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fevereiro 14, 2005

Quatro Casamentos e um Funeral

Transcrito dos Jaquinzinhos com a devida vénia

O António afiançara à Maria que a vida seria um mar de rosas e cheia de prosperidade. O casamento foi feliz e despreocupado. O António era um gastador compulsivo mas a Maria não queria saber nada dessas coisas de dinheiro. "A família não são números", proclamava o António a quem lhe chamava a atenção para os excessos. O que interessava era a qualidade de vida, as grandes festas e as aparências.

Quando um dia, repentinamente, o António fugiu de casa deixando apenas as prestações das dívidas por pagar, a Maria entrou em desespero. Estava de tanga. Atemorizada, casou com o Zé Manel, depois de um curto namoro. Afinal, o Zé Manel parecia ser bem mais ajuízado que o António e talvez trouxesse alguma ordem às finanças lá da casa.

Os rapazes sentiram logo algumas diferenças. As semanadas foram congeladas, o Zé Manel não lhes dava dinheiro para o autocarro e o discurso mudara: "Temos que poupar, não podemos gastar o que não temos", dizia o Zé Manel. Mas aquilo era só da boca para fora. Os costumes da família estavam bem enraízados e, no essencial, tudo continuou como no tempo do António.

Apesar das dívidas cada vez maiores, não se cortava na cozinha, nem nas férias, nem nas contas da água, da luz ou do telefone. Nunca se dizia que não a um livro, a um disco ou a uma ida ao cinema. Não se mexia em direitos adquiridos. Por vezes o gerente da Caixa telefonava, inquietado com o saldo do cartão de crédito. E de vez em quando vendiam algumas jóias antigas para acalmar os credores.

Até que um dia o Zé Manel anunciou que se ia embora. Arranjara um emprego no estrangeiro, muito bem pago. E disse à Maria: "Não te preocupes, eu vou-me embora mas arranjei-te marido novo. Casas-te com o Pedro. Ele cuida de ti."

A Maria assim fez mas o enlace durou pouco. O Pedro era um bocado estouvado e tinha alguns amigos pouco recomendáveis. O pai da Maria não gostava dele nem um bocadinho e fez-lhe a vida negra. E um dia, o Pedro chegou a casa e descobriu que tinha a mala nas escadas.

Agora a Maria vai casar com o José. Foi o pai dela que arranjou o casamento. O José faz-lhe lembrar o António, de quem era muito amigo. O José propõe-se gerir as finanças familiares de outra maneira. Quando a Maria lhe pergunta como é que ele vai fazer ele explica: "É fácil, o objectivo é sermos felizes."

O José já prometeu que as semanadas das crianças vão ser aumentadas, porque é uma vergonha que os nossos filhos tenham menos dinheiro que os filhos dos outros. Vai comprar um computador lá para casa e ligá-lo à Internet, em banda larga. Vai haver telemóveis para todos. "É um choque tecnológico", explica ele. E promete à Maria, que continua a ser a única a trabalhar lá em casa, que não vai precisar de lhe dar nem mais um tostão. O José vai gerir a casa com o que tem. E daqui para a frente, quem paga o café e os cigarros é ele. Essa mania do consumidor-pagador já era.

Soa a banha da cobra mas a Maria quer marido e os bons pretendentes não aparecem. A família da Maria gosta do José. Parece que vem aí um tempo novo e os rapazes já estão fartos de más notícias. O José é recebido lá em casa de braços abertos.

As más surpresas vão começar a chegar lá para o fim da Primavera. E um dia, alguém vai reparar que o título desta história é "Quatro Casamentos e Um Funeral".


Nota: Este “conto” foi transcrito também no Público de hoje. É interessante que um jornal de referência, para ter opiniões alternativas se tenha que socorrer de um ou outro colunista e da blogosfera.

Publicado por Joana às fevereiro 14, 2005 02:58 PM

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Comentários

E teve toda a razão em o transcrever. Como romance da nossa desdita, está óptimo

Publicado por: Diana às fevereiro 14, 2005 03:12 PM

O triste é que a Maria não sai do buraco, acredita em tudo e tem pai que é cego ( ou finge de cego)

Publicado por: Diana às fevereiro 14, 2005 03:15 PM

O triste é que a Maria não sai do buraco, acredita em tudo e tem pai que é cego ( ou finge de cego)

Publicado por: Diana às fevereiro 14, 2005 03:19 PM

Como história para miúdos, e para apagar consciências, assim se deve ler!
Como, os arautos da "desgraça" que vem aí, não sabem o que hão-de fazer perante a incompetência que grassa nas suas hostes, perante o descalabro em que colocaram o nosso país, dizendo durante todo este tempo de desgovernação, que a culpa era dos outros...os tais que na altura devida foram a votos e perderam (o povo já os castigou)!
Agora vão-se entretendo a vender ao povo a história do papão.
Não vem mal ao mundo que o governo democraticamente eleito seja outro, desde que escolhido pelo povo!
Esperem pelo seu veredicto, respeitem-no!
Portugal não vai acabar, garantido...
Tenham todos juízo, e não façam do povo parvo!

Publicado por: E.Oliveira às fevereiro 14, 2005 03:44 PM

Então só a esquerda têm o direito de fazer o povo parvo?

Publicado por: Mário às fevereiro 14, 2005 03:47 PM

Custa a ler certas coisas, não é?

Publicado por: siroco às fevereiro 14, 2005 03:48 PM

Este blog é giro. Aqui coabitamos e mandamos palpites. Todos contra todos.
Há 30 anos que andamos num permanenete baile mandado
Ora agora governas tu (PS)... ora agora governo eu (PSD)... Ora agora governas tu (PS)... Governas tu mais eu (PS+CDS ou PSD+CDS)
O país é esta m... para onde nos conduziram. Sem liderança, sem projectos, sem alma!
Os empresários recebem subsídios para acabarem com a produção e comprarem Ferraris e Bentleys.
Todos procuram rendas e mais valias a curto prazo.
Portagens para uns...SCUTs para outros. Uns, os valentes, os da Invicta têm 10 pontes não pagam portagem em nenhuma. Os outros..os "mouros" têm duas pontes, pagam portagem há 40 anos.
Regiões para uns...distritos para outros. Áreas Metropolitanas para não se sabe bem quem.
Mas neste blogue, e em muitos outros blogues que por aí abundam, discutimos o Sexo dos Anjos.
Serramos presunto e papamos as aparas
Paz ás vossas almas que dos corpos já nada se espera!

Publicado por: e às fevereiro 14, 2005 03:49 PM

Excelente história :) Pena é que alguns não saibam ler...

Publicado por: Orlando às fevereiro 14, 2005 04:21 PM

Afixado por: e em fevereiro 14, 2005 03:49 PM

Certamente não tem lido este blog...

Publicado por: Mário às fevereiro 14, 2005 04:27 PM

Ora aí está o que eu já tinha dito há dias: o Público SUBIU à blogosfera e transcreveu um artigo que lá achou.
:-))

Publicado por: Senaqueribe às fevereiro 14, 2005 04:37 PM

E nem uma palavrinha sobre o Aníbal, que levou a Maria e os miúdos a uma Exposição Universal?

Publicado por: Luís Lavoura às fevereiro 14, 2005 04:38 PM

Ora aí está o que eu já tinha dito há dias: o Público SUBIU à blogosfera e transcreveu um artigo que lá achou.
:-))

Publicado por: Senaqueribe às fevereiro 14, 2005 04:40 PM

E o Aníbal o que fazia com a Maria?
Era amigo, pai, padrasto, ou amante?
Bem, que a lixou pelo menos com o mamarracho do Centro Cultural de Belém, ninguém tem dúvidas!
Ah mentes esquecidas...

Publicado por: locas às fevereiro 14, 2005 04:55 PM

O Aníbal devia ser o marido autoritário que contava os tostões o que a levou ao divórcio.

Publicado por: Rave às fevereiro 14, 2005 04:59 PM

Tantos maridos para "ajudarem" a Maria.

Só o José é que vem lixar tudo.

Ó Joana acha que alguém acredita nesta história tipo Carochinha?

A Joana acha que o povo Português é parvo?

A direita tem uma grande mania, acha que quem não vota nela (direita) são parvos, anormais, são considerados "gente menor".

Você não sabe, mas eu fui criado, vivi e vivo naquilo que se pode considerar "berço de ouro" recebi na educação, princípios objectivos quanto a valores, sou, além de esquerda, democrata, não recebo nem peço lições a pessoas que desdenham das maiorias.

Publicado por: Gato Fedorento às fevereiro 14, 2005 05:14 PM

"É interessante que um jornal de referência, para ter opiniões alternativas se tenha que socorrer de um ou outro colunista e da blogosfera."

A gentileza acima de tudo... ou como é com pena que a vejo subjugada por ela...

Publicado por: incredulo às fevereiro 14, 2005 05:27 PM

Gato Fedorento:
Eu julgava que era o Louçã que achava que quem não vota nela (esquerda) são parvos, anormais, são considerados "gente menor".
Pelo menos é isso que ele e os dele andam sempre a dizer

Publicado por: Coruja às fevereiro 14, 2005 05:32 PM

E o Aníbal o que fazia com a Maria?
Era amigo, pai, padrasto, ou amante?
Bem, que a lixou pelo menos com o mamarracho do Centro Cultural de Belém, ninguém tem dúvidas!
Ah mentes esquecidas...

Publicado por: locas às fevereiro 14, 2005 05:37 PM

Coruja em fevereiro 14, 2005 05:32 PM

Coruja, com todo o respeito que todos me merecem, deixe-me dizer-lhe, você anda distraída, não vive neste planeta e Portugal deve ser, para si, uma outra coisa menos o nosso pais, nunca ouviu da boca de Louça um comentário que possa ir nesse sentido, mas como eu já lhe disse uma vez, a televisão é....... e agora aplica-se a outro dos sentidos o ouvir.

Publicado por: Gato Fedorento às fevereiro 14, 2005 05:43 PM

Este locas parece um disco partido

Publicado por: Coruja às fevereiro 14, 2005 05:44 PM

Este locas parece um disco partido

Publicado por: Coruja às fevereiro 14, 2005 05:45 PM

Lamento que a Joana utilize o nick Coruja para lançar "bocas foleiras" deste tipo.

Joana, assine e deixe-se de tretas.

Publicado por: Gato Fedorento às fevereiro 14, 2005 05:49 PM

incredulo em fevereiro 14, 2005 05:27 PM:
Aquela minha frase é uma crítica e não um elogio.
E atenção que já tenho feito aqui elogios a um ou outro artigo do Público. Poucas vezes ... hélas

Publicado por: Joana às fevereiro 14, 2005 08:02 PM

Joana em fevereiro 14, 2005 08:02 PM

Isso é uma fase superior de luta... ter de explicar os comentários aos seguidores...

# : - ))

O que é certo é que não abona muito a favor da inteligência do coro

Publicado por: Anonymous às fevereiro 14, 2005 08:47 PM

Eu sou Coruja macho e não fêmea. E se você, seu jarreta marreta tem alguma coisa a objectar-me meta-se comigo e deixe os outros.

Publicado por: Coruja às fevereiro 14, 2005 08:52 PM

corujo

s. m.,
o macho da coruja.

enquanto assinar coruja, para mim será sempre uma corujinha linda !

Publicado por: Templário às fevereiro 14, 2005 09:46 PM

Vai haver telemóveis para todos. "É um choque tecnológico",

O filho mais velho, agora com 18 anos, passa o dia ligado à internet, fala com amigos, descobre news groups, e como o dinheiro da mesada já não é nada para quem tem 18 anos, começa a pesquisar oportunidades de emprego/negócio.

Heureca !!! Grita uma noite !

Passados 3 dias, chega a casa com um contrato assinado com uma firma Espanhola, que lhe pagou um milhão de dólares pela sua nova ideia, de venda de toques de télélés.

Maria exclama por fim - Sempre achei que os investimentos deveriam trazer grandes lucros !!!

Publicado por: Templário às fevereiro 14, 2005 10:05 PM

Depois do encaixe deste pequeno negócio, Maria depede-se do emprego em que era bem explorada há 20 anos, e vai para secretária do filho. Expandem o negócio e já tem 25 jovens a trabalharem no novo projecto Tecnológico, pois os Austríacos e Suíços estão muito interessados no software anti-virus para telemóveis !

Maria anda agora de mercedes e para falar com ela, é preciso marcação de 1 semana de antecedência.

Publicado por: Templário às fevereiro 14, 2005 10:11 PM

Templário em fevereiro 14, 2005 10:05 PM

E assim a Maria pode comprar para a "casa" mais cortinados, mobilias,electrodomésticos e outras coisas que lhe vão simplificar a vida.

ehehehehehe !

Publicado por: Gatos Fedorentos às fevereiro 14, 2005 10:14 PM

Economistas, advogados, não entendem estas coisas das novas tecnologias, um só vê números e conceitos patéticos, outro só vê leis para complicar a vida aos do choque tecnológico

Publicado por: Gato Fedorento às fevereiro 14, 2005 10:19 PM

A diferença da histórinha da joana e da minha, é que na dela, só há lugar para escravos e para uma dúzia de iluminados, na minha todos tem ao seu alcance a possibilidade de...saberem utilizarem o seu conhecimento, mas para tal foi necessário investir nas novas tecnologias !!!

Publicado por: Templário às fevereiro 14, 2005 10:19 PM

Joana: Dá-me ideia que, no seu blog, a má moeda está a expulsar a boa. Pense nisso.
Leio a sua caixa de comentário e o cretinismo é prevalecente

Publicado por: L M às fevereiro 15, 2005 12:00 AM

Esta história é certeira. Talvez por isso tenha despertado tanto mal estar.

Publicado por: Ant Curzio às fevereiro 15, 2005 12:48 AM

Joana em fevereiro 14, 2005 08:02 PM

É claro que eu entendi que a sua frase era uma critica... e será que a Joana entendeu a minha? Bons tempos em que nos entendiamos apenas por meias palavras...

Publicado por: incredulo às fevereiro 15, 2005 01:07 AM

Excelente post. Boa ideia transcrevê-lo

Publicado por: Vet às fevereiro 15, 2005 02:03 PM

incredulo em fevereiro 15, 2005 01:07 AM:
Você aparece tão pouco que eu ... destreinei-me ...

Publicado por: Joana às fevereiro 15, 2005 02:04 PM

Que conto giro!

Publicado por: sininho às fevereiro 15, 2005 10:54 PM

O funeral ainda não é para já. Talvez mais um ano!

Publicado por: Arroyo às fevereiro 19, 2005 09:01 PM

Ainal eram sim 2 funerais... vão pró alto S. João os féretros politicos do dr. Portas e do Dr. Santana.

Publicado por: Templário às fevereiro 23, 2005 02:10 AM

Últimas: Sócrates foi indigitado para organizar o funeral.

Publicado por: Coruja às fevereiro 24, 2005 01:36 PM

Vai ser em marcha lenta. Primeiro vai escolher os coveiros e quem carrega o féretro.

Publicado por: Coruja às fevereiro 24, 2005 01:38 PM

O que a Joana não diz, como outros recordaram, é onde está o Aníbal que durante dez anos não fez nada pela sua Maria. A história da Joana só começa no António e não é no Oliveira. Não acha que as "direitas" por esse mundo fora deixam muito a desejar, mais que as "esquerdas". As direitas dizem: Maria conseguimos esta casinha a roubar, a herdar ou a explorar e ninguém a tira, os vizinhos? Quem são? Rouba-os, ou mata-os, ou engana-os e não te esqueças da chave do carro...

Publicado por: Simão às maio 24, 2005 08:33 PM

Coitada da Maria. O Anibal, de quem ela gostava ou pelo menos muito apreciava ser por ele conduzida (acreditava mesmo que ele nunca se enganava e raramente tinha dúvidas), pediu o divórcio por causa de uma paixoneta que ainda hoje, dez anos depois, ainda não concretizou mas que o continua a consomir. O António e o José Manuel, tanto um como o outro abandonaram-na repentinamente, quando ela menos esperava e fizeram-se à vida nas estranjas, onde se encontram bem instalados e nem se querem lembrar que existiu na vida deles uma Maria. Com o Pedro teve a Maria uma ligação estranha: obrigada pelo pai a conviver com ele, não constituiu isso nenhum sacrifício para si. De facto o José Manuel, antes de se fazer à estrada a tentar a sua sorte nas Europas, falou com o pai da Maria e disse-lhe que o Pedro sempre aspirara a casar com a Maria, que chegara até a dizer publicamente que "estava escrito nas estrelas que havia de casar com a Maria, só não sabia quando", que ele, José Manuel, partia com a convicção de que, para a Maria ser feliz, só com o Pedro. O pai da Maria, usando de má fé, disse que sim, deixou que o Pedro fosse "ficando" e as pessoas até pensavam que a Maria tinha casado com o Pedro. Mas não. O pai da Maria estava só à espera que um filho do António, o José, se emancipasse e logo que isso sucegeu foi quando pôs as malas do Pedro ao fundo da escada e lhe disse que não havia casamento nenhum e ele não ia mais ficar ali. E lá se fez um casamento de "estadão" do José com a Maria. É facto que o José entrou neste casamento dizendo repetidamente à Maria que não lhe fazia promessas: apenas lhe definia objectivos. Sabemos que a Maria se habituou a não cozinhar em casa e a ter uma vida sexual muito activa. Será que o José, que nada lhe prometeu, vai sacrificar-se por ela?

Publicado por: JM às maio 27, 2005 05:10 PM

consomir = consumir

Publicado por: JM às maio 27, 2005 05:12 PM

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