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junho 30, 2005

Waterloo a Prazo

Governo assinala 100 dias em funções hoje. Cem dias é uma data fatídica. Quatro dias antes do fim dos “Cem-dias” Napoleão teve o seu Waterloo. Cerca de 4 dias antes dos seus “Cem-dias”, Sócrates teve a trapalhada monumental do OR que tinha como missão (falhada) o “sanear” o “embuste do OE2005” encenado pela rábula do défice medido às centésimas.

Mas isto é apenas divagação. Os “Cem-dias” de Napoleão foram apenas 94 dias. Só seriam 100, se se começasse a contar a partir do dia em que Ney, enviado por Luís XVIII, se passou para o lado de Napoleão. E o Waterloo de Sócrates provocado pelo engano de Campos e Cunha (há 190 anos foi Grouchy quem se enganou), não foi suficientemente desastroso para exigir abdicação.

Outros Waterloos se seguirão: semanalmente haverá Waterloos no emprego do sector privado: milhares de trabalhadores, que julgavam ter “direitos adquiridos”, verão as empresas falirem ou irem-se embora. A única medida preconizada pelos sindicalistas é acusarem os empresários de não terem o sentido de responsabilidade. E continuarão a repetir esta ladainha até ao último empresário.

O governo não tem política. Ou melhor ... tem a “política dos pequenos passos” que não conduzem a nada. O desemprego vai aumentar progressivamente no nosso país. Sempre. O governo tem duas soluções possíveis: 1) diminui substancialmente o peso do sector público, aumentando o desemprego nesse sector, diminuindo a despesa, aliviando as empresas e as famílias e aumentando a competitividade da economia; 2) fica à espera de um milagre, enquanto o desemprego no sector privado se acelera, a recessão económica se torna numa bola de neve, e o país arrisca-se a pôr parte significativa do sector privado no desemprego e ser obrigado, depois, a pôr uma parte do sector público igualmente no desemprego, por insolvabilidade do Estado.

A solução 1) foi a utilizada pela Irlanda. Após um aumento enorme no desemprego, iniciou-se a retoma e hoje a Irlanda está no pleno emprego e é o 2º país mais rico da Europa. A solução 2) tem sido utilizada por alguns países, que continuam estagnados economicamente e com o desemprego a aumentar. Mas esses países têm uma vantagem sobre nós – têm uma mão de obra altamente qualificada. Estão estagnados, mas com a relativa prosperidade que tinham à partida, embora esta situação não se possa considerar como adquirida. Nós ficaremos estagnados na miséria. Será um Waterloo a prazo e em episódios de Soap Opera, cada vez mais deprimentes.

Mas também teremos Waterloos na justiça. O país caminha para o fim do Estado de Direito pela inépcia da justiça. O Estado está a deixar de exercer as funções de garante da ordem, da legalidade, do respeito pela propriedade e pelo cumprimento das obrigações contratuais. O país está a transformar-se numa imensa floresta de Sherwood onde todos são roubados (menos os muito ricos, que sabem como resguardar os seus activos).

Continuaremos com o Waterloo da Saúde e com o Waterloo lento, mas exterminador, da educação.

Passados 90 dias, os mesmos que Napoleão, Sócrates encontrou portanto o seu Waterloo. Só que não durou um dia. É um Waterloo a prazo, de desgaste continuo, sem gritos heróicos da “Guarda morre, mas não se rende”, mas com a “palavra de Cambronne” milhares de vezes repetida nos próximos meses ou anos.

Publicado por Joana às junho 30, 2005 12:05 AM

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Comentários

Waterloo foi uma derrota, essencialmente porque choveu torrencialmente na véspera da Batalha. Em Portugal não chove desde o princípio do ano e além disso as Forças Armadas já não passam dos pungentes «praças» de uma Armada de água doce, em silêncio defronte da AR.

Publicado por: asdrubal às junho 30, 2005 01:00 AM

Também actualmente já não é possível fazer pronunciamentos militares. Nem que os despedissem todos.

Publicado por: Rave às junho 30, 2005 01:30 AM

C.Q.F.D.

Publicado por: asdrubal às junho 30, 2005 02:18 AM

De facto é um mu precedente. O Governo não devia festejar este dia, para não lembrar coisas tristes.

Publicado por: Cerejo às junho 30, 2005 09:40 AM

Sejamos mais positivos... Ontem vi uns minutos da "Quadratura do Círculo", e Jorge Coelho teve um deslize, quando deu a entender que mais medidas viriam aí. A minha leitura é que as medidas a sério só serão tomadas depois das eleições autárquicas.

Publicado por: Mário às junho 30, 2005 10:17 AM

Fala-se que o governo vai anunciar medidas de grandes investimentos públicos, para encher o olho

Publicado por: Sa Chico às junho 30, 2005 10:52 AM

É claro que são mais despesa pública. Devem ser é do género: fazer agora e pagar depois.

Publicado por: Sa Chico às junho 30, 2005 10:53 AM

Mário: O problema do governo é que não tem tempo. Todos os dias aumenta o desemprego. Cada dia que passa as nossas empresas são menos competitivas. O governo pode adiar medidas mais complicadas, mas todos os dias se vêem os sinais negativos das não-medidas

Publicado por: Hector às junho 30, 2005 10:56 AM

Espero que alguns meses não façam a diferença entre uma revitalização e o colapso total...

E espero que as medidas socialistas são o sejam. Ou seja, que não se trate de mais investimento público para tentar relançar a economia.

Publicado por: Mário às junho 30, 2005 11:10 AM

Estou de acordo com o Mário. O governo vai tentar adiar as medidas mais duras até às autárquicas para limitar os estragos que já foram provocados pelas suas contradições entre as promessas eleitorais e a sua praxis corrente. Evidentemente que muito estará dependente da capacidade do PS no damage control nas eleições locais, bem como dos resultados das presidenciais.

Caso contrário, vejo Cavaco a perfilar-se como mentor de um governo de 'salvação nacional' de inspiração presidencial, após uma reedição do discurso do pântano por Sócrates. Vejamos como vão ser as próximas eleições antes de nos deitarmos a adivinhar o futuro...

Publicado por: Pedro Oliveira às junho 30, 2005 11:32 AM

"O desemprego vai aumentar progressivamente no nosso país. Sempre. O governo tem duas soluções possíveis:"

Tem uma terceira que já foi ensaiada no tempo do Ferro Rodrigues/Paulo Pedroso: aldrabar a contagem dos desempregados. Espero que o Socrates não chegue a tanto, mas não esperem medidas para depois das autarquicas, porque de seguida vem as presenciais, e depois voltam as legislativas e depois vem sempre qualquer coisa.

Publicado por: Joao P às junho 30, 2005 11:52 AM

Faltam poucos meses para as autárquicas. Por isso talvez o aumento do desemprego não cause tantos danos à imagem do governo, como aconteceria se o prazo fosse maior.

Publicado por: rudy às junho 30, 2005 12:04 PM

A Joana critica o governo por ter uma política de pequenos passos que não conduzem a nada. Mas deveria reconhecer que os governos anteriores, da maioria de direita, nem sequer pequenos passos deram. O governo deu, até agora, pequenos passos no sentido correto: eliminação de alguns privilégios que existiam à custa do orçamento de Estado. Falta dar, certamente, alguns grandes passos, que não sabemos se este governo irá alguma vez dar, ou não. Mas uma coisa é certa: os governos PSD-CDS nem sequer os pequenos passos deram.

Parece-me que a Joana utiliza com este governo uma bitola crítica mais severa do que aquela que utilizou com o governo PSD-CDS.

Publicado por: Luís Lavoura às junho 30, 2005 12:04 PM

A Joana deveria também comparar a situação eleitoral do presente governo, que desde o seu princípio teve pela frente umas eleições autárquicas e (menos importante) uma eleição presidencial, com as perspetivas eleitorais dos governos PSD-CDS, os quais não tinham quaisquer eleições no seu horizonte imediato, e que, apesar disso, se caraterizaram pela total inoperância. Descontando o discurso da tanga e o congelamento de salários e admissões na função pública, os quais não são passos em sentido nenhum, os governos PSD-CDS não fizeram absolutamente nada para corrigir aquilo que estruturalmente está mal no orçamento de Estado português. E isto quando não tinham no horizonte nenhumas eleições autárquicas, com a consequente necessidade de dar de comer às suas clientelas partidárias locais.

Publicado por: Luís Lavoura às junho 30, 2005 12:11 PM

Independenttemente de opções partidárias, é normal que à medida que o tempo passa e a crise se agrava, as pessoas se tornem mais impacientes.

Publicado por: Ricardo às junho 30, 2005 12:13 PM

Oos governos PSD-CDS, "não tinham quaisquer eleições no seu horizonte imediato", mas tinham um PR que vetava a maioria dos diplomas e depois, com o PSL, teve um PR que lhe ameaçava tirar o tapete debaixo dos pés todos os dias.

Publicado por: Ricardo às junho 30, 2005 12:15 PM

Quer o PSD quer o CDS não são muito diferente do actual PS económicamente. Bagão Felix é um exemplo de alguém que acredita que a intervenção do estado faz crescer a economia sustentadamente. As veleidades de Durão conseguir cortar na despesa acabaram quando não conseguiram fazer nada da RTP/TV2. A vontade também não era muita diga-se. Ferreira Leite fez aquilo que é a sua natureza, já verificado quando esteve á frente do M. Educação: corta umas pontas soltas, afina a máquina mas é incapaz de modificá-la estruturalmente.

Publicado por: lucklucky às junho 30, 2005 01:02 PM

Luís Lavoura às junho 30, 2005 12:11 PM: Para além daquilo que o Ricardo escreveu que, na generalidade concordo, sucede que os membros deste governo (pelo menos o seu chefe e a maioria do elenco), quando na oposição, moveram uma luta feroz às medidas tímidas e insuficientes que os governos PSD/PP tomaram ou tentararm tomar. Ora a situação económica e financeira na altura era semelhante à actual e só não via quem não queria, ou quem era incompetente.
Em segundo lugar mentiram descaradamente em campanha eleitoral e depois encenaram uma rábula gigantesca para tomarem medidas às quais sempre se tinham oposto e haviam prometido não tomar.

Finalmente porque estão a tentar mascarar a crise financeira através de aumento de impostos, o que prejudica a economia (e o bolso de todos nós) e não resolve a situação.

Publicado por: Joana às junho 30, 2005 01:29 PM

O Governo, reunido hoje em Conselho de Ministros extraordinário, no dia em que passam cem dias desde a entrada em funções, aprovou um pacote de 25 mil milhões de euros de investimentos publico-privados em infra-estruturas prioritárias, disse o ministro Pedro Silva Pereira.
Parece ser uma manobra de anestesia. Quem paga isto?

Publicado por: Ramiro às junho 30, 2005 04:37 PM

Nas sedes dos empreiteiros devem estar a abrir garrafas de champanhe

Publicado por: c seixas às junho 30, 2005 05:02 PM

25,000 milhões de euros? Público-privados? Só pode ser anedota, a menos que seja o plano de investimento públicos para os próximos 10 anos (e mesmo assim são 2.5% do PIB por ano). Cá para mim é (mais) uma tentativa de atirar areia para os olhos.

Publicado por: Pedro Oliveira às junho 30, 2005 05:12 PM

Mais uma medida de impacto: Salão Internacional Erótico de Lisboa arranca hoje!
Os bilhetes é que são caros: 20€ (Mais uma medida para atingir a classe média)

Publicado por: Coruja às junho 30, 2005 05:23 PM

Segundo o ministro da Economia, "45% dos projectos visam aumentar o potencial de crescimento económico, 26% a coesão social e a qualidade de vida, 19% melhorar o ordenamento do território e 10% promover a investigação e o conhecimento".
Portanto, pelo menos 55% são financiamento público.
Os primeiros 45% também devem ser, em parte, públicos.
Muitos serão comparticipados pela UE.

Publicado por: David às junho 30, 2005 05:29 PM

25,000 milhões de euros são aproximadamente 25% do PIB. Mesmo em 10 anos, representam anualmente 2,5%. De onde é que vem esse dinheiro? Mesmo que sejam projectos comparticipados pela UE, a taxa deve ser de cerca de 60%. Continua a representar mais de 1% do PIB anualmente.

A Comissão Europeia vai ficar deliciada... É só juntar à conta desses 'investimentos' a multa de 1% do PIB que Portugal vai sofrer...

Publicado por: Pedro Oliveira às junho 30, 2005 05:54 PM

Publicado por: Pedro Oliveira às junho 30, 2005 05:54 PM

No se passa nada!
É só um anúmcio, igual por exemplo ao do TGV ou da futura central nuclear.
Quando cheguei a Portugal em 74 anunciava-se a remodelação da Praça de Espanha...
Ontem, hoje e amanhã tudo igual.

Publicado por: carlos alberto às junho 30, 2005 06:23 PM

Pedro Oliveira em junho 30, 2005 05:54 PM:
Nos 2 primeiros anos apenas gastam dinheiro em estudos e pareceres. Depois, se o governo ainda estiver, logo se vê.

Publicado por: Hector às junho 30, 2005 06:49 PM

O TGV já anda a ser estudado há uns 6 anos. Fizeram-se concursos públicos e foram adjudicados estudos a consórcios internacionais.
Nunca aconteceu nada.
Quando o Mário Lino entrou, foi como se começasse tudo de novo.

Publicado por: Hector às junho 30, 2005 06:51 PM

Hector: As empresas de consultoria vivem de governos indecisos.

Publicado por: L M às junho 30, 2005 10:38 PM

Hector às junho 30, 2005 06:51 PM: Deve ter sido gasto muito dinheiro nesses estudos. Estive envolvida num concurso, julgo que há 4 anos, lançado pela RAVE, mas no qual a entrega das propostas era em Madrid e cujos chefes de fila dos consórcios na corrida eram espanhóis (nós não temos know-how do TGV - linha)

Publicado por: Joana às julho 1, 2005 12:01 AM

Isto é preocupante:
Do Diário de Notícias

Os bancos HVB e UBS aconselham os investidores a venderam as Obrigações do Tesouro (OT) portuguesas que possuem.
As taxas de juro de mercado não estão a reflectir a deterioração do risco de crédito do país, dizem os analistas do HVB. "As obrigações portuguesas estão sobrevalorizadas", num momento em que "Portugal enfrenta grandes desafios", afirma Kornelius Purps, analista do HVB, citado pela Lusa. Uma posição partilhada também pelos analistas da UBS "as OT estão excessivamente caras face ao seu risco de crédito."
Segundo o HVB, o diferencial das yields da dívida pública portuguesa face à referência alemã poderá quase que duplicar no próximo mês. O spread (custo de financiamento) das obrigações portu- guesas face às alemãs deverá aumentar dos actuais 8 pontos- -base para 15 pontos-base.

Publicado por: Rui Sá às julho 1, 2005 12:20 AM

Este anúncio das medidas criou grande entusiasmo entre empreiteiros. A Mota-Engil, p.ex.

Publicado por: Ramiro às julho 1, 2005 06:07 PM

Rui Sá em julho 1, 2005 12:20 AM:
Mas o governo prepara-se para emitir mais OT. Será que não leram isso?

Publicado por: Ramiro às julho 1, 2005 06:12 PM

Este texto está a revelar-se profético. Infelizmente

Publicado por: Lima às julho 17, 2005 04:35 PM

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