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novembro 29, 2004

Obviamente, Demito-me

Penso que Santana Lopes se deveria demitir e sugerir ao PR a realização imediata de novas eleições. Todos (ou quase) as querem: a maioria do PSD, o PCP, o BE, os pré-socráticos do PS, o milhão de portugueses que subscreve o Barnabé, etc.. Apenas o PP e Sócrates (e os socráticos) não querem eleições antecipadas. Mas estão claramente em minoria.

O país só sobreviverá com reformas profundas. Foi-se aguentando numa ilusão bem sebastianista de um milagre salvador. Mas atingiu um estado em que a competitividade do sector privado, nomeadamente do sector exportador, já não consegue aguentar a situação. A emergência das novas economias asiáticas foi o canto do cisne da nossa economia obsoleta e pouco qualificada. O país vive muito acima das suas posses e não se convence desse facto.

Para fazer essas reformas, que irão bulir com muitos (maus) hábitos instalados, será preciso um governo com elevada credibilidade e uma extensa base consensual de apoio popular. E essa extensa base consensual popular e a neutralização da comunicação social pacóvia que tem aviltado e iludido o nosso país só se conseguem quando o país estiver num estado desesperado, visível, bem evidente e absolutamente convincente para uma maioria esmagadora da população.

Sócrates não quer eleições antecipadas porque prefere que o governo de PSL faça algumas reformas, impopulares, que ele nunca teria coragem de as fazer, mas que gostaria que fossem feitas. Quando Leonor Coutinho clama, desgrenhada, que quando o PS for governo revoga a Lei do Arrendamento está a brincar com o eleitorado. Então, em face dos novos contratos entretanto firmados, que vai o PS fazer? Revoga com efeitos retroactivos? Nada disto é sério.

O governo de Santana Lopes, pelo que mostrou até agora, não tem capacidade de fazer reformas de fundo. O Orçamento para 2005 é uma mistura de populismo contraproducente (a baixa das taxas do IRS, que ninguém vai sentir), medidas anti-económicas (aumento excessivo, para as contas públicas, do rendimento disponível e diminuição dos incentivos às poupanças das famílias e das empresas), condimentado com ameaças de um despotismo fiscal incompatível com um Estado de direito. É necessária uma lei que reveja os contratos de arrendamento anteriores a 1990, mas esta lei está mal feita, é mais severa com a habitação (que é uma função social) que com o comércio (onde a renda é um custo de produção) para satisfazer o lobby dos comerciantes, e vai provocar um terramoto social sem resolver a questão de fundo (Leia-se sobre este assunto os diversos artigos que escrevi neste blogue sobre o arrendamento urbano).

A reforma da administração pública é vital e nada se faz ... porque é difícil. A Saúde e o Ensino custam fortunas ao erário público com resultados deploráveis. Sem estas reformas não há dinheiro que chegue para aplacar este monstro. Aliás, se a crise da competitividade exterior da zona euro se agravar, duvido que num futuro, talvez mais próximo do que se imagina, haja dinheiro para pagar a função pública, as transferências sociais, etc., a menos que haja cortes substanciais naquelas despesas. E quanto mais se vai buscar às empresas mais a competitividade destas diminui, mais o défice das transacções com o exterior se agrava e menos dinheiro há, por insolvência das empresas e das famílias.

A economia portuguesa não se cura com os emplastros que o governo de PSL aplica, embora se tenha que reconhecer que sempre é melhor aplicar emplastros que afundar-se nos desvarios despesistas da era Guterres, que comprometeu o país para os 25 anos seguintes. Nenhum governo português, nestes últimos 2 séculos, havia deixado uma herança tão sinistramente pesada.

Se PSL não é capaz de resolver os problemas do país, que é que ganha em permanecer no governo, aplicando paliativos, fazendo meias reformas, e sendo grelhado em fogo lento por (quase) todos os corifeus da política e da comunicação social? Nada ... apenas uma derrota estrondosa nas próximas eleições e um país que, devido aos paliativos e mezinhas que aplicou, ficou com alguma pequena mas enganosa margem para mais umas ilusões despesistas.

O melhor é cortar o mal pela raiz, assumir a sua incapacidade, em face da actual situação social, em governar da forma que entende como a mais adequada ao país (se é que ele tem alguma ideia sobre qual a forma mais adequada ao país) e fazer as malas.

E quem vier atrás que feche a porta, se for capaz ... ou se o deixarem ...


Nota: A demissão de Henrique Chaves é uma prova da forma repugnante como a política está a ser vivida actualmente. Um ministro não se demite na praça pública, sem previamente avisar o 1º Ministro, e deve deixar correr um período razoável de nojo, antes de se produzir na comunicação social. Aliás, Henrique Chaves já devia sofrer de uma profunda instabilidade psíquica, visível quando recebeu os dirigentes do SL Benfica. Quer se goste ou não, nunca deveria afirmar publicamente que só por delicadeza não atirou pela janela fora um DVD que os dirigentes do Benfica haviam lá deixado. Só um ministro em estado de completa incontinência verbal produz afirmações públicas como aquela. Era mais sensato ter deitado o DVD no ecoponto mais próximo e ter ficado calado.


Nota 2 - Ler a seguir:
... E o óbvio aconteceu

Publicado por Joana às novembro 29, 2004 07:59 PM

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Comentários

Calado !!!

Mas aqui no cantito toda a gente julga que tem direito a falar, e podem sempre desculpar-se com o exemplo do Pai Sagrado da Democracia, ou noutro campo mais técnico com o Pai Sagrado da Constituição.

Como benfiquista, e se tivesse dinheiro, tinha comprado e bebido um Herdade do Esporão 2000 Método Clássico, com os votos de nunca mais ouvir falar neste sacripanta.

Publicado por: carlos alberto às novembro 29, 2004 08:17 PM

Também eu estou de acordo que o melhor para o PSL era demitir-se. Mas so se o Pacheco Pereira e a malta da Grande Loja prometessem ir eles para o governo...
Assim ficavamos a saber que pedal é que esta gente realmente tem.
Eu, pelo sim pelo não tenciono continuar pela estranja...

Publicado por: P Vieira às novembro 29, 2004 09:04 PM

É preciso uma grande dose de imaginação e audácia para fazer as reformas que o país necessita.
Mas, já que a Joana mencionou o caso do arrendamento urbano, sempre quero dizer que, no meu entender, o que está mal é a própria natureza do negócio, quando aplicado às necessidades básicas das pessoas. Acho que é uma aberração do sistema politico-económico em que vivemos e que se "convencionou" classificar como o melhor possível.
Ora a mim parece-me que arrendar uma casa para habitação permanente é assim como arrendar a roupa com que nos vestimos, as refeições com que nos alimentamos ou os medicamentos com que nos tratamos.
É, de facto um negócio muito aberrante, mas que tende a ser considerado normal apenas porque não há imaginação para mais.
É portanto um problema que não devia existir porque não tem pés nem cabeça, e é por isso que todas as "soluções" que lhe queiram aplicar estarão sempre erradas.

Publicado por: Senaqueribe às novembro 29, 2004 09:55 PM

Na verdade a perseguição que todos movem ao Santana desmotiva qualquer um. Começou pelo PR que disse que o punha sob vigilância e a partir daí não há um dia em que não seja insultado num jornal ou na TV.
E o pior é serem a maioria do próprio partido.

Publicado por: Rui Pereira às novembro 29, 2004 09:56 PM

(...)Apenas o PP e Sócrates (e os socráticos) não querem eleições antecipadas(...) para além da Joana !

Publicado por: zippiz às novembro 29, 2004 10:23 PM

Quatro???????????????
Um recorde!
Recebes horas extraordinárias???????????

Publicado por: Átila às novembro 29, 2004 10:26 PM

Reformas... Por várias vezes já vi pessoas desejarem a morte a estes ministros por terem tendado mexer na lei do arrendamento, nas SCUT, no código do trabalho, etc. Acho que o pessoal do blogs ainda não se apercebeu do país onde vivem e da vontade de suicídio comum que por aí existe.

Publicado por: Mário às novembro 29, 2004 10:37 PM

Janica,

Atira-te ao 5º, vais ver que o Portas desta é que te dá um lugar de Secretário de Estado. Não hesites...

Publicado por: Átila às novembro 29, 2004 10:40 PM

Afixado por: Átila em novembro 29, 2004 10:26 PM

Numa sociedade globalizada, acho que nos devemos ajudar uns aos outros.

Já tive esse mesmo problema e comecei por usar o Hirudoid® mas as melhoras foram pouco significativas e tive que avançar para o diclofenac dietilamónio vulgo conhecido por Voltaren® (atenção só com receita médica) que se revelou muito mais eficaz e as dores desapareceram, quase por milagre.

As melhoras.

Publicado por: carlos alberto às novembro 29, 2004 10:46 PM

Joana: isso é depressão ou é mesmo a sério?

Publicado por: vitapis às novembro 29, 2004 10:49 PM

Esta tipa deve ter alguma fisgada ao propor a demissão dos santanetes.
Muito gostava de saber qual é a dela.

Publicado por: Cisco Kid às novembro 29, 2004 10:51 PM

Ah Carlos Alberto, seu macholas, isso é que são coisas invejáveis de serem ditas. Deixaste-me completamente zonzo. Não tenho pedalada para ti. Desisto.

Publicado por: Átila às novembro 29, 2004 11:05 PM

Enquanto o país não estiver na mais absoluta miséria não há ambiente para fazer reformas. Parece ser esta a conclusão a que a Joana chegou.
Espero que a Joana esteja errada, porque se for assim, Deus nos valha.

Publicado por: fbmatos às novembro 30, 2004 12:35 PM

fbmatos, parece-me que o governo, em "vigilância" do PR e com toda a malta mediática a ladrar contra ele, tem poucas possibilidades de fazer qq coisa.
Faz lembrar aquelas equipas de futebol com toda a malta a assobiar e que, enervados, não conseguem jogar com tino.

Publicado por: David às novembro 30, 2004 12:49 PM

É impressão minha ou isto hoje está um bocado para o surrealista?

(Bem me parecia que aquilo do código Da Vinci ia dar mau resultado...)

# : - ))

Publicado por: (M)arca Amarela às novembro 30, 2004 12:54 PM

Acha surrealista a minha sugestão?
O PSL não tem condições para governar, isto admitindo que ele o saiba fazer. Está permanentemente sob "vigilância do PR" e permanentemente com a comunicação e oposição clamando que aquele menino se está a portar mal.
O PR e o Sócrates pretendem que o PSL tire algumas castanhas do lume, aquelas reformas incipientes que eles querem feitas mas não arcarem com o ónus respectivo, e depois, com a cota de popularidade do PSL pelas ruas da amargura, elegerem uma maioria socialista.
Alguém duvida disto?
PSL está a fazer o papel de malvado/inocente (o tal bebé) útil.

Publicado por: Joana às novembro 30, 2004 01:34 PM

Janica,

Isso que dizes aqui acima é a pura da verdade. Mas lá que o CDS nunca há-de ser governo sem ser por esmola de outro partido também é uma grande verdadinha, olá se é!

Publicado por: Átila às novembro 30, 2004 05:09 PM

Como diria Eanes ... jjáá-ssshtá.

Publicado por: asdrubal às novembro 30, 2004 07:30 PM

Foi certeiro!

Publicado por: Filipa Zeitzler às novembro 30, 2004 10:34 PM

Você teve alguma presciência?

Publicado por: Broteus às dezembro 1, 2004 04:13 AM

Você teve alguma presciência?

Publicado por: Broteus às dezembro 1, 2004 04:13 AM

Você teve alguma presciência?

Publicado por: Broteus às dezembro 1, 2004 04:14 AM

Você teve alguma presciência?

Publicado por: Broteus às dezembro 1, 2004 04:14 AM

Estava enervado, Broteus?

Publicado por: curioso às dezembro 1, 2004 04:20 AM

Este seu post teve muita oportunidade. A situação que se vivia não era possível continuar.
Quem teve a culpa? Acho que a culpa principal foi do PSL, embora viver sempre sob a ameaça de dissolução não facilite a vida.

Publicado por: vitapis às dezembro 1, 2004 12:11 PM

Foi uma coincidência (eu não acredito em tanta presciência), mas foi um coincidência sortuda. Pelo menos teve a aproximação.

Publicado por: Jarod às dezembro 1, 2004 05:38 PM

Afinal Dias Loureiro também tinha a mesma opinião:

Dias Loureiro, entrevistado pela Margarida Marante, disse que aconselhou o primeiro-ministro a demitir-se e que Santana Lopes terá concordado com ele. Esta conversa terá decorrido antes de Jorge Sampaio ter decidido convocar eleições antecipadas. As declarações de Dias Loureiro poderão ser ouvidas na íntegra na TSF este sábado de manhã.

Na altura, o presidente da mesa do congresso defendia que o primeiro-ministro devia demitir-se para poder ir a eleições. Dias Loureiro explicou à TSF que o Governo de Santana Lopes não teve um estado de graça e que «soltaram-se para aí uns demónios e não vão parar».

Santana Lopes terá concordado com Dias Loureiro. «Não me vão perdoar por estar aqui sem ter sido eleito», terá dito o primeiro-ministro a Dias Loureiro.

Publicado por: VSousa às dezembro 10, 2004 05:09 PM

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