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janeiro 06, 2005

Os Reis Magos

Um Remake em Technicolor

Os Reis Magos e a estrela que os teria guiado constituem questões que têm intrigado a humanidade, os investigadores e os viciados no Google, há cerca de 2 milénios. Quem eram os Reis Magos? Donde vinham? Como vinham? Porque vinham? Ao que vinham? Qual o significado da estrela? Seria mesmo uma estrela? Ou um cometa?

Mateus, um talentoso argumentista da Judeia, escreveu que: “eis que vieram do oriente a Jerusalém uns magos que perguntavam: Onde está aquele que é nascido rei dos judeus? pois do oriente vimos a sua estrela e viemos adorá-lo”, mas esta narração nunca foi considerada suficiente. Milhares de investigadores tentaram aclarar esta questão, mas falharam sempre.

Uma investigação deste tipo tem que assentar no estabelecimento de cenários e sua validação. Foi esta a tarefa que me propus. Comecemos pelo cenário tradicionalista, o mais conforme aos textos litúrgicos.

Neste primeiro cenário era elementar colocar a questão semântica. Um rei é, por definição, o poder executivo. Portanto, segundo este cenário, 3 chefes do poder executivo (naquela época remota, pois hoje seriam poder moderador ou, na Lusitânia, o poder dissolutor) com bagagens recheadas de ouro, incenso e mirra, viajaram, em conjunto, centenas de léguas, ao ritmo lento e bamboleante de camelos escorrendo uma baba peganhenta e fétida, sujeitos a incomodativos enjoos e ao sol inclemente do deserto, perseguindo uma estrela.

Analisemos este cenário e as hipóteses a que a sua validação obriga:

1 – É óbvio que, nos reinos daqueles reis, se tinha tornado realidade o desiderato “Santanista” de “um Rei, uma Maioria”, pois senão não haveria as indispensáveis autorizações dos respectivos poderes legislativos para os soberanos se ausentarem dos seus estados, ainda por cima, ajoujados ao peso de tantas preciosidades;

2 – Outra hipótese necessária é a de que seriam reinos sem défice orçamental nem défice de transacções com o exterior, pois de outra forma a opinião pública e os Bancos Centrais reagiriam mal à saída, para destino incerto, atrás de uma estrela, ou sabe-se lá de quê, de tantas e tão valiosas mercadorias, sem quaisquer contrapartidas nem garantias bancárias.

3 – Há um facto surpreendente: os reis deslocavam-se sem escolta adequada. Os pastores, que aparecem no presépio, são obviamente figurantes locais, armados unicamente de cajados. Este dado obriga a formular ou a hipótese de um conflito institucional, todavia infirmada pela hipótese (1) ou, porventura mais verosímil, a hipótese de os Ministros da Defesa, eventualmente indicados por facções de menor expressão eleitoral, quisessem evidenciar o seu protagonismo político, não fornecendo acintosamente as escoltas. Ou, talvez, a ocorrência de um orçamento rectificativo, que transferindo verbas inscritas na rubrica “forragens dos muares das quadrigas de assalto”, para a rubrica “aquisição de ouro, incenso e mirra”, impedisse encontrar cabimento orçamental para custear a escolta.

4 – Mas o que definitivamente invalida este cenário é a inexistência de jornalistas embedded na caravana régia. Nem sequer jornalistas perdidos na imensidão do deserto, segundo os usos de um país do extremo ocidente europeu, sucessivamente saqueados por Moabitas, Amalecitas, Amonitas, Madianitas, Amorreus, Filisteus e arrumadores de camelos.

Portanto, apenas quatro hipóteses absurdas sustentariam este cenário: “um Rei, uma Maioria”; ausência de défice orçamental e de défice de transacções com o exterior; ausência de escolta; ausência de jornalistas embedded ou apenas transviados, etc.

Aliás, este cenário apenas foi esboçado por Mateus, muitas décadas depois, quando a memória e as faculdades do piedoso apóstolo já escasseavam.

Sendo assim demonstra-se que o episódio dos Reis Magos, vindos do oriente, orientados por uma estrela, não tem poder explicativo na sua formulação tradicional. Impõe-se a formulação de um novo cenário, com fundamentação mais científica, o Cenário Neo-liberal, por muito que custe aos defensores dos sistemas estatizantes.

Assim, a minha investigação, sempre escrupulosa, baseada numa hermenêutica rigorosa e numa heurística documental precisa, buscou um novo cenário, mais sustentável e inovador.

A primeira observação é a que a palavra rei não é indissociável da soberania de um Estado. É usada habitualmente para designar especialistas numa dada disciplina ou actividade, como por exemplo: Rei dos Livros (cujo território se cinge a um espaço exíguo na Baixa lisboeta; rei dos caloteiros (título de tal forma banalizado que permitiu a concessão da realeza a uma percentagem significativa da população portuguesa, e ao próprio Estado); o rei dos analistas políticos (J A Saraiva, na opinião dele próprio, ou Marcelo de Sousa, o Velhaco Genial, na opinião dos restantes); o rei dos gaffeurs (o ministro Morais Sarmento) “o Rei” tout court (Elvis Presley); etc..

Portanto, subtraí-me ao erro fatal de que foi vítima Mateus, na sua senectude, e todos os seus exegetas, inclusivamente Bach. Retenhamos esta primeira conclusão: rei é apenas uma pessoa com relevo numa determinada disciplina.

A segunda observação, também igualmente pertinente, resulta da resposta à pergunta: Porque é que aqueles veneráveis anciãos abandonaram as suas terras, o seu conforto familiar, obcecados por um sinal que interpretaram como uma estrela e seguiram esse sinal, léguas a fio, empoleirados em incómodas e enjoativas corcovas de camelos?

Diz-se que estavam obcecados por um sinal, pela luminosidade de uma estrela. Cinjamo-nos aos factos despidos da retórica: os “reis magos” tomaram uma sequência de decisões em face de sinais, ou de um sinal que ia variando no tempo.

Julgo que as mentes mais astutas, que me acompanharam nesta dedução rigorosa já se aperceberam que chegámos ao âmago da questão. A solução está ao virar da esquina ou, no caso em apreço, ao virar da duna. Qual é a actividade humana em que os seus especialistas tomam as decisões mais inexplicáveis, demandam os locais mais inverosímeis, têm as condutas mais excêntricas em face de sinais que só eles percepcionam e só eles julgam entender?

Quem são esses especialistas? Que sinais são aqueles que tanto os excitaram?

As respostas são doravante simples e elementares:

Quem são esses especialistas? – Economistas;

Que sinais são aqueles que tomaram como uma estrela? – Os sinais do mercado;

Porque levaram tantas preciosidades? Porque as decisões de investimento são tomadas em face dos sinais do mercado e, naquela época, em que a moeda escritural ainda não tinha curso, os cartões de crédito nem sequer miragens eram no deserto dos Nabateus, a forma de se andar prevenido para investir na altura precisa era trazer permanentemente à arreata uma cáfila de camelos ajoujados ao peso de um sólido carregamento de ouro, incenso e mirra.

Porque é que Mateus errou? Mateus, que tinha o apelido de Levi, era colector de impostos. É óbvio que ninguém confia num colector de impostos. Principalmente quando se transporta um carregamento de mercadorias preciosas, sem guias de transporte, sem referência ao IVA, na mais absoluta e delituosa evasão fiscal. A Mateus foi contada uma história da carochinha em que ele acreditou piamente, segundo a declaração de liquidação que enviou aos publicanos (administração fiscal da época) e que depois foi incluída no seu evangelho. Já naquela época a administração fiscal se deixava embalar com balelas.

Os factos são claros e límpidos e não permitem outra explicação.

Que se passou depois? Aparentemente a Bolsa de Jerusalém teria encerrado com fortes perdas. O pessoal tinha-se endividado para comprar as prendas para festejar as Saturnalias e a bolsa estava sem liquidez. Herodes, o tetrarca, responsável pela gestão danosa que tinha levado a Bolsa à insolvência, os fariseus à ruína e os zelotas a vandalizarem a cidade, protestando contra a globalização, deu uma explicação esfarrapada aos “reis magos”, que acabaram num casebre de Belém, onde se desfizeram das mercadorias, desvalorizadas face ao crash da Bolsa de Jerusalém, trocadas ao desbarato por um suculento ensopado de borrego, acompanhado de leite de vaca ordenhado no momento.

Herodes aproveitou o crash bolsista, suspendeu o exercício das «call-option», ignorando a CMVM, utilizou as «golden share» detidas em todas as sociedades vítimas da recessão, e ficou com os activos de todas elas. Os pequenos aforradores, os inocentes, ficaram sem um obolo. Foi este episódio que, ficcionado por historiadores menos avisados, ficou conhecido pela “matança dos inocentes”

Por isso, no regresso, os Reis Magos fizeram um desvio para não voltarem a encontrar-se com Herodes, que havia arruinado a Judeia com uma política keynesiana, baseada no uso imoderado da despesa pública e, por via disso, desvalorizado as suas mercadorias.

Nunca mais tentaram interpretar sinais de mercado.

Este é o único cenário sustentável e com suficiente poder explicativo.

Semiramis Rubens_The Adoration of the Magi.jpg

Publicado por Joana às janeiro 6, 2005 01:05 PM

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Comentários

Muito rebuscado, monótono e sem interesse especial. Não é a tua especialidade.Podes apagar!

Publicado por: Átila às janeiro 6, 2005 12:26 AM

Tá sensacional! Imaginação fértil.

Publicado por: Rui Sá às janeiro 6, 2005 12:31 AM

Deve estar muito bom, para o Átila fazer-lhe o melhor elogio de que é capaz.

Publicado por: David às janeiro 6, 2005 12:37 AM

Não sei onde esta gaja quer chegar com esta história, mas tem alguma fisgada

Publicado por: Cisco Kid às janeiro 6, 2005 01:25 AM

Ó Davidoff (mais um segurança da Janica) há pessoas mais exigentes que outras. O teu caso insere-se nas "outras".

Publicado por: Átila às janeiro 6, 2005 01:38 AM

Ainda bem que temos o Átila para lutar conmtra esta escumalha da Direita

Publicado por: Cisco Kid às janeiro 6, 2005 01:40 AM

Muita imaginação, muito humor e muita cultura. Magnífico.
E a gravura também

Publicado por: Fred às janeiro 6, 2005 01:59 AM

E aqueles lá atrás já os vi aqui entre alguns comentaristas

Publicado por: Fred às janeiro 6, 2005 02:00 AM

Tá demais! Parabéns

Publicado por: Rodrigo às janeiro 6, 2005 02:20 AM

E tudo aconteceu entre o Natal e o fatídico 20 de Fevereiro...

Publicado por: Senaqueribe às janeiro 6, 2005 10:15 AM

Bem escrito e muita imaginação e verve. Parabéns

Publicado por: vitapis às janeiro 6, 2005 10:20 AM

Devia fazer mais investigações deste tipo. Depois desta investigação, a História já não vai ser a mesma.

Publicado por: Diana às janeiro 6, 2005 10:52 AM

Para quando o Evangelho segundo Joana?
A avaliar pela amostra ia ter um grande impacto

Publicado por: Tavares às janeiro 6, 2005 11:15 AM

Ou seja, os economistas, como sempre acontece, enganaram-se e quem se lixou foi o povo da Judéia, que teve que emigrar em massa...

Publicado por: 123 às janeiro 6, 2005 11:22 AM

"Mateus, um talentoso argumentista da Judeia, escreveu que:"

Muito bem, Joanita. Andas a aprender umas coisas.

Publicado por: Monty às janeiro 6, 2005 11:47 AM

O que mais gosto neste blog é a diversidade dos temas e a forma como eles são abordados. Desde o tema mais sério ao mais brincalhão, desde a bordoada mais cáustica ao humor mais irreverente, há de tudo. Mas sempre com uma forte componente cultural envolvente. Parabéns

Publicado por: Fred às janeiro 6, 2005 12:37 PM

Tavares em janeiro 6, 2005 11:15 AM
Pelo estilo da Joana seria antes o Apocalipse!

Publicado por: Domino às janeiro 6, 2005 12:51 PM

Tá super

Publicado por: fáfá de belém às janeiro 6, 2005 01:41 PM

Ó Fred, tás mesmo entusiasmado, pá. Mas o texto tem mesmo piada.

Publicado por: Jarod às janeiro 6, 2005 02:46 PM

Uma bloguista com reputação de raccionária ea escrever disto?!?

Publicado por: Ant Curzio às janeiro 6, 2005 03:10 PM

Afixado por: Átila em janeiro 6, 2005 01:38 AM ´

«...há pessoas mais exigentes que outras. O teu caso insere-se nas "outras".»

Há pessoas e há as outras. No teu caso, Átila, insere-se nas "outras".

Publicado por: Mario às janeiro 6, 2005 03:39 PM

Eu também concordo com o Átila :
Acho o texto demasiado rebuscado e, para dizer a verdade, não percebi a mensagem talvez por falta de "instrução religiosa" ...

Publicado por: asdrubal às janeiro 6, 2005 04:09 PM

Joana anda um bocado confusa...lá isso é verdade.

# : - ))

Publicado por: (M)arca Amarela às janeiro 6, 2005 04:43 PM

Boletim Económico de Dezembro.
Banco de Portugal revê em baixa crescimento económico de 2005
................................

Se o bebé do Santana Lopes fosse o menino Jesus, Joana acabaria aqui a escrever sobre os reis MAGROS...

# : - ))))

Publicado por: (M)arca Amarela às janeiro 6, 2005 04:49 PM

Afixado por (M)arca Amarela em janeiro 6, 2005 04:49 PM:
O Banco de Portugal revê em baixa crescimento económico de 2005 porque está a prever uma vitória do Sócrates.

Publicado por: David às janeiro 6, 2005 05:04 PM

Então o menino David não fez os trabalhos de casa? Nem lê os seus mestres?
Andou o tio José Manuel Barroso a pregar que as medidas económicas de um governo só se fazem sentir dois anos depois, para justificar os maus indicadores que tinha, e o menino David diz que o Sócrates vai ser responsável pelo descalabro de 2005?
O Sócrates vai ser responsável é pelo descalabro de 2006.

Publicado por: (M)arca Amarela às janeiro 6, 2005 06:49 PM

Então o menino David não fez os trabalhos de casa? Nem lê os seus mestres?
Andou o tio José Manuel Barroso a pregar que as medidas económicas de um governo só se fazem sentir dois anos depois, para justificar os maus indicadores que tinha, e o menino David diz que o Sócrates vai ser responsável pelo descalabro de 2005?
O Sócrates vai ser responsável é pelo descalabro de 2006.

Publicado por: (M)arca Amarela às janeiro 6, 2005 06:51 PM

Também!

Publicado por: David às janeiro 6, 2005 07:05 PM

Ó Mario, que caca é essa que escreveste? Isso faz sentido para ti? És mesmo copinho de leite, um palermita. Vai dar banho ao cão, idiota!

Publicado por: Átila às janeiro 6, 2005 10:59 PM

Segundo Mateus:

Virá um ano, que no quintal rectangular, aparecerá a Dama com cara Feia a tentar reduzir um deficit, mas não só não conseguirá, com ainda terá o desplante de o aumentar desmesuradamente, e esse heroico povinho, nem a questionará, por ela ter apelidado o antecessor de gastador, e sendo ela tão poupadinha, ainda aumentou mais o buraco.

Virá uma baga tão grande, que se chamará Bagão, e com ele julgará o povo ter Pão.
Ora tão esse fará o mesmo que outros já fizeram ou ainda pior, no entanto continuará a ser mui querido entre seus pares.

Haverá também casas de apostas em Londres, que colocarão a seguinte propostas aos apostadores:

- qual será o nome do ministro das finanças português que fechará para todo o sempre o ministério e entregará as chaves em Bruxelas?

Publicado por: Templário às janeiro 6, 2005 11:23 PM

Está muito bem escrito e cheio de humor

Publicado por: Valente às janeiro 7, 2005 01:21 AM

Este texto está fora de série. Muito bom.

Publicado por: R de Carvalho às janeiro 7, 2005 09:21 AM

Onde é que quer chegar com esta história? Não percebi.

Publicado por: rume às janeiro 7, 2005 09:36 AM

Como anedota está boa.

Publicado por: rume às janeiro 7, 2005 09:37 AM

Jóia....!!!!

Publicado por: sininha às janeiro 7, 2005 01:45 PM

Brilhante e imaginativo

Publicado por: Mauricio às janeiro 8, 2005 06:17 PM

Está muito bem imaginado

Publicado por: Tintim às janeiro 15, 2005 03:54 PM

Parabéns pela veia!

Publicado por: rezingao às março 4, 2005 02:55 PM

oi pa tudo bm cntg ou quê

Publicado por: hugo às outubro 11, 2005 04:46 PM

Num tema tão interessante, não se aproveita nada que voce escreveu. Como escreveram, voce não tem nada de conhecimento teológico. Que pena que isso seja divulgado e tem gente que acha legal!

Publicado por: cirino pereira da silva às janeiro 10, 2006 01:12 AM

É uma ganda merda

Publicado por: pipoca às janeiro 17, 2006 10:22 AM

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