosto e o sentido de te amar.
Colocamos outro CD?
JR, in "Folhas Soltas", 11.Dez.00
O que seria a vida sem musica.
O que seria o enamoramento sem Vivaldi
Quais as razões de uma utópica felicidade, sem redondos acordes, pautados pelo génio do ser humano.
O re-tombola deve estar com o sorriso do gato que comeu o passarinho... Deixou a Joana afónica...
# : - ))
(M)arca Amarela em março 8, 2004 02:32 PM
Uma das razões que não respondi ao re-tombola foi porque achei que não tinha nada a dizer em especial. Pelo que escreveu, re-tombola denota que estudou música, enquanto eu só a oiço! E, na maioria dos casos, sem a atenção que ela merece.
Mas já que você se meteu de premeio, queria acrescentar o seguinte:
Acredito que me possa ter equivocado, mas apenas escrevi que Vivaldi foi o primeiro compositor sinfónico. ... surge o concerto para solista; a instrumentação e a orquestração ganham importância nunca alcançada
Ora o concerto é uma «composição tipo sinfonia ou sonata para orquestra e solista(s)», e Vivaldi compôs várias centenas de concertos.
Por outro lado, queiram pedir aos «Vivaldistas» que refaçam as denominações das obras de Vivaldi. Apenas entre os meus CDs tenho as seguintes sinfonias:
Sinfonia em Mi maior (E-dur) RV 132
Sinfonia em Mi menor (e-moll) RV 134
Sinfonia em Fá maior (F-dur) RV 137
Sinfonia em Fá maior (F-dur) RV 140
Sinfonia em Sol maior (G-dur) RV 146
Sinfonia em Sol maior RV 149
Sinfonia em Si menor (h-moll) RV 168
Sinfonia «Al Santo Sepolcro» RV 169
São todas peças curtas (menos de 10m), a 3 andamentos. Portanto o re-tombola tem razão quando afirma que as Sinfonias em Vivaldi ainda não atingiram a maturidade que iriam conseguir a partir de Haydn e Mozart. Aliás, algumas composições mudaram de designação entre concerto e sinfonia (como, por exemplo, a RV 134 e RV 140). Mas isso não invalida a importância da orquestração em Vivaldi, base da música sinfónica.
Aliás, no folheto que acompanha a edição ERATO das «19 Sinfonias and Concertos for Strings and Continuo» dos «I Solisti Veneti», o autor tem uma opinião quase idêntica à do re-tombola, mas reconhece que diversos autores acordaram uma importância histórica ao concerto para orquestra de Vivaldi, que consideraram um percursor da sinfonia clássica.
Quanto às óperas, o re-tombola tem muitas mais no arquivo dele que eu no meu. Eu apenas tenho 4 (em CD):
Catone in Utica
Montezuma
Tito Manlio
Juditha Triumphans
Todavia o número que avancei, de 95, li-o algures. Mas como se perderam mais de 80%, causa admiração como o re-tombola inventariou 46, o que demonstra o seu interesse e o estudo que tem realizado nesta matéria.
Afixado por: Joana em março 8, 2004 10:49 PMQuerida Joana
Sinto-me desvanecido com a atenção que me deu. Limitei-me a fazer um comentário lateral porque imaginei o re-tombola a rebolar-se de riso. Longe de mim tentar beliscar a sua sapiência. Tanto mais que também toco de ouvido, ou seja, a música para mim é mera fruição.
De Vivaldi ficou-me sempre a ideia de uma produção musical frenética. Curtos ou compridos, os seus quase 500 concertos não podem deixar de impressionar.
Mas já que acabei por acrescentar qualquer coisa, deixe-me corrigir um pequeno pormenor relativo às óperas. Esse número de 95 que afirma ter visto foi, provavelmente, uma gralha. Tanto quanto me lembro, Vivaldi escreveu exactamente 46. Tem é muitas árias dispersas.
E termino com uma sugestão: compre, logo que lhe seja possível, os três CDs de L'Olimpiade, editados em 2002. Se gosta de Vivaldi, não perca esta ópera.
Cara Joana,
Não foi intenção minha "repreendê-la" e muito menos colocar em causa a sua pesquisa sobre Vivaldi.
Limitei-me a acrescentar uns tópicos e a tentar corrigir outros. Afinal, a casa é sua mas as visitas habituaram-se a poder usufrui-la, não é verdade?
Como penitência, aqui lhe deixo mais um textito meu "embalado" pelas "coisas da música".
Um abraço
...........
Lavo os ouvidos e a alma com o Concerto para Violino e Orquestra (Fá menor /Op.64) de Mendelsson para conseguir a coragem de atacar e te dedicar os meandros do Concerto para Piano e Orquestra nrº 1 (Si Bemol Menor /Op.23) de Tchaikovsky.
Realmente, a tua surpresa foi magnifica. O teclado novo mas condescendente ao toque, os pedais que suavizam a minha impetuosidade permitindo-me abafar dos outros o que só a nós diz respeito, os martelos de madeira nobre por sobre os feltros verdes a fazer repercutir o cordame com a afinação doce e precisa...Tudo conjugado para que o bichano faça o arco de consolação e se delicie olhando pela janela a nesga do nosso rio sem que a magia do momento fique arranhada pela perenidade das desconstruções apressadas.
As tuas mãos nos meus ombros, a espiaram a evolução dos meus dedos no teclado, proporcionam-me o cromático que me falta para poder dar-te a real escala do que me invade na eterna luta entre os crescendos e os diminuendos.
Olhando-te através do reflexo que os vidros da janela me enviam, os teus olhos devolvem-me a certeza de que o momento é nosso e de que ficarão eternamente a pairar naquela sala muito para além da nossa momentânea passagem.
Páro a meio do Tchaikovsky, precisamente quando o meu diálogo com a orquestra parece em sintonia divina e uníssona: os violinos lutam com os contrabaixos pela primazia da tua presença e as trompas e as flautas inrompem em alertas de desassossego triunfal até que imponho, numa escala freneticamente decrescente e quase dissonante, a vontade crescente de eternização do nosso tema...
Sinto o tremer da tua incompreensão...Sem saber porquê, ou sabendo-o no interior do meu desejo, as minhas veias ganham a vida necessária para voltar a Mendelsson, vindo-me à memória das nossas mãos o Rondo Capriccioso em Mi Maior (Op.14).
O seu final, já por nós partilhado de memória e com os livros desarrumados pelo chão, é a confirmação de que a escolha daquele local e daquele piano foi ditada pelo conhecimento mútuo de que os pedacinhos que tentamos resguardar um do outro são o que nos une na nudez da alma.
JR - in "Folhas Soltas" (-- /--/--) :-)
re-tombola : o meu texto de resposta ao (M)arca Amarela indica claramente que a interpretação que eu faço do seu comentário coincide com o que você acaba de escrever. Mesmo a citação que faço do folheto que acompanha uma gravação que tenho vai no sentido da sua opinião, embora não infirme o que escrevi.
Portanto esteja à vontade e critique sempre que lhe aprouver. Eu aprecio bastante os seus comentários, críticos ou não: A bonis bona disce
Mas que isso não o impeça de se penitenciar. Tenho apreciado bastante as suas "penitências"
Este blog é muito variado: música, política, economia, finanças, história, bíblia, strip-tease, ambiente, má-língua, etc.
Tem poucos produtos expostos, mas todos diferentes
great page...im sure i'll come back...best regards
Afixado por: Kristopher Allyson em julho 15, 2004 05:58 PM