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janeiro 22, 2004

Rosas atravessa o Lethes a meio de um artigo

Uma interessante faceta de alguns intelectuais da nossa praça é a de serem capazes de fazerem, sobre um dado tema, uma afirmação e a sua negação de forma peremptória, conclusiva e sem margens para dúvidas, quer quando afirmam, quer quando negam.

Esse fenómeno quase-hegeliano pode suceder quer em escritos espaçados no tempo – quem se afadiga a escrever nem sempre se lembra do que havia escrito dias ou meses antes – quer num único e contraditório escrito.

Rosas postulava ontem no Público mais uma definitiva tese sobre o envolvimento americano no Iraque. Nesse artigo seminal, para demonstrar como a posição americana estava irremediavelmente comprometida, Rosas afirmava que « as forças ocupantes anglo-americanas já não podem sair do Iraque como quereriam. Ou o abandonam expeditamente e a curto prazo, não garantindo o controlo político, militar e das matérias-primas da região, ainda por cima com o risco de deixar no governo uma reedição xiita dos "ayatollahs" iranianos que lhes fará ter saudades do cooperante Saddam de outros tempos e isso será o reconhecimento público de uma grave derrota da estratégia da "guerra infinita". Ou prolongam e intensificam a sua presença militar para ver se agarram alguma coisa, e arriscam-se a sair de Bagdad como um dia saíram dos terraços da embaixada de Saigão: pendurados nos helicópteros

Portanto, Rosas é claro: quer os americanos, quer os iraquianos estão «entalados». Os primeiros porque qualquer solução é uma derrota, os segundos porque, se os ocupantes coloniais e imperialistas retirarem, vão ficar à mercê dos "ayatollahs" iranianos, dos independentistas curdos no norte, da resistência armada dos apoiantes do Baas e do terrorismo islamista.

Um caos horrível, pavoroso, pior que o pior dos noticiários da TVI. Eu já me dispunha a fazer um zapping misericordioso para outro artigo, quando me lembrei que o Rosas é um intelectual cheio de recursos e deixei-me ler o resto. E o resto era uma mensagem de felicidade.

E era uma mensagem de felicidade, porque Rosas pretendia fazer um apelo à comparência na «segunda grande manifestação internacional contra a guerra que vai ter lugar no próximo dia 20 de Março». Agora, escreve ele, «é urgente que a possamos repetir para esconjurar a injustiça e a desumanidade resultantes de a não termos conseguido impedir

Mas como é possível convencer o pessoal a ir a uma manifestação para apelar à instalação do caos no Iraque, segundo os sábios e iniciais parágrafos do preclaro ensaísta e historiador?

Simples (e cito): «a despeito do caos, da destruição e da violação de direitos que a invasão do Iraque originou, só há uma solução possível para o problema: a retirada incondicional das tropas ocupantes; a instituição no terreno de uma entidade internacional reconhecida por todas as partes que viabilize a autodeterminação democrática e a independência nacional do povo iraquiano»

A varinha mágica de Rosas viabiliza, no seu último parágrafo, aquilo que tinha inviabilizado nos primeiros.

É que, ao entrar nesse último e salvador parágrafo, Rosas atravessou o Rio Lethes, o rio do eterno esquecimento. Com a sua memória «limpa» Rosas escreve « Continuo a surpreender-me com os "realistas", que dizem que uma solução deste tipo precipitará o país no caos».

Rosas post-Lethes surpreende-se com o Rosas anterior à travessia desse rio fatal.

É normal: os génios não param de se surpreenderem a si próprios!

Publicado por Joana às janeiro 22, 2004 09:37 PM

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Comentários


Porque será que esta bovina não se refere aos escandalosos aumentos nos Hospitais SA e ao aumento de 125% dos Eurodeputados.

Esta ressabiada deve ser uma bem amanhada, mulher da vida de algum boy inútil...

Publicado por: Questionador às janeiro 22, 2004 11:48 PM

(...) Continuo a surpreender-me com os "realistas", que dizem que uma solução deste tipo precipitará o país no caos».(...)

Joana Vc não tem sentido de humor nenhum ! Então se o país já está no caos , não é caso para Rosas se surprender com todas as "realistas joanas" ?

Publicado por: zippiz às janeiro 23, 2004 12:04 AM

Esta gaja não grama tudo o que lhe cheire a esquerda. Por isso não os larga

Publicado por: Cisco Kid às janeiro 23, 2004 12:52 AM

Cara Joana:

A contradição aí está, é um facto. Mas não leve a mal ao homem a travessuia do rio do esquecimento, porque é óbvio que a fez forçado.

É que não basta ter razão, é preciso ter soluções. Foi o que Rosas procurou, e conseguiu: neste artigo ele tem razão e apresenta soluções.

Infelizmente, porém, na parte onde tem razão não apresenta soluções, e na parte onde apresenta soluções não tem razão. Coisas que acontecem a quem não quer separar o pensamento da acção.

Publicado por: Zé Luiz às janeiro 23, 2004 12:10 PM

Cara Joana,

Gostaria de comentar a respeito do seu texto mas como diz respeito a assuntos políticos do seu país fica impossível. Aqui no Brasil seja pela tv, jornal, internet ou seja lá qual for a mídia não chega nada de Portugal, a não ser quando acontece alguma coisa realmente pitoresca e claro notícias de futebol. No começo meu blog era o que eu chamava de "blog revolta", ou seja, críticas ácidas aos políticos e intituições dessas bandas mas por questão de coerência abandonei essa "linha editorial", afinal o nome do meu blog é carpe vitaem (o URL carpeM vitaE foi um erro medonho que corrigi no título mas por motivos técnicos deixei no URL)então passei a falar de amenidades e deixei a discussão política para a mesa de bar. Obrigado pela visita. Com certeza farei referência da fonte quando publicar seu texto e na semana que vem vou colocar seu link na minha lista de amigos. Beijos, F

Publicado por: F às janeiro 23, 2004 07:57 PM

O que me faz impressão no F Rosas é que ele diz e escreve essas baboseiras com um ar doutoral e de auto-satisfação, como se estivesse a dizer teorias de grande valia. É insuportável.

Publicado por: Hector às janeiro 23, 2004 09:31 PM

Rosas é um grande dirigente político e esta droga é um monte de calúnias.
Que é isso do Lethes?

Publicado por: A Nunes às janeiro 24, 2004 06:13 PM

Um trotskista é sempre um trotskista... E os nossos coitadinhos, têm de fingir que são democratas... daí essas incoerências... É normal.

Um abraço,
francisco Nunes

Publicado por: Planície Heróica às janeiro 24, 2004 07:42 PM

Também antipatizo com o Rosas. Acho-o enfatuado, cheio de coisa nenhuma

Publicado por: Trofa às janeiro 25, 2004 01:11 AM

agora o sr francisco Nunes é que define quem é democrata !
aliás, a própria Joana/bloguista também tem este "bom" hábito de definir quem é BOM e quem MAL. A seguir vêm os "democratas" do costume bater palmas ... e depois ficam irritadíssimos quando se lhes chamam reaças !

Publicado por: zippiz às janeiro 25, 2004 06:14 PM

Ó zippiz, então quem define quem é reaças? É o zippiz?
Sendo assim estamos em igualdade.

Publicado por: Filipe às janeiro 27, 2004 01:23 AM

Foi pena não ter caido ao rio.
Ficava a boiar

Publicado por: anonimo às janeiro 27, 2004 10:30 PM

Uma bola daquelas não se afoga

Publicado por: anonimo às janeiro 27, 2004 10:32 PM

caro Filipe ,
é uma questão de Português e de leitura do dito :
(...) depois ficam irritadíssimos quando se lhes chamam reaças !(...)

Publicado por: zippiz às janeiro 27, 2004 11:38 PM

Joana
Gostei da abordagem com o (meu) rio Lethes de permeio.
Para quem não sabe ou não conhece o rio Lima (Viana do Castelo - Ponte de Lima - etc.) um dia destes vou contar a história.

Publicado por: Nilson às março 31, 2004 05:47 PM

Nilson:
Passeava Décios Junos Brutos, com as suas legiões pelas ridentes regiões de entre Douro e Minho, já lá vão 2.135 anos, quando atingiu a margem esquerda de um rio que os seus legionários se recusaram a atravessar, alegando ser aquele o Rio Lethes. Ele atravessou o rio, sozinho e, da outra margem chamou-os pelos nomes, para eles verem que tinha conservado as suas memórias. É claro que devia ter levado uns papiros com uma lista de nomes e não teve qualquer dificuldade. Assim os convenceu não ser aquele o rio do esquecimento.

Chamou-se depois Rio Lima. Uma bela tapeçaria de Almada Negreiros existente no Hotel de St.ª Luzia em Viana do Castelo evoca essa efeméride.

Publicado por: Joana às março 31, 2004 09:26 PM

Tanta petulância

Publicado por: Anonymous às janeiro 18, 2005 03:29 PM

Mesmo muita

Publicado por: Anonymous às janeiro 18, 2005 03:30 PM

O Rio Lethes k passa em Ponte de Lima, é lindissimo, exerce sobre mim um fascinio mt grande.. aconselho a visita...

Publicado por: mauro_mars às janeiro 27, 2005 01:03 AM

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